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'Sina de Ofélia': Taylor Swift pode derrubar música feita por IA?

Caso levanta debate jurídico sobre direitos autorais, obras derivadas e limites legais da música gerada por inteligência artificial

Taylor Swift: saiba se cantora pode derrubar versão de música feita por IA  (YouTube/Reprodução)

Taylor Swift: saiba se cantora pode derrubar versão de música feita por IA (YouTube/Reprodução)

Publicado em 24 de dezembro de 2025 às 09h56.

Última atualização em 24 de dezembro de 2025 às 09h59.

Para William Shakespeare, o destino de Ofélia foi a loucura e o afogamento, resultado de um sistema que não lhe deu voz nem escolha. Para Taylor Swift, a personagem virou metáfora de uma tragédia evitada, reescrita pelo amor e pela sobrevivência.

E, para a inteligência artificial (IA), Ofélia ganhou uma nova "sina": transformou-se em um hit em português no TikTok, criado por algoritmos. Agora, a música entra no centro de uma discussão sobre direitos autorais.

A circulação da música “Sina de Ofélia”, gerada por IA e associada ao universo criativo de Swift, colocada na voz dos cantores brasileiros Luisa Sonza e Dilsinho, expõe uma nova zona cinzenta da indústria musical. A pergunta central não é artística, mas jurídica: Swift pode derrubar uma música feita por inteligência artificial?

Quando a inspiração vira problema legal

Tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil, a legislação de direitos autorais garante ao titular da obra original o controle exclusivo sobre obras derivadas. Isso inclui qualquer criação baseada em uma obra pré-existente que utilize elementos reconhecíveis, como melodias, harmonias, estruturas musicais, arranjos ou letras.

Nos EUA, se uma música como “Sina de Ofélia” reproduzir partes identificáveis de “The Fate of Ophelia”, de Swift, ela pode ser enquadrada como obra derivada não autorizada, o que abre caminho para notificações de remoção e disputas legais.

Diretrizes do U.S. Copyright Office reforçam que obras criadas exclusivamente por inteligência artificial, sem intervenção humana criativa relevante, não são protegidas por direitos autorais. Ainda assim, esse tipo de obra pode infringir direitos de terceiros, criando um paradoxo jurídico: não tem dono, mas pode violar direitos alheios.

No Brasil, a Lei nº 9.610/1998 segue lógica semelhante. A norma exige autorização prévia do titular para qualquer adaptação, transformação ou criação baseada em obra protegida.

Mesmo quando há alguma transformação criativa, o uso de partes identificáveis da obra original sem consentimento é vedado. Segundo advogados, obras criadas exclusivamente por inteligência artificial sem intervenção humana criativa significativa não podem ser registradas como obras autorais.

Obras feitas integralmente por algoritmos não podem ser registradas, mas isso não impede que sejam consideradas irregulares se utilizarem material protegido. Isso significa que, nos dois países, o argumento de que uma música foi criada por IA não elimina a necessidade de autorização quando há reaproveitamento identificável de uma obra existente.

Associações de direitos autorais, inclusive no Brasil, têm reforçado esse entendimento e defendem que tanto o uso direto quanto o treinamento de sistemas de IA com obras protegidas devem ocorrer com consentimento e remuneração adequados.

DMCA: o botão de emergência da indústria

O caminho mais rápido para a remoção de faixas desse tipo é a notificação DMCA. O mecanismo permite que artistas e gravadoras solicitem a retirada imediata de conteúdos considerados infratores em plataformas como Spotify, YouTube e TikTok.

O histórico recente mostra que as plataformas costumam agir com rapidez quando recebem notificações formais de violação.

Em abril de 2023, por exemplo, a música “Heart on My Sleeve”, criada por IA com vozes que imitavam Drake e The Weeknd, viralizou nas redes sociais e acumulou milhões de reproduções em poucos dias. Após o envio de notificações DMCA pela Universal Music Group, a faixa foi retirada de Spotify, Apple Music, YouTube, TikTok e Deezer sem que houvesse qualquer decisão judicial.

Movimento semelhante ocorreu nos anos seguintes com deepfakes musicais envolvendo artistas sob contrato da Sony Music. A gravadora informou ter solicitado a remoção de dezenas de milhares de faixas geradas por IA que imitavam vozes e estilos de artistas como Harry Styles e Beyoncé, todas retiradas das plataformas após pedidos formais baseados em direitos autorais e uso indevido de identidade artística.

Também houve casos envolvendo artistas falecidos. Em 2025, o Spotify removeu músicas geradas por IA que haviam sido publicadas como se fossem faixas inéditas de nomes como Blaze Foley e Guy Clark, após notificações que apontavam uso enganoso de identidade e violação de direitos.

Além desses episódios pontuais, plataformas de streaming vêm realizando remoções em massa de conteúdos associados à IA desde 2023, muitas vezes combinando notificações DMCA com políticas internas contra fraude e deepfakes.

Em todos esses casos, a retirada ocorreu de forma administrativa e rápida, reforçando que a notificação de direitos autorais continua sendo o caminho mais eficaz para derrubar músicas consideradas irregulares — mesmo antes de qualquer disputa judicial.

Fair use: a principal linha de defesa

Criadores de músicas de IA costumam recorrer ao argumento de fair use (uso justo), alegando que a obra é transformativa ou apenas inspirada em um estilo artístico.

O problema é que os tribunais avaliam fatores como grau de semelhança, quantidade de material reaproveitado e impacto no mercado da obra original. Quanto maior a proximidade técnica e comercial, menor a chance de essa defesa prosperar.

O que ainda não está resolvido

Apesar das remoções em massa, o tema segue sem definição definitiva. Tribunais ainda não decidiram se o treinamento de modelos de IA com músicas protegidas configura violação automática ou se pode ser enquadrado como uso justo.

Também não há consenso sobre até que ponto imitar um estilo musical, sem copiar elementos específicos, é suficiente para caracterizar infração.

O possível destino de “Sina de Ofélia”

Na prática, Swift tem instrumentos eficazes para solicitar a retirada da música caso identifique semelhança substancial com sua obra. Um pedido formal pode bastar para que a faixa desapareça das plataformas.

Diferentemente da Ofélia de Shakespeare, o destino da música ainda não está selado. Mas, na era da IA, sobreviver pode depender menos da tragédia — e mais de uma notificação jurídica bem fundamentada.

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