Biden (EUA) e Macron (França) em reunião da Otan nesta quinta-feira, 24: pressões em meio à guerra na Ucrânia (THOMAS COEX/AFP)
Da redação, com agências
Publicado em 24 de março de 2022 às 07h09.
Última atualização em 24 de março de 2022 às 09h41.
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, está na Europa para uma série de reuniões nesta quinta-feira, 24. O assunto principal são os próximos passos das potências ocidentais na guerra na Ucrânia, que chega hoje a 29 dias.
Em Bruxelas, na Bélgica, para onde embarcou ontem, Biden participa nesta manhã de uma cúpula da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).
O evento é seguido ainda hoje por uma reunião do G7, grupo que reúne sete das maiores economias do mundo, e finalmente um encontro com líderes da União Europeia (UE).
As três cúpulas têm agendas centradas na guerra, com pressões para que novas sanções sejam aplicadas.
Na sexta e no sábado, o presidente americano visitará ainda a Polônia, país fronteiriço com a Ucrânia que foi destino de mais de 2 milhões de refugiados. Biden se encontrará com o presidente polonês, Andrzej Duda.
No voo de Washington, a bordo do avião presidencial Air Force One, o assessor de Segurança Nacional americano, Jake Sullivan, antecipou que os Estados Unidos vão anunciar "um pacote de sanções contra figuras políticas", assim como "oligarcas" e "entidades" russas.
Tem havido pressões de países do leste europeu, mais próximos à fronteira com a Rússia, para que a Europa implemente sanções a exportações energéticas russas, o que será um dos principais assuntos nas reuniões de hoje.
Os EUA baniram importações de petróleo russo neste mês, mas fazer o mesmo na Europa traria implicações amplas, já que 40% do gás da União Europeia vem da Rússia. Por isso, as sanções até agora tiveram como foco sobretudo o setor financeiro e empresários.
O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, discursou em mensagem pré-gravada na manhã desta quinta-feira na reunião da Otan, onde pediu "apoio irrestrito" aos esforços de guerra ucranianos e armas ofensivas.
"Vocês podem nos dar 1% de seus aviões. 1% de seus tanques. Um porcento!", diz na mensagem, em vídeo.
Mais cedo, ao falar sobre as reuniões europeias, ele havia dito que ucranianos estavam "esperando por passos significativos".
"Nestas três reuniões nós veremos: quem é um amigo, quem é um parceiro, e quem nos traiu por dinheiro", disse antes da reunião, afirmando que "os russos já começaram a fazer lobby por seus interesses".
As principais demandas da Ucrânia são, além de aeronaves, o fechamento do espaço aéreo, reforçadas por Zelensky no discurso de hoje.
A zona de exclusão aérea faria com que aviões russos pudessem ser derrubados pela Otan caso cruzassem o espaço aéreo ucraniano, mas é improvável até o momento, uma vez que a aliança ocidental afirma que tal restrição desencadearia uma guerra mundial.
O presidente ucraniano também falou nesta quinta-feira ao Parlamento da Suécia, em meio à peregrinação que o político tem feito em parlamentos de países aliados.
Aos suecos, disse que a Ucrânia merece ser um "membro total" da União Europeia, pediu que o país amplie as sanções contra a Rússia e que, no futuro, ajudem na reconstrução da Ucrânia - cuja economia deve encolher um terço com a guerra.
"Não estamos lutando só pelo povo da Ucrânia, mas pela segurança da Europa, e nós mostramos que merecemos ser plenamento integrados como membros da UE", disse aos suecos.
A Suécia é também um dos países-chave na crise por não fazer parte da Otan e, assim como a Finlândia, ter sido ameaçada por Putin - que deseja que as duas nações não entrem na aliança.
Mais cedo nesta quinta-feira, o Reino Unido anunciou novo pacote de sanções contra 65 empresas e oligarcas russos, “focando indústrias estratégicas, bancos e elites empresariais”.
O premiê britânico, Boris Johnson, disse que, em sua opinião, "a linha vermelha já foi cruzada" pela Rússia, em entrevista à rádio LBC hoje.
"Ele está bombardeando, indiscriminadamente, centros civis", disse sobre o presidente russo, Vladimir Putin.
Johnson também pediu medidas contra reservas de ouro. "Podemos fazer mais para impedi-lo de usar suas reservas de ouro, por exemplo, além de suas reservas em dinheiro?", questionou. "Quanto mais pressão aplicamos agora, particularmente em coisas como ouro, eu acredito que mais podemos encurtar a guerra."
Reservas internacionais russas em dinheiro em países que aplicaram sanções já foram bloqueadas, embora a Rússia também tenha mais de 10% das reservas na China, por exemplo.
