Corredora finaliza a São Silvestre: desenho atual do percurso soma 15 quilômetros (ROBERTO CASIMIRO/FOTOARENA/FOTOARENA/Estadão Conteúdo)
Redação Exame
Publicado em 31 de dezembro de 2025 às 08h30.
A Corrida Internacional de São Silvestre chega à sua 100ª edição, nesta quarta-feira, 31, com um marco histórico: são 55 mil participantes inscritos, o maior número desde a criação da prova em 1925, superando com folga o recorde de 2024, de 37 mil corredores.
Entre eles, quase metade é de mulheres — 47% do total, o equivalente a cerca de 25,8 mil corredoras, outro recorde da disputa.
Criada pelo jornalista Cásper Líbero, a prova nasceu em 31 de dezembro de 1925, inspirada em uma corrida noturna francesa em que atletas corriam com tochas pelas ruas. Desde então, a São Silvestre nunca deixou o calendário do último dia do ano — foi disputada à noite até 1988, à tarde entre 1989 e 2011 e, a partir de 2012, passou para o período da manhã, formato mantido até hoje.
Ao longo do século, a corrida se profissionalizou, ganhou status internacional e se consolidou como a mais tradicional prova de rua do Brasil.
“A corrida só cresceu desde quando foi criada. Começou popular, depois trouxe os corredores de elite, mesclando o participante anônimo ao corredor de ponta, todos no mesmo trajeto”, diz Erick Castelhero, diretor executivo da São Silvestre, reforçando o caráter democrático do evento.
A prova também atravessou momentos turbulentos da história brasileira e mundial. De 1925 para cá, a São Silvestre foi realizada durante a Revolução Constitucionalista de 1932, em meio à Segunda Guerra Mundial e resistiu a sucessivas crises econômicas — só foi cancelada uma única vez, em 2020, devido à pandemia de Covid-19. O centenário, agora, consolida a corrida como um símbolo esportivo da virada do ano em São Paulo.
O crescimento da prova também passa pela internacionalização. No início, a São Silvestre era restrita a homens brasileiros ou estrangeiros residentes no país.
Em 1945, a organização abriu a disputa a atletas do exterior, movimento que mudou o equilíbrio de forças. Desde então, corredores africanos passaram a dominar o pódio, em especial o queniano Paul Tergat, cinco vezes campeão (1995, 1996, 1998, 1999 e 2000).
Em 1997, porém, um brasileiro que quase não figurava entre os favoritos roubou a cena. Émerson Iser Bem, então com 24 anos, desbancou Tergat na subida da Avenida Brigadeiro Luís Antônio, um dos trechos mais temidos do percurso. Ele conta que, ao encostar no ídolo queniano, ouviu das calçadas um coro de “vai, Brasil” vindo de bares e espectadores — o empurrão final para arrancar e vencer a prova.
No masculino, o Brasil segue líder em número de títulos ao longo da história, com 29 vitórias, mas vive um jejum que expõe a mudança de eixo competitivo.
A última conquista brasileira entre os homens ocorreu em 2010, com Marílson Gomes dos Santos, tricampeão da prova. Atrás do Brasil, aparecem Quênia, com 19 vitórias, e Etiópia, com sete.
Se a presença estrangeira se consolidou a partir dos anos 1940, as mulheres demoraram ainda mais para ocupar as ruas da prova. A participação feminina só foi liberada oficialmente em 1975. Naquele ano, apenas 17 corredoras — cerca de 6% do total — se inscreveram, e a vencedora foi a alemã Christa Vahlesieck.
Cinquenta anos depois, o cenário é outro. Em 2025, as mulheres respondem por 47% dos inscritos, cerca de 25,8 mil atletas, o maior percentual da história da prova.
No recorte por países, o domínio feminino é africano: o Quênia soma 29 vitórias entre as mulheres, seguido por Portugal, com sete — seis delas conquistadas pela portuguesa Rosa Mota, maior campeã da São Silvestre no feminino.
O Brasil tem cinco títulos na prova feminina, com conquistas de Carmem de Oliveira (1995), Roseli Machado (1996), Maria Zeferina Baldaia (2001), Marizete Rezende (2002) e Lucélia Peres (2006). O salto no número de inscritas, agora, funciona como termômetro da popularização da corrida de rua entre brasileiras de diferentes faixas etárias.
Do ponto de vista histórico, a São Silvestre condensa boa parte da trajetória do esporte de rua no Brasil.
A prova nasceu em uma São Paulo ainda em transformação urbana, com poucas dezenas de corredores se aventurando na noite da virada, e hoje fecha parte das principais avenidas da capital com dezenas de milhares de participantes, transmissão em rede nacional e presença de atletas de alto rendimento.
O desenho atual do percurso soma 15 quilômetros, com largada e chegada na região da Avenida Paulista.
Mesmo com ajustes ao longo das décadas, o formato se manteve fiel à ideia original de marcar o fim do ano com uma corrida pelas ruas da cidade — um ritual que, para muitos, substitui ou complementa a festa de Réveillon.
O centenário também reforça o peso simbólico da prova para o alto rendimento. Além dos títulos, a corrida ganhou um Hall da Fama, espaço de homenagem a nomes históricos como a portuguesa Rosa Mota, o brasileiro Marílson Gomes dos Santos e Carmem de Oliveira, pioneira entre as campeãs brasileiras no feminino. O objetivo é registrar, em caráter permanente, os atletas que ajudaram a reposicionar a prova no mapa das grandes corridas internacionais.
Ao mesmo tempo, a São Silvestre se consolidou como vitrine de tendências da indústria de corrida: tênis mais leves, roupas de compressão, relógios com GPS e estratégias de nutrição esportiva aparecem lado a lado com fantasias, camisetas de grupos de amigos e largadas em família.
Na prática, a prova funciona como ponto de encontro entre o corredor amador, que treina o ano inteiro, e os profissionais, que cruzam o mesmo percurso em ritmo de competição. O que importa é chegar até o topo da Brigadeiro.
*Com informações do Globo