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Todo pecado será perdoado no Congresso brasileiro

Desde 2014, quando teve início a Lava Jato, partidos que participaram do esquema não fizeram praticamente nada para punir os envolvidos

Congresso: segundo dados oficiais do STF, do total de 594 congressistas, 237 estão sendo investigados (Paulo Whitaker/Reuters)

Congresso: segundo dados oficiais do STF, do total de 594 congressistas, 237 estão sendo investigados (Paulo Whitaker/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 3 de outubro de 2017 às 15h55.

Última atualização em 3 de outubro de 2017 às 17h15.

Brasília - É preciso muita coisa para conseguir ser expulso do Congresso Nacional.

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de afastar do mandado o senador e ex-candidato presidencial Aécio Neves (PSDB-MG) provocou clima de revolta no Congresso, marcado por centenas de denúncias de corrupção. Apropriada ou não a determinação dos ministros da Primeira Turma da Suprema Corte, o fato é que desde 2014, quando teve início a Operação Lava-Jato, os partidos que participaram do esquema não fizeram praticamente nada para corrigir seus erros e punir os envolvidos.

Há dezenas de políticos alvos da Lava-Jato no Congresso que não sofreram nenhum tipo de investigação por quebra de decoro. Os conselhos de ética da Câmara e do Senado, que têm por função zelar pelo comportamento dos parlamentares, não investigam envolvidos no maior escândalo de corrupção do país há mais de um ano. Os números são impressionantes. Segundo dados oficiais do STF, do total de 594 congressistas, 237 estão sendo investigados, o que corresponde a 40% do Legislativo brasileiro. Deste total, no qual estão não só envolvidos na Lava-Jato, 47 deputados e 8 senadores já se tornaram réus e 1 deputado foi condenado.

Apenas Eduardo Cunha (PMDB) e Delcídio do Amaral (ex-PT, sem partido) acabaram cassados por corrupção e lavagem de dinheiro no âmbito da operação. Agora, aguarda-se o desfecho da iniciativa do STF quanto a Aécio, que já obteve de colegas de Senado o arquivamento de uma denúncia no Conselho de Ética. O presidente do colegiado, João Alberto (PMDB), afilhado político do ex-presidente José Sarney, não deu andamento ao processo apresentado pela Rede contra o tucano por falta de provas. Pela decisão do STF, que será avaliada pelo plenário da Suprema Corte na próxima semana, Aécio não pode ir ao Congresso e deve ficar em sua casa à noite, num mix de prisão domiciliar e regime semiaberto. O político perdeu a Presidência da República para Dilma Rousseff em 2014 por apenas 3,2% dos votos.

Enquanto se assiste a uma paralisia muito conveniente para os congressistas, o STF já arquivou investigações de deputados e senadores que prescreveram por idade. São os casos dos senadores Garibaldi Alves (PMDB), Marta Suplicy (PMDB) e José Agripino Maia (DEM), e dos deputados Jarbas Vasconcelos (PMDB) e Roberto Freire (PPS).

Para além da Lava-Jato, há ao menos duas situações embaraçosas: o único deputado condenado, Celso Jacob (PMDB-RJ), está preso no regime semiaberto, trabalha como parlamentar durante o dia e dorme na prisão. Ele foi condenado a sete anos e dois meses de reclusão pelos crimes de falsificação de documento público e dispensa de licitação. Outro parlamentar, Ezequiel Fonseca (PP-MT), foi flagrado em vídeo recebendo maços de dinheiro de propina, mas não sofreu nenhum tipo de punição da Câmara até o momento.

Desde o começo da Operação Lava-Jato, em 2014, são alvos da investigação ao menos 60 deputados e 30 senadores. Para que um parlamentar seja processado, é preciso que o Conselho de Ética seja provocado por algum partido ou qualquer cidadão. E só depois de chegar algum pedido, o colegiado avalia se é o caso de instaurar um processo disciplinar. Este ano, nenhum caso relacionado aos políticos envolvidos na Lava-Jato foi aberto.

Um dos autores do processo contra Cunha no Conselho de Ética da Câmara, o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), disse à Bloomberg que o corporativismo dominante no Congresso fez com que seu partido, um dos mais atuantes no combate à corrupção, parasse de apresentar denúncias.

“Confesso que a gente cansou um pouco. É como malhar em ferro frio. Não temos a ilusão quanto ao andamento de processos no Conselho de Ética. Há muito espírito de corpo. A ética e a transparência na prática política deveriam ser um valor, mas no Parlamento isso não é preponderante e qualquer investigação morre na praia”, afirmou o parlamentar.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), autor do processo que foi arquivado contra Aécio no Senado, diz de forma irônica que corrupção deixou de ser crime no Congresso, tamanha a quantidade de envolvidos.

“O conselho de ética virou uma peça decorativa. Corrupção para esse colegiado deixou de ser crime”, disse o parlamentar.

Escândalos envolvendo congressistas não são surpresa no Brasil. Em 2013, o então deputado Natan Donadon foi condenado e preso por peculato e formação de quadrilha. Novamente, o corporativismo falou mais alto. Ele sofreu processo de perda do mandato, mas foi absolvido pelos deputados porque o voto era secreto. Foi então que a Câmara resolveu mudar as regras e fazer uma nova aferição com a votação aberta. Só então Donadon acabou tendo o mandato cassado. Outro caso que abalou o país foi o de Hildebrando Pascoal, que se tornou conhecido como o deputado da motosserra. Coronel de polícia, foi preso por esquartejar um desafeto. Ele foi cassado pela Câmara em 1998 e expulso do seu partido, na época PFL, hoje DEM, depois de condenado por liderar grupo de extermínio.

Até o assassinato de um senador já ocorreu nas dependências do Congresso. Em 1963, o senador Arnon de Mello, pai do ex-presidente Fernando Collor de Mello, atirou contra um senador conterrâneo e acertou sem querer um terceiro senador que passava em meio à briga. José Kairala tomou um tiro no abdômen e morreu. Arnon de Mello chegou a ser preso, mas não foi cassado.

A expectativa é de que o Senado também perdoe Aécio, revertendo a decisão do Supremo em votação esperada para esta terça-feira.

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