Análise do Alon: Lula, Fausto e a esfinge do petróleo
Governo brasileiro precisa tomar a decisão sobre autorizar ou não a exploração de petróleo na foz do Amazonas
Plataforma de conteúdo
Publicado em 11 de agosto de 2023 às 13h40.
Por Alon Feuerwerker*
A tática de Luiz Inácio Lula da Silva no intrincado xadrez do clima parece clara. Segue a receita tradicional: bater bumbo para a narrativa do momento, buscar articulações que ampliem a superfície política de contato, reduzindo assim a pressão exercida sobre o Brasil pelas forças externas, e, entrementes, ir tocando a vida de acordo com as necessidades práticas, preenchendo o tempo com ataques continuados aos adversários políticos do momento.
- Parque eólico mais alto da China inicia produção de energia
- Paul McCartney no Brasil: venda geral começa hoje; veja como comprar
- CCJ do Senado formaliza Eduardo Braga como relator da reforma tributária
- Núcleo do CPI dos EUA cai para 4,7% em julho e fica abaixo do esperado
- Zona de Livre Comércio Experimental da China completa 10 anos
- Paul McCartney anuncia shows no Brasil; veja data e como comprar
Posto que a realidade material nunca consegue ficar circunscrita aos discursos, alguma hora os fatos terão, porém, de se impor. Logo o governo brasileiro terá de decidir a autorização ou não para explorar o petróleo na foz do Amazonas. E autorizar trará necessariamente custo reputacional para um presidente empenhado em se apresentar como liderança planetária nos assuntos do momento, entre os quais brilha o clima.
E tem pelo menos outro nó aí. A reindustrialização, agora repaginada como neoindustrialização (também para reduzir a área de atrito com os antidesenvolvimentistas ), ocupa lugar central nos planos governamentais, sem ela vai ser difícil reduzir estruturalmente as altas taxas de desemprego. O PIB projetado é bom, mas a beleza dos números deve-se na maior parte ao agronegócio, cuja vocação não é empregar. Serviços e indústria comem poeira.
Qual é a real, então? Não haverá reindustrialização sem energia barata. Aliás, encarecimento da energia causa desindustrialização. Que o diga a Alemanha. E, posto que o preço nunca está imune à lei da oferta e da demanda, fica claro que é ficção reindustrializar sem energia abundante. O papel e o Power Point aceitam tudo, mas alguma hora governos têm de entregar o que projetaram para o futuro.
Pois se há algo certo sobre o futuro é que ele sempre chega.
O Brasil tem um dos perfis energéticos mais limpos, graças principalmente às hidrelétricas. Mas o potencial hídrico ainda inexplorado concentra-se na Amazônia, a construção das barragens ali enfrenta oposição cerrada. Ah, há também o etanol, mas a cana sofre a concorrência dos alimentos pela área plantada. Um desafio adicional para o país que aceitou o dogma de, também para ajudar a salvar o planeta, congelar a fronteira agrícola.
As energias eólica e solar vêm em franca expansão, mas não deixam de ter impacto sócio-ambiental . Seus custos estão caindo rapidamente, mas a oferta nem de longe será capaz de atender a demanda imediata. O mesmo vale para a energia nuclear. Ou o Brasil acelera a exploração de petróleo e gás, ou a reindustrialização acelerada continuará confinada aos discursos e às apresentações.
É provável que, com o tempo, as soluções pragmáticas acabem se impondo, e o presidente sempre terá à mão o argumento de, afinal, estarmos em um período de transição energética, daí precisarmos usar todas as fontes disponíveis. Mas Lula neste tema não joga em casa, não tem com ele a torcida incondicional dos mecanismos construtores de opinião pública nem a simpatia da arbitragem.
Mais um detalhe. Em 2014, a acusação de que adversários parariam a exploração do pré-sal e privilegiariam as energias limpas foi decisiva na reeleição de Dilma Rousseff. Agora, Mefistófeles aparentemente veio acertar a fatura. A ver se Lula, como Fausto, consegue escapar de ter de pagar toda a conta.
*Alon Feuerwerker é analista político da FSB Comunicação
Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.
Siga a Bússola nas redes: Instagram | Linkedin | Twitter | Facebook | Youtube
Veja também
Bússola Poder: A tragédia amazônica