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Grife de um homem só chamou a atenção de grandes varejistas

Evan Kinori opera uma marca de roupas administrada e tocada só por ele; Dover Street Market e C'H'C'M' são duas das varejistas que manifestaram interesse

Evan Kinori em sua estação de trabalho  (Jason Henry/The New York Times)

Evan Kinori em sua estação de trabalho (Jason Henry/The New York Times)

DS

Daniel Salles

Publicado em 10 de outubro de 2020 às 06h10.

Seria esta uma boa hora para falar do "suficiente"?

Muito tempo atrás, em 1973, o economista E.F. Schumacher publicou "O Negócio é Ser Pequeno", uma coleção seminal (e, para surpresa de alguns, um best-seller) de ensaios que criticavam a economia ocidental. Schumacher foi um dos primeiros a defender a sustentabilidade, a localização, a indústria de pequena escala e o "emprego humano de máquinas" para produzir uma forma mais benevolente de capitalismo, que usasse o esforço humano e a engenhosidade para o bem comum.

"O suficiente" (enoughness) é um termo cunhado por Schumacher. Houve muita crítica na época – basicamente, ele foi considerado um ludita pouco progressista –, mas hoje suas ideias parecem proféticas. Talvez tenha sido preciso haver uma pandemia para nos lembrar de que o antídoto para muita coisa pode ser sua suficiência. O pouco pode ser, de fato, bonito.

Detalhes da coleção de verão 2020 de Evan Kinori (Jason Henry/The New York Times)

Isso parecia ser verdade em uma visita recente a um espaço arejado todo branco no bairro de Hayes Valley, em San Francisco. Aqui, Evan Kinori, de 32 anos, opera uma marca de roupas administrada e tocada por um homem só. Ele cria roupas que são fabricadas principalmente em um raio de 1,6 quilômetro de sua oficina em pequenos lotes numerados a mão, em padrões e tecidos que mudam sutilmente de uma temporada para outra e que, como observou a revista "GQ" recentemente, "vendem rápido e nunca reaparecem".

Em apenas cinco anos, Kinori chamou a atenção de varejistas especializados nos EUA, na Europa e no Japão (Dover Street Market em Nova York, Los Angeles e Tóquio; C'H'C'M' em Nova York; Atelier Solarshop em Antuérpia, na Bélgica), e criou um culto crescente que, embora direcionado aos trabalhadores da indústria tecnológica, atraiu também chefs e artistas gráficos da Área da Baía, roteiristas de Hollywood e pelo menos um analista do Vale do Silício de 70 anos.

Oficialmente, as roupas de Kinori – casacos, jaquetas de algodão encerado fosco, camisas de linho belga ou calças largas cujo corte tem um toque clássico, um quê de Yohji Yamamoto e algo que pode ser visto em um açougueiro de uma fotografia de August Sander – são moda masculina. No entanto, parece cada vez mais provável que o relaxamento das fronteiras arbitrárias entre os gêneros se torne um dos efeitos benéficos de todos serem forçados a trabalhar em casa vestindo moletom.

Evan Kinori em seu ateliê em São Francisco (Jason Henry/The New York Times)

Nada disso preocupa Kinori, homem forte, de boa aparência, com o cabelo despenteado e unhas pintadas de preto que poderiam se beneficiar de uma nova camada de esmalte. E ele não está muito interessado em design no sentido rigidamente formal. Kinori não se julga alfaiate, nem mesmo estilista, mas sim um artesão, um pouco na tradição de pessoas como o grande arquiteto Joseph Esherick, que ao longo de sua carreira se importou mais em criar espaços harmoniosos e humanos do que monumentos que remetessem a ele.

As roupas de Kinori são cortadas a partir de padrões que ele mesmo elabora e costura, usando linhas francesas em máquinas de uma só agulha. São feitas com tecidos provenientes de estoques antigos ou tradicionais de fabricantes de tweed irlandeses, como Molloy & Sons, no Condado de Donegal, de produtores belgas de linho ou de fábricas de algodão para quimonos em cidades japonesas distantes. Quando trabalha, ele pensa mais no desejo de criar objetos duráveis do que nas demandas da moda industrial.

