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Como Thiaguinho fez do pagode um império de R$ 1,5 bi com a 'Tardezinha'

Nos bastidores de Interlagos, Rafael Liporace e Ellen Barbosa revelam os segredos por trás da maior turnê da história do Brasil

Tardezinha: conheça os nomes por trás da turnê de Thiaguinho, a maior do Brasil (Reprodução/Instagram @tardezinha)

Tardezinha: conheça os nomes por trás da turnê de Thiaguinho, a maior do Brasil (Reprodução/Instagram @tardezinha)

Maria Eduarda Lameza
Maria Eduarda Lameza

Estagiária de jornalismo

Publicado em 29 de dezembro de 2025 às 17h14.

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"A gente tem que começar a se acostumar que o mérito é nosso", afirma Ellen Barbosa, CEO da Paz e Bem Música e Entretenimento e irmã do cantor Thiaguinho. Ela diz essa frase com um misto de orgulho e surpresa enquanto ajusta os últimos detalhes da infraestrutura que, em menos de 24 horas, se transformaria na maior e mais longa roda de pagode do mundo.

Era meio-dia de uma sexta-feira, 19 de dezembro, no Autódromo de Interlagos, em São Paulo, quando Ellen Barbosa e Rafael Liporace contavam essa história para a EXAME. Em volta, 5 mil trabalhadores montavam um palco 360 graus que receberia 80 mil pessoas no dia seguinte para um show de 7 horas e 30 minutos. O grand finale de uma década que redefiniu o que significa fazer entretenimento ao vivo no Brasil.

A 'Tardezinha' encerra 2025 com 907 mil pessoas em 26 cidades no Brasil e no exterior (incluindo Miami, Lisboa, Luanda e Sydney), faturamento de R$ 305 milhões — um crescimento de 22% em relação a 2024 —, 185 horas de música ao vivo e 110 mil empregos gerados.

Em 10 anos, a turnê acumulou R$ 1,5 bilhão em receita, reuniu 15 patrocinadores de 12 segmentos diferentes (um aumento de 150% em relação à turnê anterior) e se consolidou como o maior sucesso do entretenimento brasileiro. Agora, após bater todos os recordes possíveis, o projeto anuncia uma pausa. A próxima 'Tardezinha' só acontece em 2028.

Mas como uma roda de samba criada em 2015 no Rio Beach Club, para pouco mais de mil pessoas, virou um negócio que concorre em estrutura com Rock in Rio e Lollapalooza? A resposta está na combinação de talento artístico, método empresarial e paciência, tudo comandado por uma sociedade que, segundo os próprios, funciona na base da "naturalidade" e da "conexão".

Visão desde o primeiro dia

"Desde o primeiro dia, a gente percebeu que ia ser grande. E quando a gente se tornou grande, continuamos com a mentalidade do pequeno", diz Rafael Liporace, produtor e um dos sócios da 'Tardezinha' ao lado de Thiaguinho e Rafael Zulu.

"Thiaguinho cantava para mil e poucas pessoas, saía dali, duas horas depois estava na Globo para milhões de pessoas. Se você tinha um artista com esse alcance, com a disponibilidade e a vontade, a gente sabia que isso ia escalar para onde escalou", afirma. "A gente teve paciência."

Com o tempo, a estratégia funcionou e o projeto cresceu. Em 2022, Ellen Barbosa assumiu oficialmente como CEO da Paz e Bem Música e Entretenimento, empresa que centraliza toda a operação de Thiaguinho. Mas o processo, segundo ela, foi natural. "Quando eu assumi, não houve um convite formal tipo 'olha, você quer ser minha empresária?'. As coisas foram acontecendo naturalmente", afirma.

Thiaguinho cuida da parte artística e, Barbosa, do burocrático. "Eu sabia que se a gente fizesse uma dupla, ia dar certo, porque a parte artística é 100% com ele, e eu fico muito com o burocrático. A gente sentiu que daria para fazer tudo dentro de casa. A gente não ia precisar mais de terceirizados", diz.

Antes da empresa, Thiaguinho não acompanhava os números de perto. "Eu trouxe ele para dentro do escritório e falei: 'Ó, vai funcionar assim. Você precisa saber quantos shows você faz por mês, porque você faz tantos shows por mês'. E seguimos até hoje", afirma a CEO.

'Tardezinha': 80 mil pessoas lotaram o Autódromo de Interlagos (Reprodução/Instagram @tardezinha)

'Marcas viram o Brasil em nós'

A profissionalização permitiu que a 'Tardezinha' diversificasse receitas além da bilheteria. Hoje, o faturamento vem de: bilheteria (51%), bar (25%), patrocínios (15%) e outras frentes (9%).

Essas frentes incluem produtos proprietários como a Ita-Draft Tardezinha (cerveja co-criada com Itaipava que vendeu 21 milhões de unidades em 2023), cursos de pós-graduação em gestão de eventos pela Estácio (R$ 199/mês), Escola de Música da Tardezinha (em parceria com Central Única das Favelas e Estácio) e até Agência de Viagens da Tardezinha (joint venture com a Zupper).

