Recuperação judicial: avanços e lacunas
As mudanças da nova lei ampliam a proteção da atividade empresarial e dão mais segurança jurídica para as companhias, mas ainda são insuficientes
Carolina Riveira
Publicado em 25 de janeiro de 2021 às 11h53.
Última atualização em 25 de janeiro de 2021 às 11h59.
A nova Lei de Falências e Recuperação Judicial entrou em vigor neste fim de semana e chega em boa hora. O aperto financeiro provocado pela Covid-19 levou quase 1.200 empresas a pedirem recuperação judicial no ano passado, isso sem citarmos aqui aquelas que simplesmente deixaram de funcionar e cerraram as portas.
A lei veio para ampliar a proteção da atividade empresarial e dá mais segurança jurídica para as companhias que vêm enfrentando o mais longo período de recessão econômica vivido pelo Brasil. As permissões concedidas pelas novas regras para a conversão da dívida em capital social e para a venda integral da empresa – mecanismos antes já utilizados, mas sem previsão específica – foram um avanço a destacar.
O texto embute também a definição de conceitos antes não previstos, como a adoção de incentivos para a mediação e a conciliação, a inclusão dos produtores rurais como aptos a requererem a proteção da lei e a possibilidade de se pedir a insolvência transnacional. Importante notar que também reviu e incorporou temas, introduziu orientações doutrinárias e jurisprudenciais: a contagem dos prazos em dias corridos, melhor definição da venda de ativos, perícia prévia e o aperfeiçoamento do instituto da recuperação extrajudicial.
Muitas das modificações ajudam a desburocratizar e tornam mais ágil o processo de recuperação judicial. Permitem aos credores apresentar um plano de recuperação. As empresas em RJ conquistam o direito a buscar crédito nas instituições financeiras e podem parcelar as dívidas com a União em até 120 meses. Este último ponto merece atenção e um alerta. As modalidades de parcelamento são inferiores aos proporcionados pelo Refis e a União pode pedir a falência da companhia em caso de atraso no pagamento ou pelo não cumprimento do acordo. Apenas para se ter uma ideia do volume de dívidas de que estamos falando, o estoque de débitos das empresas em recuperação é de R$ 109,6 bilhões segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
As alterações relativas à recuperação extrajudicial vão estimular, com certeza, o uso do modelo. A possibilidade de inclusão de créditos trabalhistas, redução no quórum de adesão para aprovação do plano de recuperação extrajudicial e a regulamentação do prazo de suspensão das execuções por 180 dias (Stay), antes previsto apenas nos processos de recuperação judicial, tornam essa modalidade uma alternativa mais viável financeiramente. Além disso, o procedimento é mais simples, rápido e eficiente, se comparado ao processo de recuperação judicial.
Há alterações interessantes no capítulo referente às falências. A lei torna mais eficiente a negociação de ativos ao conceder 60 dias para o administrador judicial montar um plano de vendas para ser executado em 180 dias, apenas para citar um dos pontos incluídos na lei. O administrador judicial, aliás, ganha novas funções: umas boas, outras nem tanto. É positivo o fato de se tornar um ser mais digital, com sites e armazenamento de dados virtuais, e de conquistar papel de mediador de negociações de conflitos. Em contrapartida, vai assumir funções complexas, como a de fiscalizar a veracidade de informações do devedor e supervisionar a negociação entre a empresa em recuperação e os credores. Ainda não está claro como essas e outras cobranças feitas ao administrador judicial serão efetuadas, mas a teoria, na prática, pode ser perigosa para o dia a dia da recuperação.
As mudanças são benéficas, mas não suficientes. Modernizam a lei embora ainda deixem brechas a serem preenchidas, como a inclusão do passivo fiscal e a melhoria do processo de habilitações para reduzir as divergências e os pedidos de impugnações e habilitações. Vale ressaltar que o novo texto preencheu lacunas, incluiu novos conceitos, reviu e incorporou temas tornando a regra jurídica mais clara e ampla.
As empresas agora têm um alicerce mais seguro para ganhar fôlego econômico-financeiro, manter empregos e ajudar a economia nacional a se reerguer. Não chegamos à perfeição, mas estamos quase lá!
*Marcelo Gomes é presidente da Alvarez e Marsal Brasil
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