"Ele é um estilista disciplinado", disse o dramaturgo e roteirista Jon Robin Baitz, para quem as roupas de Kinori se tornaram um uniforme diário.

Se a maior parte do que Kinori faz custa caro (as camisas começam em US$ 285, as calças em US$ 365 e as jaquetas em US$ 525), é em parte porque suas peças são produzidas em quantidades bem limitadas.

"Não é muito, não é pouco. Há uma razão para isso. É tudo que fiz", afirmou ele a respeito das peças que anuncia no Instagram e que se esgotam quase que imediatamente.

As edições são numeradas como uma forma de inventário e uma maneira de manter tudo em uma escala gerenciável. As vendas das roupas renderam a Kinori pouco mais de meio milhão de dólares no ano passado, mais ou menos o que alguns designers pagam aos influenciadores para divulgá-los. Embora ele mantenha uma presença respeitável nas redes sociais, seu principal meio de influência é a nota escrita a mão.

"Quando você compra suas roupas, ele lhe manda um bilhete, não muito longo, escrito por ele mesmo", disse Baitz. Muitas vezes, um funcionário de Kinori, Ryne Burns, envia um e-mail para ver se as peças caíram bem.

"É meu pequeno 'dane-se' às grandes empresas que não conseguem enumerar seus estilos", comentou Kinori.

"É o lance 'feito a mão' que está pegando agora", explicou Baitz. O que ele quis dizer é que, na era da fast fashion descartável, quando o trabalho necessário para criar coisas foi efetivamente apagado, quando há sempre uma parte feia da equação a considerar – a de consumir material descartável feito por uma força de trabalho mal paga e invisível do outro lado do mundo –, uma alternativa saudável pode estar na relação pessoal tradicional do consumidor com o fabricante.

"Meu etos de criação é basicamente voltado para pessoas que não compram coisas o tempo todo", resumiu Kinori.

Isso parece agradar a clientes como Kyle King, de 33 anos, assistente social clínico que se deparou com as roupas de Kinori há quatro anos na butique Reliquary. "Há muito artifício e falsa narrativa no mercado. Precisamos voltar à riqueza e à simplicidade das coisas básicas e bem projetadas", disse King, cujo guarda-roupa consiste predominantemente em peças cuidadosamente selecionadas em duas visitas anuais à loja de Kinori.

Embora exista uma tendência de romantizar estilistas indie que trabalham fora do chamado sistema de moda, Kinori resiste ao clichê.

Um canto do ateliê de Evan Kinori (Jason Henry/The New York Times)

Com 20 e poucos anos e com formação em Artes e especialização em Filosofia e Francês, ele decidiu se matricular no Instituto de Moda de Design & Merchandising, uma escola local com grande ênfase no comércio.

"Foi a primeira vez na minha vida que fiz algo que parecia completamente natural", observou ele sobre sua passagem pela FIDM, como a escola é conhecida. "Eu realmente não tinha grandes aspirações de desenvolver uma carreira como estilista. Sentia basicamente uma insatisfação com o que eu buscava e não conseguia encontrar."

Ele começou fazendo algumas camisas, e então, quando amigos de amigos pediram para comprá-las, fez um pouco mais. Depois, vieram as calças que caem de modo informal, mas com uma estrutura enganosamente arquitetônica.

Com os lucros de seus primeiros trabalhos, Kinori se aventurou nas jaquetas e, em menos de cinco anos, por meio do boca a boca, descobriu que tinha um nome e uma marca. Quando apoiadores o procuraram com planos de ampliar a produção, ele hesitou. E, embora seja impossível prever se isso vai mudar, ele está satisfeito por enquanto com o crescimento constante de uma base de clientes fiéis que não é mais tão pequena.

"Amo roupas, adoro fazer roupas, adoro apresentar roupas. Sou cem por cento intuição. Construir uma história e um espírito com um objeto é o que quero. Não sei se há muito mais do que isso. Isso é o suficiente."

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