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'Gympass' da leitura, Skeelo pousa no México com R$ 60 milhões

Plataforma brasileira leva modelo de parcerias com operadoras para o mercado mexicano e testa até onde a leitura digital pode ir na América Latina

Rafael Lunes e Rodrigo Meinberg, fundadores da Skeelo: “Queremos que a leitura seja acessível, onde e como o leitor preferir” (Germano Lüders/Exame)

Rafael Lunes e Rodrigo Meinberg, fundadores da Skeelo: “Queremos que a leitura seja acessível, onde e como o leitor preferir” (Germano Lüders/Exame)

Laura Pancini
Laura Pancini

Repórter

Publicado em 4 de dezembro de 2025 às 06h00.

Última atualização em 4 de dezembro de 2025 às 10h32.

A brasileira Skeelo, plataforma de leitura digital fundada em 2019, acaba de dar o primeiro passo fora do país com o lançamento oficial de sua operação no México.

A empresa pretende aportar, até 2026, cerca de R$ 60 milhões na região, com mais de R$ 38 milhões destinados apenas à compra de direitos autorais em espanhol e ao fortalecimento de um catálogo local.

A chegada ao mercado mexicano coroa um ciclo de crescimento iniciado no Brasil com um modelo pouco convencional: em vez de vender diretamente para o consumidor, a internacionalização da Skeelo nasce de um negócio B2B2C, em que livros digitais chegam aos leitores como benefício em planos de telefonia e outros serviços.

No país de origem, a plataforma já transacionou mais de 180 milhões de livros e faturou R$ 100 milhões em 2023, ao mesmo tempo em que absorveu a rede social de leitores Skoob, com cerca de 10 milhões de usuários cadastrados. Em 2024, o ecossistema registrou mais de 286 milhões de minutos de leitura consumidos e ultrapassou a marca de 2 milhões de usuários mensais ativos.

Por que o México?

Se no Brasil a proposta era enfrentar o baixo índice de leitura e o preço dos livros físicos, a escolha do México como porta de entrada na América Latina segue a mesma lógica.

Segundo Rafael Lunes, cofundador e vice-presidente de comunicação institucional e assuntos corporativos, os países latino-americanos têm perfis parecidos: baixa média de livros lidos por ano, renda limitada e concentração da leitura nas classes mais altas.

A diferença, no caso mexicano, é ainda mais aguda no bolso. “O livro físico no México chega a ser de quatro a cinco vezes mais caro, em proporção, do que no Brasil — aqui, o conteúdo está muito mais encapsulado nas elites”, afirma o executivo.

No desenho da expansão, a Skeelo preferiu manter o “time que está ganhando”. A empresa replica no México a mesma estratégia aplicada no Brasil: parcerias com grandes operadoras e provedores de internet, chamados internamente de alianças estratégicas.

Entre os primeiros acordos estão a Izzi, braço de banda larga do grupo Televisa, e a Sky, de TV por assinatura, que juntas já permitem que o serviço de leitura chegue, desde o início, a cerca de 10 milhões de mexicanos como benefício embutido em planos digitais.

Os clientes dessas empresas podem acessar um catálogo com mais de 200 mil títulos entre ebooks, livros digitais, e audiobooks, versões narradas das obras, sem precisar pagar por uma assinatura adicional — e construir, dentro do app, uma biblioteca própria.

A meta é triplicar essa base no México e alcançar 30 milhões de pessoas até 2026, mantendo o foco em distribuição em massa e aquisição barata de usuários.

Direitos autorais e ambição social

Além da infraestrutura tecnológica e das parcerias com operadoras, o coração da operação mexicana está no catálogo.

A Skeelo prevê investir cerca de 200 milhões de pesos mexicanos até 2026 (aproximadamente R$ 60 milhões), dos quais 130 milhões de pesos — algo em torno de R$ 38 milhões — serão direcionados exclusivamente à compra de direitos autorais na região.

Isso significa que mais da metade do orçamento da expansão será injetada diretamente na cadeia do livro, entre editoras, autores, produção local mexicana e obras de universidades e grupos independentes.

A estratégia repete a lição aprendida no Brasil: sem um catálogo relevante para o público local, não há modelo de negócio de leitura digital que se sustente.

Lunes conta que a prioridade é construir um acervo que vá além dos best-sellers traduzidos do inglês. A empresa quer trabalhar com grandes grupos editoriais e, ao mesmo tempo, com produções regionais — incluindo livros em línguas de povos originários, projeto que a Skeelo enxerga como um vetor de impacto social na América Latina.

A lógica é semelhante à de um serviço de streaming, que precisa equilibrar produções globais com conteúdos nacionais para ganhar relevância no país onde opera.

No discurso da companhia, o negócio de conteúdo vem acompanhado de uma ambição maior: ser uma empresa vista como socialmente relevante, alinhada a práticas de ESG.

A tese é que, ao baratear o acesso à leitura via celular e parcerias com serviços essenciais, como internet e telefonia, a Skeelo pode atuar como ponte entre inclusão digital e inclusão cultural.

Do ponto de vista financeiro, a expansão também chama atenção por outro motivo: a empresa segue sem investidores institucionais.

A Skeelo é uma startup bootstrapped, companhia que cresce com capital próprio e geração de caixa, desde 2019. Para 2025, a expectativa é de faturar cerca de R$ 160 milhões, valor que, segundo Lunes, deve praticamente dobrar em 2026 com o tracionamento da operação mexicana e o avanço em outros países.

O que vem depois do México

Embora o México seja o primeiro grande teste de fogo da internacionalização, a Skeelo já opera, em menor escala, em outros mercados latino-americanos, como Argentina e Colômbia.

A previsão é que a Colômbia ganhe força a partir de 2026, em um movimento paralelo ao amadurecimento da base mexicana.

Na prática, o plano da empresa é consolidar um “playbook” próprio de expansão regional: começar com parcerias em telecom, investir pesadamente em conteúdo local, testar comunicação e posicionamento país a país e, aos poucos, integrar funcionalidades sociais inspiradas no Skoob.

O desafio é fazer tudo isso sem diluir a proposta central de valor — levar livros digitais ao maior número possível de pessoas, com o menor atrito possível.

Para o mercado editorial latino-americano, a movimentação traz um sinal claro: a disputa pelo tempo de tela dos consumidores não será travada apenas entre vídeos curtos e redes sociais, mas também por plataformas que tentam colocar a leitura dentro do pacote de serviços digitais do dia a dia.

Se a combinação entre telecom, livros digitais e comunidade vai funcionar fora do Brasil, a resposta virá, primeiro, da recepção dos leitores mexicanos.

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