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Dividendos magros em 2026? Mercado debate efeito do novo imposto

Empresas antecipam dividendos neste ano para escapar da tributação de 10% no próximo, mas o cenário futuro dos proventos dependerá de juros, eleições e estratégias corporativas

Nova tributação: as empresas terão de recalcular se vale mais a pena pagar dividendos, recomprar ações ou optar pela subscrição (Leandro Fonseca/Exame)

Nova tributação: as empresas terão de recalcular se vale mais a pena pagar dividendos, recomprar ações ou optar pela subscrição (Leandro Fonseca/Exame)

Publicado em 18 de dezembro de 2025 às 06h00.

O ano de 2026 vai marcar o fim de três décadas de isenção sobre lucros e dividendos das empresas. A mudança parece brusca, mas na verdade é o capítulo mais recente de um debate que atravessa a política econômica brasileira ao longo de diferentes governos.

Até 2025, a tributação de proventos nunca havia conseguido apoio suficiente para avançar. Isso mudou quando a medida passou a servir de contrapartida para a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Rena (IR) para quem ganha até R$ 5 mil mensais — o maior aumento desde a redemocratização.

A mudança não só impacta o fluxo financeiro futuro das empresas como já produziu efeitos imediatos no mercado corporativo. Algumas companhias anteciparam o pagamento de proventos antes do fim do ano, com o objetivo de evitar a incidência da tributação de 10% sobre a distribuição de lucros acima de R$ 50 mil aos acionistas, prevista para ocorrer a partir de 1o de janeiro.

Segundo levantamento do BTG Pactual (do mesmo grupo controlador da EXAME), no último mês de novembro as companhias anunciaram 68 bilhões de reais em dividendos, dos quais 35,7 bilhões de reais são extraordinários.

A outra metade — 33,1 bilhões de reais — é tratada pelas empresas como parte da distribuição obrigatória, mas o banco avalia que boa parte também foi antecipada para escapar da taxação futura.

A antecipação elevou o ritmo de emissões de dívida. Muitas empresas recorreram ao mercado de renda fixa para captar recursos e financiar os proventos, num movimento identificado pelo banco de investimento UBS BB. “Estamos vendo isso em nosso pipeline”, diz o chefe do banco, Anderson Brito.

Com tantos dividendos sendo antecipados, isso quer dizer que as empresas vão distribuir menos dividendos em 2026? Uma parte do mercado acredita que sim.

Victor Natal, estrategista para Pessoa Física do Itaú BBA e responsável pela carteira Dividendos da instituição, avalia que o payout (o percentual do lucro distribuído) pode até não ser alterado, mas o volume de lucro disponível não vai escapar da corrida pela antecipação.

Como as empresas vão consumir parte do lucro acumulado ainda em 2025, ou no início de 2026, caso a ampliação do prazo seja aprovada, haverá menos espaço para distribuir dividendos extras ao longo do ano seguinte.

“Provavelmente teremos um impacto em cima da capacidade de pagamento de dividendo das empresas, que já vão ter consumido esse lucro acumulado para fazer a distribuição extraordinária e, por isso, terão menos espaço para fazer no ano seguinte”, diz Natal.

As companhias são obrigadas, por lei, a distribuir proventos a cada exercício. Historicamente, a maioria das empresas adota o percentual de 25% como padrão, por uma combinação de herança legal e necessidade de manter a atratividade junto aos investidores.

O BTG observa que a tendência é que esses proventos ordinários se mantenham estáveis ou até subam nominalmente no caso de empresas desalavancadas e com boa geração de caixa. “Mas o dividendo extraordinário, não”, afirma o head de análise de renda variável da instituição, Bruno Henriques.

Segundo ele, o cenário de antecipação pode afetar esses proventos extras, que são mais flexíveis e dependem de lucros excepcionais ou de decisões específicas da administração.

Já outra parcela do mercado não acredita que as chamadas “vacas leiteiras” vão secar. O chefe do UBS BB avalia que “2026 não será um ano de dividendos magros”, mas de pagamentos robustos, impulsionados pela expectativa de queda da taxa básica de juros.

Se a Selic recuar dos atuais 15% para perto de 12%, como projeta o UBS BB, as empresas terão menos despesa financeira e, portanto, mais lucro líquido disponível para distribuir.

“O impacto da tributação sobre dividendos na precificação das empresas é pequeno. Com a queda dos juros, espera-se mais fluxo de recursos e maior espaço para a bolsa subir. Por isso, os investidores veem esse efeito como marginal tanto na distribuição de dividendos quanto no preço das ações”, diz Brito.

O BTG e o Itaú BBA também reconhecem que o afrouxamento da política monetária pode aumentar o lucro e recompor a capacidade de distribuição de dividendos. Mas também apontam um terceiro fator que pode adicionar incertezas quanto ao tamanho dos dividendos em 2026: a volatilidade do ano eleitoral.

Sem saber o que vem pela frente, as empresas podem adotar uma postura mais conservadora, guardando caixa ao invés de distribuir, o que torna o efeito líquido sobre os dividendos incerto e variável caso a caso.

“As empresas que se beneficiam do corte de juros e poderiam distribuir mais dividendos são justamente aquelas que já pagam dividendos e podem ter antecipado esse pagamento”, diz Victor Natal, do Itaú BBA.

Henriques, do BTG, diz que, diante da nova tributação sobre dividendos, as empresas também terão de avaliar cuidadosamente a melhor forma de remunerar seus acionistas.

Tradicionalmente, existem três maneiras principais de repartir valor: distribuição de dividendos, recompra de ações (buyback) e subscrição. “As empresas vão fazer conta para entender, com a tributação, o que será mais interessante, pensando no retorno para o acionista. Esse é o primeiro ponto”, afirma.

O preço da ação também deve ser observado, que pode tornar mais interessante uma recompra em vez do pagamento de dividendos, e o percentual de lucro destinado a dividendos definido no estatuto da empresa, de acordo com o especialista.

“Agora, do ponto de vista do investidor, ele precisa entender o preço de entrada, os fundamentos do negócio, se estão de pé e valendo. Porque, se ele investir no preço errado, corre um risco de perda de capital, e isso independe da tributação; ele vai entregar o dividendo”, afirma Henriques.

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