Patrick Martin: cursos na escola para todos os públicos (Le Cordon Bleu/Divulgação)
Repórter de Lifestyle
Publicado em 1 de junho de 2024 às 08h20.
Eis o cardápio: 18 pavões, 80 perus, 300 galinhas, 350 frangos, 30 fiambres, 1.000 peças de caça, 50 peixes, tudo acompanhado de muito champanhe e por tudo o que há de mais pomposo e sofisticado. Essa é uma parte do menu descrito por Claudio da Costa Braga no livro O Último Baile do Império, que narra o jantar final do governo de dom Pedro II antes de o Brasil se tornar uma República. Esse menu era notadamente inspirado em grandes banquetes feitos por monarquias europeias que deixavam claro que aquele tipo de gastronomia era reservado apenas para a corte.
Mais de dois séculos se passaram, e os grandes chefs que serviam reis e imperadores saíram dos palácios e abriram seus próprios restaurantes para apresentar a alta gastronomia a outras elites. Para o chef francês Patrick Martin, esse modelo não precisa ser assim. “Estou empenhado em tornar a culinária mais acessível e em desmistificar a ideia de que é exclusiva ou inacessível”, diz. Martin, que já passou por diversos restaurantes estrelados em Paris, é o diretor técnico responsável pela implantação da Le Cordon Bleu no Brasil.
Por onde passa -— são 20 países —, a escola ajuda a fomentar a cultura culinária nos mais diferentes níveis. Neste ano, a instituição começou uma grande expansão para outras capitais além de São Paulo e Rio de Janeiro, onde está desde 2018. E, na sede na capital paulista, abriu o Culinary Village, um espaço que expande o ecossistema de atuação do instituto para promover conexões e aproximar parceiros, marcas e empresas, em uma experiência múltipla e 360 graus. O hub conta com cozinha de apresentação, sala de jantar, coworking e mais uma série de novos espaços de convívio, incluindo um café e o Memorial e Biblioteca Nina Horta. Tudo dentro da visão de -Patrick Martin de deixar a gastronomia mais acessível. Em entrevista à Casual EXAME, ele explica mais sobre o projeto e diz quais serão os próximos passos da instituição no Brasil.
Como foi o processo de implementação da Le Cordon Bleu aqui no Brasil?
A parceria entre a Le Cordon Bleu e a Ânima Educação foi fundamental para trazer a instituição ao Brasil. O país era uma prioridade devido à sua importância cultural e à demanda por educação culinária em língua portuguesa, mas não conseguiríamos fazer nada sozinhos. A escolha da instituição teve como base critérios como solidez, dinamismo e valores alinhados com os da Le Cordon Bleu. A abertura da escola em São Paulo, seguida pelo lançamento no Rio de Janeiro, marcou o início operacional dessa parceria. Neste ano vamos começar com aulas em Belo Horizonte, Porto Alegre e Curitiba. Depois vamos para Natal e Salvador. Queremos, ainda, entrar em Brasília e em Santa Catarina. Em 18 meses a Le Cordon Bleu estará presente em cerca de dez cidades brasileiras.
Quais são os principais programas desenvolvidos pela Le Cordon Bleu no Brasil?
Desde a inauguração, desenvolvemos uma variedade- de programas adaptados ao mercado brasileiro. O programa Cordon Tech foi uma novidade, oferecendo um aprendizado técnico intensivo em culinária francesa e internacional. Além disso, lançamos o programa Diploma de Cozinha Brasileira, reconhecendo a riqueza da culinária local. A harmonização de vinhos também foi uma área de foco, com ênfase na integração entre comida e vinho. Não podemos esquecer do Plant Based, um programa pioneiro que explora a culinária à base de plantas com um toque de fine dining, refletindo a crescente conscientização sobre saúde e sustentabilidade.
A Le Cordon Bleu busca tornar a alta gastronomia acessível ao público brasileiro?
A Le Cordon Bleu está empenhada em tornar a culinária mais acessível e em desmistificar a ideia de que é exclusiva ou inacessível. O conceito do Culinary Village é um exemplo disso, oferecendo uma experiência culinária completa em um ambiente acolhedor e descontraído. O espaço na escola de São Paulo tem cozinha de apresentação multidisciplinar, dining room, coworking e mais uma série de novos espaços de convívio, incluindo um café e o Memorial e Biblioteca Nina Horta, com o acervo pessoal de livros, móveis, objetos e utensílios de cozinha da escritora brasileira, ambos abertos ao público. Além disso, nossos diversos programas e cursos atendem a uma ampla gama de interesses e níveis de habilidade, desde iniciantes até profissionais experientes.
Na sua visão, qual é o impacto da escola na gastronomia brasileira, especialmente na alta culinária?
Primeiramente, é importante entender que a culinária francesa no Brasil não tem a mesma representatividade que tinha há algumas décadas. Hoje, vemos uma diversificação com influên-cias italianas, japonesas, asiáticas, entre outras. Mas a Le Cordon Bleu não se limita à tradição francesa. Embora nossas bases técnicas sejam francesas, somos uma escola internacional com presença em 20 países, o que implica adaptações locais. No Brasil, essa influência já é perceptível há cerca de 35 anos, com chefs renomados e estabelecimentos prestigiados. Agora, com programas educacionais e parcerias estratégicas, estamos consolidando ainda mais nossa presença e impacto no país.
Em sua carreira, você já comandou diversos restaurantes estrelados.
O que é mais difícil, montar uma escola ou manter uma estrela Michelin?
Eu acredito que são desafios que estão no mesmo nível. No meu tempo em frente a um fogão, fazíamos o aprendizado em um restaurante ou em um hotel. Nas últimas décadas as escolas evoluíram muito, e é preciso ter uma aprendizagem formal para se tornar um chef. Montar uma escola de gastronomia e manter uma estrela Michelin são complementares, na minha visão. Sem passar por uma educação formal, você dificilmente terá um restaurante estrelado.
O que é preciso para se tornar um chef? A trajetória mudou ao longo do tempo?
Antes de ser chef, é preciso ser aprendiz. É preciso ser curioso. É preciso ser apaixonado, porque se não for apaixonado pelo trabalho não adianta. Também é preciso ter autocrítica. Dizer sempre “eu sou, eu sou” não é humildade, e a humildade é muito importante. Há 50 anos, um chef ficava em sua cozinha e não saía dela. É importante conversar com as pessoas, não apenas sobre culinária, mas para entender a cultura local, falar mais de uma língua, saber ser um líder. Sem liderança você não consegue motivar as pessoas. Hoje, o chef é versátil e precisa desempenhar diversos papéis além de cozinhar.