Os presidentes Donald Trump e Lula, durante reunião na Malásia, em 26 de outubro (Ricardo Stuckert/PR)
Redação Exame
Publicado em 13 de dezembro de 2025 às 12h58.
Última atualização em 13 de dezembro de 2025 às 13h15.
A retirada das sanções impostas pelos Estados Unidos ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta sexta-feira, 12, ocorre após meses de atritos diplomáticos entre Brasil e EUA, e reflete o novo momento da relação dos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Donald Trump.
A decisão foi formalizada pelo Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (OFAC), do Departamento do Tesouro americano, e veio após uma sequência de gestos diplomáticos e comerciais que incluem a suspensão de tarifas sobre produtos brasileiros e a retomada de contatos diretos entre Trump e Lula.
Também foram retirados da lista a esposa do ministro, Viviane Barci de Moraes, e o instituto jurídico ligado à família.
As sanções haviam sido impostas em julho, com base na Lei Magnitsky, após pressão de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro — em especial do deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) — no contexto do julgamento, pelo STF, da tentativa de golpe de Estado.
Nesta sexta-feira, 12, em São Paulo, durante o lançamento do canal SBT News, Lula afirmou que foi consultado por Trump antes da retirada das sanções impostas a Moraes.
Segundo ele, o tema foi tratado em conversa telefônica realizada na semana passada entre os dois presidentes.
"Ele perguntou: 'é bom para você?'. Eu falei: 'não é bom para mim, é bom para o Brasil e é bom para a democracia brasileira. Aqui você não está tratando de amigo para amigo, você está tratando de nação para nação. E a Suprema Corte para nós é uma coisa muito importante'"
Moraes, que também participou do evento, afirmou que a retirada das sanções representou uma “vitória do Judiciário brasileiro” e da soberania nacional.
Segundo o ministro, o desfecho demonstrou que o país não se curvou a pressões externas. "Nós podemos dizer que foi uma tripla vitória: a do Judiciário brasileiro, a da soberania nacional e, acima de tudo, a da democracia", afirmou.
Alexandre de Moraes havia sido incluído na lista de sanções em 30 de julho, ao lado de sua esposa, Viviane Barci de Moraes, e a entidade Lex – Instituto de Estudos Jurídicos, ligada à família.
No comunicado divulgado à época, o Departamento do Tesouro dos EUA afirmou que o ministro teria promovido prisões arbitrárias e censura.
A sanção ocorreu em meio ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado.
Reportagens de Reuters, Associated Press e Financial Times registraram que a decisão americana foi tomada após campanha pública de aliados de Bolsonaro nos Estados Unidos, com atuação destacada do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que passou a defender sanções internacionais contra o ministro do STF.
Desde o anúncio da punição, o governo brasileiro passou a classificar a medida como interferência externa em assuntos internos e uma afronta à soberania nacional, posição expressa publicamente pelo presidente Lula e por integrantes do Itamaraty.
A retirada das sanções ocorreu após uma reaproximação gradual entre os governos de Lula e Trump, registrada em encontros oficiais, conversas telefônicas e decisões comerciais comunicadas publicamente pelos dois países.
Em 23 de setembro, Lula e Trump se encontraram pela primeira vez durante a Assembleia Geral da ONU, em Nova York. Após a reunião, Trump declarou a jornalistas que havia sentido “química” com o presidente brasileiro, declaração registrada por agências como Reuters e Bloomberg.
Em 26 de outubro, os dois voltaram a se encontrar na Malásia, à margem da cúpula da Asean. Segundo informações divulgadas pelas assessorias presidenciais, a conversa ocorreu em tom cordial e incluiu temas comerciais.
No dia 20 de novembro, o governo americano anunciou oficialmente a suspensão da sobretaxa de 40% sobre produtos brasileiros como carne bovina, café, tomate, banana e açaí.
Em 2 de dezembro, Lula e Trump voltaram a conversar por telefone. Após a ligação, Trump afirmou publicamente que teve uma conversa “muito boa” com o presidente brasileiro.
Durante o evento do SBT News, nesta sexta, Lula detalhou esse contato. Segundo o presidente, Trump perguntou se a retirada das sanções contra Moraes seria “boa” para ele.
Lula ainda disse que a decisão americana reconheceu que “não era justo um presidente de outro país punir um ministro da Suprema Corte brasileira por cumprir a Constituição”.
Apesar das declarações públicas de Lula, o governo dos Estados Unidos não divulgou comunicado explicando os motivos da retirada das sanções.
O OFAC limitou-se a atualizar a lista de sancionados, sem apresentar justificativa formal.
De acordo com a própria legislação americana, a inclusão e a retirada de nomes da lista da Lei Magnitsky são decisões administrativas do Poder Executivo, que não exigem processo judicial nem divulgação dos fundamentos. A decisão cabe ao Tesouro, em articulação com o Departamento de Estado.
Em nota publicada nas redes sociais, Eduardo Bolsonaro lamentou a decisão do governo americano.
O deputado afirmou que a retirada das sanções ocorreu em um contexto de “falta de unidade política” entre aliados no Brasil e agradeceu publicamente a Donald Trump pelo apoio durante o período em que as sanções estiveram em vigor.
De forma reservada, aliados do PL relataram a veículos de imprensa que a decisão foi recebida como um revés político para o grupo que atuava nos EUA em defesa das punições, avaliação registrada em reportagens publicadas após o anúncio.
Após a retirada das sanções, autoridades americanas passaram a relacionar o recuo ao avanço, no Brasil, de um projeto de lei aprovado pela Câmara dos Deputados que reduz penas de condenados por crimes ligados aos atos golpistas.
Essa interpretação foi explicitada em postagem do vice-secretário de Estado dos EUA, Christopher Landau, na rede X.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) repercutiu essa leitura e passou a cobrar publicamente a votação de uma anistia no Senado. Recentemente, Flávio lançou sua pré-candidatura à Presidência e desponta como principal oponente de Lula em 2026.
O governo brasileiro, por sua vez, não reconheceu essa relação e reiterou, em declarações públicas, que a retirada das sanções foi resultado do diálogo direto entre os presidentes.
A imprensa internacional repercutiu a decisão como um sinal de distensão na relação entre Brasil e Estados Unidos. Financial Times, Reuters, Associated Press, Washington Post e Bloomberg destacaram a sequência de encontros, telefonemas e a suspensão de tarifas como elementos centrais do novo momento bilateral.
A Reuters registrou que Lula afirmou ter pedido pessoalmente a Trump a revogação das sanções, sem oferecer contrapartidas.
O Financial Times destacou que o governo brasileiro rejeitou desde o início qualquer pressão externa sobre o Judiciário.
A Bloomberg relacionou a retirada das sanções ao alívio tarifário concedido anteriormente às exportações brasileiras.
Criada em 2012, durante o governo Barack Obama, a Lei Magnitsky é o principal instrumento usado pelos Estados Unidos para sancionar estrangeiros acusados de violações de direitos humanos ou corrupção.
As medidas incluem bloqueio de bens, restrições financeiras e proibição de entrada no país.
A aplicação e a retirada das sanções são decisões administrativas do Executivo americano, conduzidas pelo OFAC, sem necessidade de processo judicial.
Desde 2017, mais de 650 pessoas foram sancionadas com base na lei, segundo dados do próprio governo dos EUA.