Até 2024, a turnê tinha apenas três categorias de patrocinadores, além de bebidas. Em 2025, saltou para 15 segmentos, incluindo banco (Bradesco), automóvel (Citroën), transporte por aplicativo (Uber), alimentos (Camil), beleza (Avon, Neutrox) e protetor solar (NIVEA SUN).

"As marcas começaram a enxergar na gente o público brasileiro", diz Liporace.

"A 'Tardezinha' tem a capacidade de andar pelo Brasil. A gente é o único projeto de grande proporção que não faz o êxodo para vir para o Rio e São Paulo. A gente vai para o Brasil", afirma.

O que mais impressionou o produtor foi a naturalidade com as marcas buscaram o projeto. "A gente fechou as cotas de patrocínio antes da turnê abrir. Quando a gente rodou o primeiro trimestre, aconteceu um movimento das marcas grandes nos falarem: 'a gente precisa entrar, a gente quer fazer parte'."

Inovações e desafios de um país continental

O palco 360 graus foi a primeira grande ruptura. "O palco de fundo é muito mais confortável para o artista e para a banda. Quando chove com vento, a banda se entrega, molhando mesmo", explica Ellen. Mesmo assim, escolheram o formato mais difícil. "Como a 'Tardezinha' foi pensada com muito carinho para ser diferente, a gente não tinha como fazer o palco no mesmo padrão que todo mundo fazia."

O resultado foi uma aproximação única com o público. No último show da turnê, dia 20 de dezembro, fãs relataram à EXAME que frequentam múltiplas edições (alguns foram a 8, 10, 12, até 20 'Tardezinhas') e falaram de uma "sensação de afeto, de proximidade" impossível de replicar em formatos tradicionais, mesmo com 80 mil pessoas.

A maior inovação é, ao mesmo tempo, o maior desafio. "A maior dificuldade operacional é entregar um padrão 'Tardezinha' num país continental e, esse ano, fora do Brasil", diz Liporace.

O exemplo mais extremo foi em Angola. "O palco no nosso formato não existia lá. Precisamos soldar as peças à mão", afirmou.

Sobre a duração dos shows, Liporace é afirma que "isso era impensável antes da 'Tardezinha'. Hoje, é quase mandatório no mercado você ter shows mais longos, e meio que foi uma imposição do Thiaguinho."

'Tardezinha': Palco 360º foi inovação do grupo em 2015 (Reprodução/Instagram @tardezinha)

Representatividade, entrega e essência

Em um país onde o cenário do entretenimento musical é majoritariamente dominado pelo sertanejo, com grandes festivais como Barretos e Vila Mix, a 'Tardezinha' transformou esse paradigma. "O público do pagode também merece o mesmo nível do Rock in Rio e do The Town. Principalmente por ser o segmento que veio do povo preto", diz Barbosa.

"Antes, as pessoas viam só como uma roda de samba: pega cinco instrumentos e coloca ali. Agora, nós colocamos o pagode onde ele deve estar", diz.

Além da escola de música e dos cursos universitários, a 'Tardezinha' promove arrecadação e distribuição de cestas básicas. Em 2025, foram 451 toneladas de alimentos arrecadados (crescimento de 214% sobre 2024), equivalentes a 34.692 cestas básicas.

Os números de geração de emprego também impressionam: 110 mil empregos ao longo da turnê de 2025 (crescimento de 10% sobre 2024), sendo 5 mil diretos só no show de Interlagos. "A gente não está falando só da grana que a gente gera. A gente está falando do entorno. Os hotéis estão cheios, o Uber movimenta, a cidade movimenta, as pessoas vêm para cá", diz Liporace.

No show realizado no começo do mês no Rio de Janeiro, foram gerados cerca de 8 mil empregos diretos. 40% das 80 mil pessoas na plateia eram de fora da cidade, e 20% eram de fora do estado.

"Thiaguinho, Ellen, Zulu não nasceram dos grandes centros, não nasceram de família rica, são filhos de professores. Ninguém veio de berço. Então era uma obrigação nossa devolver", afirma Liporace. "A educação é o que transforma, foi um caminho natural."

Para Liporace, o 'segredo' do sucesso é manter a essência. "Se você muda a essência, você perde o que é o negócio. A 'Tardezinha' de hoje é a mesma do Rio Beach Club de 2015, só que escalada na potência mil."

Da raíz ao futuro

Após bater todos os recordes possíveis, a 'Tardezinha' anuncia que a próxima turnê só acontece em 2028. A decisão é estratégica. "A gente entende que, pelo tamanho que tomamos, a gente precisa dar esse respiro", diz Liporace.

Mas Thiaguinho não para. Além de querer mais tempo com a família e seu primeiro filho, Bento, que nasceu em 2025, ele lança, em janeiro de 2026, um novo projeto:  o álbum "Bem Black", voltado para Black Music.

"Já era um projeto que estava guardadinho faz tempo", explica a CEO. "A gente criou o slogan 'da raiz ao futuro', porque é como se a gente estivesse resgatando de onde veio e para onde a gente quer ir."

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