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Creomar, da Dharma: rejeição a Lula foi alimentada na reta final e é recado para 2º turno

Para o cientista político Creomar de Souza, "eleição está aberta" e Bolsonaro tem condições de ameaçar vantagem de Lula com uso da máquina pública e novos apoios

Creomar de Souza, da Dharma Politics: "antipetismo, assim como o próprio petismo, são forças muito expressivas do processo democrático" (Dharma/Divulgação)

Creomar de Souza, da Dharma Politics: "antipetismo, assim como o próprio petismo, são forças muito expressivas do processo democrático" (Dharma/Divulgação)

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Carolina Riveira

Publicado em 4 de outubro de 2022 às 18h34.

Última atualização em 4 de outubro de 2022 às 18h53.

Ainda no fim do ano passado, a quase um ano da eleição e com Lula liderando nas pesquisas, o cientista político Creomar de Souza, fundador da consultoria política Dharma, repetiu à EXAME uma fala que vinha fazendo nos meses anteriores: a capacidade eleitoral de Bolsonaro não poderia ser subestimada. Com a máquina na mão, uma base fiel e o antipetismo como força política importante, o presidente teria um ano para tentar virar o jogo em diversas frentes. Os esforços mostraram algum resultado no domingo, 2: Lula venceu com 48,4% dos votos válidos, mas contra 43,2% de Bolsonaro, uma votação maior no atual presidente do que projetavam pesquisas eleitorais.

"Havia antes da eleição uma percepção de que o antibolsonarismo seria muito maior do que o antipetismo, e isso se mostrou parcialmente verdadeiro. Mas a rejeição a Lula também foi muito alimentada na reta final", diz Souza, que destaca a migração dos votos de Ciro Gomes e Simone Tebet para Bolsonaro, puxada pelo antipetismo e o medo de uma vitória de Lula no primeiro turno. "Os institutos de pesquisa acertaram a votação de Lula, só que erraram na votação de Bolsonaro."

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Para o segundo turno, Souza afirma que o desafio de Lula será manter seus 6 milhões de votos de vantagem (obtidos sobretudo com as capitais e a região Nordeste) e conseguir parte dos eleitores restantes de Ciro e Tebet, que rejeitam Bolsonaro a ponto de não terem migrado para o presidente logo no primeiro turno. Já para Bolsonaro, o controle da máquina pública, palanque em estados importantes e novos apoios (como o do governador de MG, Romeu Zema, reeleito no único estado do Sudeste em que Lula venceu, e Rodrigo Garcia, que ficou de fora da disputa em segundo turno em São Paulo) podem ajudar o presidente a "carcomer" a vantagem do petista, diz Souza.

"Bolsonaro tem capacidade de cerceamento e pressão nos estados em que Lula performou melhor. O quadro é aberto", diz. Veja abaixo os principais trechos da entrevista.


Como explicar a força do antipetismo nesta eleição?

O antipetismo, assim como o próprio petismo, são forças muito expressivas do processo democrático e do processo político brasileiro. Se olharmos para todas as eleições presidenciais [desde a redemocratização], o PT foi protagonista em todas, mesmo quando perdeu — e perdeu muitas. Mas, de outro lado, não podemos esquecer também que o PT acabou virando a única força político-partidária organizada constante na sociedade brasileira, por uma série de razões. O PT, para o bem ou para o mal, conseguiu vocalizar os anseios de parcelas da sociedade, e isso obviamente desperta algumas paixões de ambos os lados.

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O antipetismo se mostrou mais forte do que o antibolsonarismo?

Havia antes da eleição uma percepção de que o antibolsonarismo seria muito maior do que o antipetismo. Isso em termos de comparação direta, grosso modo, se mostrou parcialmente verdadeiro: em uma eleição marcada por rejeições, a rejeição a Bolsonaro pode ser manifestada nos votos a Lula e a rejeição ao petismo, manifestada nos votos a Bolsonaro. Nesse sentido, foram mais votos a Lula.

Mas, a rejeição a Lula também foi alimentada na reta final. Eu diria que, em partes, por essa maneira como PT e apoiadores guiaram a discussão do voto útil. Se criou uma ideia de que era Lula ou nada. Isso empurrou muita gente em favor de Bolsonaro, gente que em primeiro turno ainda queria entender o que estava acontecendo, mas pensou "olha, prefiro votar em Bolsonaro para evitar uma vitória de Lula no primeiro turno". Os institutos acertaram a votação do Lula, só que erraram a votação de Bolsonaro.

