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Mariana Plum: como a crise no Rio Grande do Sul impõe a necessidade de integrar Defesa e clima

A recente mobilização das Forças Armadas em resposta aos desastres naturais no Rio Grande do Sul destaca a urgência de incluir o Setor de Defesa na agenda climática nacional

Resgate de famílias na Ilha da Pintada, pela Defesa Civil de Porto Alegre. Foto: Cesar Lopes/ PMPA (Cesar Lopes/ PMPA/Divulgação)

Resgate de famílias na Ilha da Pintada, pela Defesa Civil de Porto Alegre. Foto: Cesar Lopes/ PMPA (Cesar Lopes/ PMPA/Divulgação)

Mariana Nascimento Plum
Mariana Nascimento Plum

Diretora executiva do Centro Soberania e Clima – Colunista Bússola

Publicado em 29 de maio de 2024 às 10h00.

Última atualização em 29 de maio de 2024 às 11h00.

A catástrofe climática no Rio Grande do Sul é um alerta contundente sobre a interconexão entre segurança, defesa e mudanças climáticas. As chuvas torrenciais que vêm atingindo o estado revelam não apenas a gravidade dos fenômenos naturais, mas a importância de uma resposta coordenada e eficiente, envolvendo diferentes setores – incluindo a Defesa.

A portaria n° 2309/2024, que autoriza o emprego das Forças Armadas em ações de apoio à Proteção e Defesa Civil, utiliza os termos "episódico" e "temporário" para designar a atuação dos militares na operação montada para socorrer a região Sul. Contudo, os estudos elaborados por cientistas do mundo todo demonstram, e as mudanças climáticas em curso confirmam, que os eventos extremos serão cada vez mais frequentes e intensos. 

Até o momento, a “Operação Taquari 2”, segundo dados disponibilizados por aquele Comando Conjunto, mobilizou mais de 32 mil militares, policiais e agentes civis, 4800 veículos das mais variadas naturezas, 250 equipamentos de engenharia, 60 aeronaves, 430 embarcações e 8 navios multitarefas. 

Não se trata apenas de uma resposta emergencial; mostra que a infraestrutura militar, sua capilaridade, capacidade de rápida mobilização e meios logísticos são vitais em cenários de desastre, nos quais a velocidade, a resiliência e a efetividade das ações buscam garantir a proteção e o socorro da população e minimizar perdas e danos. 

Contudo, o Decreto n° 11550/2023, que estabelece o Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima, não relaciona o Ministério da Defesa entre os seus integrantes. Pode parecer estranho ter a Defesa como parte do planejamento de políticas relacionadas à mudança do clima, mas se analisarmos a presença das Forças Armadas nos biomas brasileiros, seu emprego em ações de apoio à defesa civil, o trabalho executado pelo Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia  (CENSIPAM) no monitoramento de ilícitos, de desmatamento e de eventos extremos na Amazônia, além do monitoramento de todo o mar territorial e da zona econômica exclusiva brasileira – a Amazônia Azul, somadas às ações que as Forças Armadas brasileiras já realizam para preservação ambiental, teremos certeza de que a exclusão dessa pasta do Comitê Interministerial é uma grande falha. 

Integrar a Defesa no desenvolvimento da estratégia climática brasileira não significa, contudo, militarizar as mudanças climáticas, tampouco desviar as Forças Armadas de sua missão principal, a Defesa da Pátria. Significa dizer que as atividades de competência do Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima devem integrar a perspectiva de um ator que já vem colaborando e pode contribuir ainda mais com o tema se for integrado ao grupo que está discutindo políticas públicas relativas à Mudança do Clima.

Em 2023, o Centro Soberania e Clima organizou um workshop com integrantes de diferentes setores para discutir como a Política Nacional de Defesa e a Estratégia Nacional de Defesa deveriam incorporar questões relativas ao meio ambiente e à mudança do clima em seus textos. O workshop foi uma de várias iniciativas que o Centro organizou nesse sentido, tendo publicado artigos, policy papers, infográficos e podcasts sobre esse tema. As novas versões dos documentos da Defesa que serão apresentadas ao Congresso Nacional em julho de 2024 reconhecem que “a mudança do clima introduz novas preocupações à análise da Segurança e da Defesa Nacional”.

Porém, para que esse reconhecimento se transforme em ações estratégicas do Ministério da Defesa, é necessário que a pasta seja integrada às mesas de negociação dos diferentes planos, ações e estratégias que estão sendo discutidos pelo Governo, pela Academia e pela Sociedade Civil. O emprego das Forças Armadas não pode ficar reduzido a ações emergenciais, movidas por decretos episódicos e temporários, prejudicando o planejamento orçamentário e operacional. Devemos buscar uma abordagem intersetorial, na qual Defesa, meio ambiente, transportes, energia, economia e outros setores colaborem de forma coordenada. 

A integração dessas agendas não só fortalece a capacidade de resposta do Brasil a crises internas, mas posiciona o país como líder global na luta contra as mudanças climáticas. A colaboração entre as Forças Armadas e outros setores é essencial para desenvolver soluções inovadoras e sustentáveis. 

O compromisso com a defesa ambiental deve ser visto como um componente integral da soberania nacional. A proteção dos biomas naturais do Brasil e a resiliência frente a desastres naturais são fundamentais para a segurança e o bem-estar da população. 

É impossível enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas sem integrar a Defesa nas estratégias para elaboração, implementação, financiamento, monitoramento, avaliação e atualização das políticas, dos planos e das ações relativos à mudança do clima, atividades definidas como responsabilidade do Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima.

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