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Fed deve apertar mais a economia com nova alta de juros esta semana

Crescimento do PIB já está desacelerando, mercado imobiliário encolhe, empresas de tecnologia restringem as contratações e pedidos de seguro-desemprego sobem

Fed: o presidente do Fed, Jerome Powell, e seus colegas devem aprovar outro aumento de 0,75 ponto percentual esta semana (Kevin Lamarque/Reuters)

Fed: o presidente do Fed, Jerome Powell, e seus colegas devem aprovar outro aumento de 0,75 ponto percentual esta semana (Kevin Lamarque/Reuters)

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Agência O Globo

Publicado em 25 de julho de 2022 às 07h50.

O Federal Reserve (Fed, o banco central americano) provavelmente terá que infligir muito mais dor à economia dos Estados Unidos para controlar a inflação. Isso porque o crescimento do PIB já está desacelerando em resposta aos repetidos aumentos das taxas de juros do Fed, com o mercado imobiliário se retraindo, as empresas de tecnologia restringindo as contratações e os pedidos de seguro-desemprego subindo.

Mas com a inflação persistindo no maior patamar em quatro décadas, um número crescente de analistas diz que será necessária uma recessão - e um desemprego significativamente maior - para aliviar as pressões sobre os preços.

Uma pesquisa da Bloomberg com economistas este mês colocou a probabilidade de uma desaceleração nos próximos 12 meses em 47,5%, acima dos 30% em junho.

- Temos que conter as coisas internamente para nos ajudar a chegar onde queremos com a inflação - disse o economista-chefe do Bank of America nos EUA, Michael Gapen, que prevê uma recessão leve a partir do segundo semestre deste ano.

Depois de aumentar os juros em junho na maior magnitude desde 1994, o presidente do Fed, Jerome Powell, e seus colegas devem aprovar outro aumento de 0,75 ponto percentual esta semana e sinalizar sua intenção de continuar subindo nos próximos meses.

Powell disse que não restaurar a estabilidade de preços seria um “erro maior” do que empurrar os EUA para uma recessão.

Os membros do Fed, no entanto, continuam afirmando que podem evitar uma recessão e executar um pouso suave da economia. Eles argumentam que a economia tem forças subjacentes e expressaram esperanças de que a inflação possa diminuir tão rapidamente quanto aumentou.

A inflação - medida pelo indicador favorito do Fed, o índice de preços de gastos com consumo pessoal - foi de 6,3% em maio, bem acima da meta de 2% do banco central.

O índice de preços ao consumidor teve uma forte alta: subiu 9,1% em junho em relação ao ano anterior. E mais: três quartos dos bens e serviços da cesta do IPC aumentaram a uma taxa anualizada superior a 4% em junho em relação a maio.

- A inflação está arraigada e se espalhando - disse o ex-vice-presidente do Fed e membro sênior da Brookings Institution, Donald Kohn.

Trabalho árduo

O Fed enfrenta um trabalho complicado porque pelo menos parte da pressão ascendente sobre a inflação não vem do excesso de demanda – que ele pode controlar –, mas de interrupções no fornecimento decorrentes da invasão da Ucrânia pela Rússia e da pandemia, e diante das quais se vê impotente.

Uma complicação adicional, de acordo com o ex-vice-presidente do Fed Alan Blinder: a política monetária impacta a inflação com defasagens muito longas, de talvez dois ou três anos.

Os traders do mercado futuro de fundos federais estão apostando que o Fed aumentará as taxas para cerca de 3,5% até o fim do ano, e de 1,5% para 1,75% agora, antes de começar a cortá-las no segundo semestre de 2023.

Já o ex-secretário do Tesouro Lawrence Summers duvida que seja assim.

- Meu instinto é que você não veria as taxas cortadas assim do jeito que as pessoas pensam - disse o professor da Universidade de Harvard e colaborador da Bloomberg Television.

E completou:

- O Fed precisa ter cuidado. Se você olhar para a história dos anos 1960 e 1970, houve momentos em que a política monetária afrouxou um pouco e as coisas não tendiam a funcionar tão bem - acrescentou, referindo-se a episódios em que o Fed afrouxou o crédito antes de acabar com a inflação.

Em vez de cortar as taxas, o Fed provavelmente as elevará para 5% ou mais no próximo ano para tentar conter as pressões de preços, disse o economista-chefe da Dreyfus e Mellon, Vincent Reinhart. Isso, segundo ele, ajudará a precipitar uma contração que aumenta o desemprego dos atuais 3,6% para cerca de 6%, mas deixa a inflação acima de 3%.

O ex-governador do Fed Laurence Meyer afirma, por sua vez, que os formuladores de políticas não têm outra opção além de elevar os juros, porque não podem permitir que as expectativas de inflação aumentem. Se isso acontecesse, acrescenta, a batalha para conter a inflação estaria perdida, porque as empresas e os trabalhadores começariam a agir de forma a elevar ainda mais os preços.

Meyer, que dirige a consultoria Monetary Policy Analytics, prevê uma desaceleração que reduzirá o Produto Interno Bruto (PIB) em 0,7% no próximo ano, elevará o desemprego a 5% e devolverá a inflação à meta de 2% do Fed em 2024.

- Uma recessão leve provavelmente é muito boa do ponto de vista do Fed, dada a situação em que estamos - disse ele.

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Alguns analistas afirmam que os EUA já estão em recessão. O PIB contraiu a um ritmo anualizado de 1,6% no primeiro trimestre e pode ter encolhido ainda mais no segundo, pelo menos de acordo com o rastreador de economia do Fed de Atlanta.

Se a estimativa do Fed de Atlanta for confirmada pelos dados oficiais da próxima quinta-feira, dia 28, o dia seguinte à decisão sobre os juros, isso atenderia à definição popular de recessão: dois trimestres consecutivos de crescimento negativo.

Os formuladores de políticas do Fed já recuaram nessa narrativa, apontando para a força do mercado de trabalho.

- É realmente estranho pensar em uma economia em que você adiciona 2,5 milhões de trabalhadores e a produção cai - disse o governador do Fed, Christopher Waller, no último dia 7, enfatizando sua determinação em reduzir a inflação para 2%.

Choques de fornecimento

Em um artigo apresentado em uma conferência do Banco Central Europeu no mês passado, os pesquisadores descobriram que um terço da inflação dos EUA até o fim de 2021 se deveu a choques de oferta.

Os choques de fornecimento “estão acontecendo em diferentes setores, em diferentes momentos, em diferentes países”, disse um dos pesquisadores, a professora da Universidade de Maryland Sebnem Kalemli-Ozcan:

- Isso não está na cartilha do banco central.

Embora o Fed precise responder à inflação elevada restringindo o excesso de demanda, deve ter cuidado para não exagerar na dose, disse ela.

As esperanças de acabar com os problemas da cadeia de suprimentos continuam sendo frustradas, especialmente porque a China luta com sua política de Covid Zero. Dois terços das empresas pesquisadas pela Associação Nacional da Indústria no último trimestre não esperam que as interrupções na cadeia de suprimentos diminuam até 2023, ou mesmo depois.

Blinder disse que está se sentindo um pouco melhor com a possibilidade de uma aterrissagem econômica suave, devido às recentes quedas nos preços de energia e dos alimentos. Mas ele não tem certeza de quão duráveis ​​serão esses declínios e ainda estima as chances de uma recessão acima de 50%.

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