Nesse movimento, houve tanto alguns equívocos na campanha de Ciro Gomes, quanto uma pressão da campanha de Lula. Ao mesmo tempo, não houve uma construção de aproximação com Ciro. Me pareceu um processo em que a campanha do PT, embora tenha tentado dizer que era uma frente ampla, pode ter terminado com uma configuração de frente ampla só de esquerda. Trouxe algumas figuras rivais de Lula, mas que não necessariamente tinham votos [nesta eleição].

Lula e Bolsonaro: candidatos disputam 2º turno em 30 de outubro (Renato Pizzutto/Band/Divulgação)

A vantagem de Lula para o segundo turno é sensível? 

Em termos de segundo turno, Bolsonaro tem suas apostas. Candidatos de Bolsonaro varreram o Congresso, foram vencedores em estados muito importantes. E candidatos que não apoiaram Bolsonaro assumiram apoio agora pela manhã [como Romeu Zema, em MG, e Rodrigo Garcia, em SP]. Então, Bolsonaro tem capacidade de cerceamento e pressão nos estados que Lula performou melhor. O quadro é aberto. E Bolsonaro, por possuir a máquina, tem um benefício importante.

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A Lula cabe um arco de alianças com Tebet e Ciro. Seria importante sobretudo em São Paulo Lula dizer que entendeu o recado — e acho que esse gesto ainda não foi feito, por fatos como Lula colocar Dilma para discursar na avenida Paulista logo depois do primeiro turno. Parece que Lula teve dificuldade de entender o que o eleitor paulista queria dizer.

A primeira tarefa da campanha de Lula é não perder a vantagem construída desses 6 milhões de votos, e usar esses apoios que faltam para tentar vencer no segundo turno. E, da mesma forma que se mensurou com dificuldade essa capacidade de Bolsonaro de angariar votos a seu favor, a gente precisa ter atenção para saber se essa rejeição à figura de Bolsonaro vai permanecer no segundo turno.

Uma leitura nos últimos dias entre os agentes do mercado e na Bolsa é de que o segundo turno levará Lula a caminhar ao centro. O que significa isso, na prática, e o quanto de votos pode trazer de fato? Porque, paralelamente, temos visto Bolsonaro acenar com medidas como antecipação do Auxílio Brasil, que não necessariamente estão "ao centro" fiscalmente. Como ler esse cenário?

Isso vai depender de para quem é preciso mandar esse recado. Bolsonaro entendeu que precisa de votos dos mais pobres, essas medidas são uma mensagem de "ouvi o recado e quero mais votos de vocês". E, além disso, os mais pobres historicamente votaram menos no segundo turno em eleições passadas, então ele também conta que esse crescimento da abstenção ajude a carcomer a diferença para Lula.

O segundo recado dos candidatos é para o eleitor paulista. Em algum sentido é possível dizer que o mercado está comprado em Bolsonaro há quatro anos e tem muito pouca crítica, mesmo quando o governo erra. Mostra um mix de liberalismo e conservadorismo de costumes. Bolsonaro não tem que se preocupar com esse grupo em princípio.

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Agora, quem tem que se preocupar com esse grupo é Lula. Lula falou muito de passado [na campanha] mas não disse o que ia fazer no futuro, sempre quando perguntado disse "você lembra o que eu fiz". Lula vai ter de se esforçar para mostrar o que pretende fazer, trazer propostas de maneira a convencer esse eleitor em São Paulo.

Por essa já citada força do antipetismo, houve, na outra ponta, um debate sobre se a oposição a Bolsonaro não teria ficado muito presa a Lula e ao PT. Como o senhor lê essa representação de Lula como a principal força de oposição?

Eu parto sempre do princípio de que o lulismo é uma forma maior que o petismo. Não estou desprezando o PT como partido. Mas o Lula tem maior capacidade de tração do que o PT. Quando Lula teve seu melhor desempenho, mesmo assim o PT não teve tantos deputados quanto o partido de Bolsonaro teve hoje, por exemplo. A questão é se o PT compreende isso e se lida com isso de maneira tranquila — ou se o PT continua pensando que votos de Lula são votos do PT. É uma eleição movida por rejeição, então as pessoas votam em Lula para tirar Bolsonaro, mas uma parte também vota em Lula por causa de sua figura individualmente.


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