Atividade alcançou o montante de R$ 9,8 bilhões em 2022, com meta de chegar à quantia de R$ 12,5 bilhões este ano (krisanapong detraphiphat/Getty Images)
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Publicado em 27 de julho de 2023 às 08h00.
Por Pierpaolo Bottini e Ilana Martins Luz*
A discussão sobre a regulamentação de apostas esportivas está em pauta desde que o governo federal decidiu regulamentar a lei que trata do tema, aprovada em 2018. Antes dessa data, qualquer espécie de aposta era considerada contravenção penal no Brasil, punida com pena de prisão simples de três meses a um ano, além de multa.
A Lei nº 13.756/2018, ao criar a modalidade lotérica denominada “apostas de quota fixa”, descriminalizou a conduta. Esse tipo de aposta consiste em uma loteria em que o apostador tenta prever resultados em eventos esportivos reais, como placar, número de cartões amarelos e vermelhos, autores e tempos dos gols, com a característica comum de que, em todas, o apostador já sabe, no momento da aposta, quanto pode ganhar em caso de acerto, por meio da aplicação de um multiplicador — a quota fixa — do valor apostado.
Essa lei ainda precisa ser regulamentada pelo Ministério da Fazenda, o que não ocorreu até a presente data. Isso não impediu, no entanto, o desenvolvimento do mercado de apostas esportivas online, disponível a consumidores brasileiros por meio de sites de empresas de apostas constituídos e registrados no exterior, em países em que tal atividade é legalizada e regulamentada.
Os números dessa atividade em relação aos consumidores brasileiros alcançaram o montante de R$ 9,8 bilhões no ano de 2022, com meta de chegar à quantia de R$ 12,5 bilhões em 2023. A relevância dessa atividade é evidente: todos os 20 times de futebol da série A do Campeonato Brasileiro têm algum contrato de patrocínio com alguma empresa de apostas fixas. Nos Estados Unidos, estima-se que, em 2021, o mercado tenha movimentado US$ 74,2 bilhões. Levantamento feito pelo banco britânico Barclays aponta que apenas a Copa do Mundo do Qatar em 2022 teria movimentado um total de US$ 35 bilhões em apostas esportivas, valor 65% superior ao do mundial anterior.
Os montantes envolvidos demonstram a relevância dessa atividade econômica e a importância de uma regulamentação que não engesse o mercado, mas que, ao mesmo tempo, garanta a tributação das atividades e previna a lavagem de dinheiro. Alguns pontos dessa futura regulamentação foram apresentados pelos representantes da Fazenda em audiência pública na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados.
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Segundo informações divulgadas na imprensa, o Ministério da Fazenda pretende estabelecer as seguintes regras na regulamentação da matéria:
Para além disso, ao que tudo indica, será criada uma agência reguladora para o setor. Como se sabe, o segmento de apostas esportivas, mesmo que explorado de forma legal, é vulnerável à prática de lavagem de capitais, porque podem servir de mecanismo para a transformação do capital ilícito em capital lícito, a exemplo das hipóteses em que o sujeito cria contas com identidade fictícia para a pulverização de depósitos com valores oriundos de infração penal antecedente, apostas combinadas com corrupção desportiva, resgates dos valores depositados em casas de jogos sem a realização de efetivas apostas, entre outros.
O setor também é sensível a práticas de corrupção privada desportiva, que consiste nas condutas de solicitar, aceitar promessa, dar ou prometer vantagem de qualquer natureza para fins de falsear o resultado de competições desportivas ou eventos associados. Tais condutas são alvo de preocupação tanto no âmbito nacional (artigos 41-C e 41-D do Estatuto do Torcedor, Lei nº 10.671/2003) quanto no âmbito internacional (a exemplo da Convenção sobre a Manipulação de Competições Desportivas, conhecida como Convenção de Macolin).
A ideia é que a agência reguladora analise os pedidos de outorga, as condições de cada empresa do setor e possa, ainda, fixar standarts mínimos de conduta a serem adotados pelas pessoas jurídicas que atuam nesse segmento, bem como aplicar penalidades para aqueles que não se adequarem.
Não se espera que, com isso, todos os atos de lavagem de dinheiro deixem de ocorrer nesse âmbito nem que os tributos arrecadados resolvam os graves problemas fiscais da União, mas trata-se de um passo importante em direção a um ambiente mais regulado e mais seguro para empresas e clientes que atuam no setor.
*Bottini é professor livre docente do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Ilana é advogada criminalista e doutora em Direito Penal pela USP