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Favelas cobram propostas e olhar além da violência no debate político

Líderes comunitários reclamam da falta de propostas e dos discursos reducionistas, que se restringem a discussões sobre marginalização e violência

Favela: As lideranças frisam que há diversidade nas favelas e não tem como se pensar em um "voto da comunidade" (Roberto Rocco r.c.rocco@tudelft.nl/Getty Images)

Favela: As lideranças frisam que há diversidade nas favelas e não tem como se pensar em um "voto da comunidade" (Roberto Rocco r.c.rocco@tudelft.nl/Getty Images)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 29 de outubro de 2022 às 10h52.

Um tiroteio em Paraisópolis, que interrompeu a agenda do candidato ao governo de São Paulo Tarcísio de Freitas (Republicanos), e a visita de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Complexo do Alemão, no Rio, colocaram as favelas em destaque na corrida eleitoral do segundo turno. Líderes comunitários, porém, reclamam da falta de propostas e dos discursos reducionistas, que se restringem a discussões sobre marginalização e violência.

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Presidente da Central Única das Favelas (Cufa), Preto Zezé avalia que "há um distanciamento do mundo político das favelas". "Ficou-se muito no discurso do que já foi feito ou no discurso de apelo ao medo das favelas relacionado à violência, mas não se falou que 43% das favelas querem empreender. Qual é o plano para isso? Hoje, muitos jovens que já estão na universidade, a maioria de escola pública e de favela, querem, por exemplo, morar num lugar próprio. Ninguém ofereceu nenhuma proposta de moradia subsidiada."

Celso Athayde, empreendedor e fundador da Favela Holding, observa a necessidade "de participação efetiva na construção do plano de governo desde a pré-campanha". Já o líder comunitário de Paraisópolis e presidente do G10 Favelas, Gilson Rodrigues, reclama do viés da marginalização e da violência. "Não estou vendo propostas para as favelas."

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Ele cobrou dos candidatos a discussão "atentados reais" contra as favelas, como a fome e o desemprego. "Para poder ajudar as favelas a prosperarem, para ajudar a terem dinheiro no bolso, que é a melhor forma de combater violência."

O que fazer?

Pesquisadora do Laboratório Espaço Público e Direito à Cidade (LabCidade), da Universidade de São Paulo (USP), Isadora Guerreiro diz que o olhar sobre esses locais deveria ser outro. "São espaços urbanos, de moradia, de comunidades, que foram em grande parte deixados de lado pelo Estado durante muitos anos e, portanto, tiveram de autopromover toda a sua infraestrutura urbana", afirmou.

Segundo ela, as políticas de infraestrutura e regularização fundiária são de responsabilidade do poder municipal. No entanto para encarar os desafios, Estados - cedendo terras, por exemplo - e principalmente a União - com liberação de recursos e uma política nacional de habitação - podem ajudar. "Urbanização é uma coisa muito cara. Historicamente, o governo federal é bastante responsável pelos recursos para fazer isso." Para a especialista, os desafios atrelados às favelas só serão superados com políticas integradas, que envolvam educação, saúde transporte e cultura, por exemplo. "A moradia é só o começo."

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre 2010 e 2019, o número de domicílios em aglomerados subnormais cresceu 59% e ultrapassou os 5 milhões. Em números absolutos, São Paulo e Rio são os Estados com a maior quantidade de lares em favelas.

Proporcionalmente, cidades pequenas e capitais do Norte e do Nordeste chamam atenção. No Amazonas, elas representam mais de 35% de todos os domicílios ocupados no Estado. "Esses números são assustadores, mas devem ser muito piores", alerta Isadora, lembrando que os dados mais recentes são amostrais e não refletem impactos da pandemia da covid-19, que só serão visíveis no Censo.

As lideranças frisam que há diversidade nas favelas e não tem como se pensar em um "voto da comunidade". Gilson Rodrigues afirma que "estamos olhando as propostas, o que estão falando sobre nós, e vamos tomar a decisão que melhor se identifica com nossas causas." Pesquisadora do Projeto Reconexão Periferias da Fundação Perseu Abramo, Victoria Lustosa Braga destaca que "a população que vive nesse território quer se tornar agente de política pública, não só público-alvo".

Em relação à corrida presidencial, o cientista político e professor da FGV-SP, Marco Antonio Carvalho Teixeira, acredita que o discurso de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre as comunidades tem sido "mais respeitoso" do que o de Jair Bolsonaro (PL). Ele avalia que falas do presidente e candidato à reeleição que associam moradores do Alemão à criminalidade, podem lhe custar votos.

Em debate da Band, Bolsonaro confundiu o Complexo do Alemão com o Salgueiro, que fica em São Gonçalo, e disse: "Eu conheço o Rio de Janeiro, o senhor (Lula) esteve atualmente no Complexo do Salgueiro. Não tinha nenhum policial ao seu lado. Só traficante." Na visita ao Alemão, Lula usou um boné com as letras "CPX". Nas redes, apoiadores do presidente chegaram a usar a sigla para associar o adversário ao crime, dizendo que seria uma abreviação para a palavra "cupinxa", que remete ao tráfico. No entanto, significa "complexo".

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