Pelé em seu aniversário de 78 anos: ele manteve sua marca protegida (Roy Rochlin/FilmMagic/Getty Images)
Ivan Padilla
Publicado em 29 de dezembro de 2022 às 16h00.
Última atualização em 29 de dezembro de 2022 às 17h50.
Considerado por muitos o melhor jogador de futebol de todos os tempos (são 1.283 gols em 1.363 jogos), Pelé foi rei também além dos campos. Ainda que o Edson Arantes tenha controvérsias ao longo de sua vida pessoal, a capacidade de Pelé de afastá-las de sua reputação como jogador e ex-atleta foi tão precisa quanto preciosa.
Edson já se envolveu com a política e chegou a ser ministro de FHC. Teve filhos fora do casamento com reconhecimento tardio de sua parte. Em recente documentário, para a Netflix, chegou a afirmar: “Tive alguns 'casos', alguns dos quais terminaram em crianças, mas só os descobri mais tarde”. Lidou com familiares envolvidos com o difícil mundo das drogas. Seu filho Edinho foi preso. Nada disso impactou efetivamente sua capacidade imagética e publicitária.
Pelé, ao longo de sua vida, já teve mais de uma centena de marcas e produtos a ele conectados. Até na sétima arte se arriscou e, entre vários filmes, contracenou com Sylvester Stallone e Michael Caine. Em parceria com Maurício de Sousa, viu surgir o personagem Pelezinho. Ah, também cantou e lançou discos. ABC, ABC, toda criança tem que ler e escrever... pode estar até hoje na mente de vários brasileiros — como está na deste que vos escreve.
Esse cuidado e atenção com seus patrocinadores sempre foi uma marca. Ainda jogador, durante a Copa de 1970, no México, agachou no círculo central do gramado para amarrar sua chuteira. E o fez bem lentamente. Acaso? Não, era Pelé dando visibilidade à sua chuteira Puma. Um movimento novo e bastante perspicaz para a época. Pelé marcava golaços também no universo do marketing e dos negócios.
Na última década, o valor da sua marca foi estimado entre US$ 500 e 600 milhões pela Off Field, especializada em mercado de futebol. A marca Pelé sempre foi global e potente. Reflexos de quem conseguiu o feito de suspender uma guerra em 1969, quando o Santos viajou para a Nigéria para jogar contra um combinado local. Se para ter Pelé a guerra precisava parar, que parasse. Rei e Deus, Pelé era maior que qualquer guerrear.
Pelé foi disruptivo também no seu gerenciamento de marca. Em 2012, preferiu concentrar (ou negociar) todos os interesses institucionais, marketing e imagem em uma única empresa, a Legends 10, com sedes nos EUA. Desde então, todos os seus contratos de marketing e publicidade, incluindo licenciamento de produtos com o seu nome e aparições públicas, foram completamente profissionalizados. Como resultado participou de uma campanha sobre nova ferramenta do Facebook em 2022. Nela, Pelé chamou Mark Zuckerberg de 'King of ZapZap'. De rei para rei.
O nascimento da marca Pelé se deu em um período de maior privacidade, afinal, diferentemente de hoje, quando atuava não existia internet, tampouco fãs o filmando e fotografando onde quer que estivesse. Mas Pelé não pode deixar o sucesso de sua marca restrito a isso. Porque mesmo 45 anos depois de deixar os gramados, soube se atualizar. Sua marca rejuvenesceu e com ela seguiu ganhando (muito) dinheiro.
É preciso reconhecer tudo o que Pelé fez em campo sem apagar seus erros como indivíduo fora dele. Aplaudir Pelé não significa esquecer seus problemas, assim como deles lembrar não significa se proibir de enaltecer tudo o que Pelé foi. Pelé é o rei do futebol e seu reinado é intocável. Pelé merece a mesma a paz que ofereceu ao cessar uma guerra. Mérito de quem soube ser muito maior que Edson.
*Vinicius Lordello é especialista em gestão de reputação e crises no esporte
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