Enquanto isso, o porta-voz russo Dmitry Peskov disse nesta quinta-feira que vê Boris Johnson como o "mais ativo na corrida para ser anti-russo" e que "isso levará a um beco sem saída da política externa". A fala foi registrada pela agência de notícias Ria, citada pelo jornal britânico The Guardian.
As discussões acontecem um dia depois de a Rússia anunciar, na quarta-feira, 23, que passará a exigir pagamento em rublos (moeda russa) por suas exportações de petróleo e gás ao que considera "nações hostis", o que inclui uma lista de países da União Europeia.
A medida em Moscou visa, na prática, ajudar a fortalecer a moeda russa, que despencou desde o início da guerra e em meio às reservas em dólar e euro bloqueadas.
Nesta quinta-feira, o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, afirmou que pagar a Rússia em rublos seria como "ajudar a Ucrânia com uma mão e ajudar os russos a matar ucranianos com a outra".
"Eu peço aos países relevantes que façam uma escolha sábia e responsável", escreveu em seu perfil no Twitter.
If any EU country bows to Putin’s humiliating demands to pay for oil and gas in rubles, it will be like helping Ukraine with one hand and helping Russians kill Ukrainians with the other. I urge relevant countries to make a wise and responsible choice.
— Dmytro Kuleba (@DmytroKuleba) March 24, 2022
Segundo a agência de notícias russa Tass, Putin disse que a medida não afeta o fornecimento de energia dos contratos já firmados, mas "apenas a moeda de pagamento, que será alterada para rublos".
"A Rússia continuará a fornecer gás natural de acordo com volumes e preços fixados em contratos previamente celebrados", disse o presidente russo.
A Rússia reabriu parcialmente seu mercado de ações nesta quinta-feira.
As negociações estavam suspensas desde 25 de fevereiro, um dia após o início da guerra, quando a reação de investidores à invasão à Ucrânia derrubou o índice MOEX em 27,20% em apenas uma semana.
Até o início da tarde (12h30 de Moscou), o IMOEX subia cerca de 6% na bolsa de Moscou.
A bolsa de Moscou adotou medidas para tentar impedir vendas massivas nesta reabertura, com só parte das ações podendo ser negociadas. O BC também baniu "operações vendidas", para evitar que investidores apostem na queda dos ativos (leia mais aqui).
Na Otan, Biden e os outros líderes discutem também a mobilização de forças de combate adicionais em países do leste europeu, Bulgária, Hungria, Romênia e Eslováquia, como já fez em Estônia, Letônia, Lituânia e Polônia.
Uma das grandes preocupações é que a Rússia possa fazer uma ofensiva a outros países próximos.
Neste cenário, países europeus também tem anunciado a ampliação de seus exércitos, o último deles a Bélgica, que anunciou novos investimentos militares na manhã desta quinta-feira.
Os investimentos militares de europeus, inclusive, eram motivo de uma briga antiga com os EUA - o que levou o ex-presidente Donald Trump a exigir repetidas vezes que a UE aumentasse os gastos com a Otan.
Para além das discussões de sanções, um dos objetivos da agenda de Biden em Bruxelas é consolidar a unidade entre os Estados Unidos e a União Europeia, segundo a Casa Branca.
O conselheiro Sullivan disse a jornalistas que Biden tentará "reforçar a incrível unidade que construímos com nossos aliados e parceiros".
Na véspera, o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, disse também que a aliança militar está decidida a "fazer tudo o possível para apoiar a Ucrânia. Mas temos a responsabilidade de garantir que a guerra não se intensifique para além da Ucrânia e se torne um conflito entre Otan e Rússia".
Sullivan mostrou-se contrário a qualquer expectativa que implique um fim rápido da guerra ou um recuo da Rússia, um dia após um oficial ucraniano afirmar que a parte "ativa" da invasão poderia acabar em abril.
E se o conflito se prolongar, a capacidade da Rússia de resistir a perdas militares e sanções econômicas dependerá em parte da posição da China como sua principal parceira, acreditam os EUA.
Pequim não condenou oficialmente a guerra e não se uniu às sanções ocidentais, afirmando nas últimas semanas que defende "a soberania" das nações, mas que a situação ucraniana é "complexa".
O presidente chinês, Xi Jinping e o americano Joe Biden conversaram na última semana sobre o tema. A China negou ter enviado armas à Rússia, o que a inteligência americana confirma até o momento.
Biden "certamente consultará sobre um possível envolvimento chinês no conflito na Ucrânia enquanto estiver em Bruxelas e também na Otan", explicou Sullivan.
"Também fará isso quando se dirigir aos 27 líderes da União Europeia, porque em 1º de abril, a União Europeia terá uma cúpula com a China", explicou.
(Com AFP)
*A reportagem será atualizada com novos desdobramentos da guerra na Ucrânia nesta quinta-feira, 24 de março. Última atualização às 9h34.