STJ libera Sérgio Camargo para presidência da Fundação Palmares
O jornalista indicado ao cargo é criticado por declarações sobre o racismo no Brasil e por ser contra o Dia da Consciência Negra
Estadão Conteúdo
Publicado em 12 de fevereiro de 2020 às 16h31.
Última atualização em 12 de fevereiro de 2020 às 17h10.
O presidente do Superior Tribunal de Justiça , ministro João Otávio de Noronha, acolheu pedido da Advocacia Geral da União e derrubou a liminar que suspendeu a nomeação do jornalista Sérgio Camargo para a presidência da Fundação Palmares. Na avaliação de Noronha, os "eventuais excessos" de Camargo nas redes sociais "não autorizam juízo de valor acerca de seus valores éticos e morais ou mesmo de sua competência profissional".
"Não vejo como deixar de reconhecer que a decisão atacada, a pretexto de fiscalizar a legalidade do ato administrativo, interferiu, de forma indevida, nos critérios eminentemente discricionários da nomeação, causando entraves ao exercício de atividade inerente ao Poder Executivo", escreveu Noronha na decisão.
O caso chegou ao STJ após a União entrar com recurso contra a liminar do desembargador do Fernando Braga Damasceno, do Tribunal Regional da 5ª Região, que manteve suspensa a nomeação de Camargo. Em primeira instância, a decisão do juiz federal substituto Emanuel José Matias Guerra, da 18ª Vara Federal de Sobral (CE) apontou que a indicação de Camargo ao cargo "contraria frontalmente os motivos" que levaram à criação do instituto.
Sérgio Camargo foi indicado no rol de mudanças promovidas pelo secretário especial da Cultura, Roberto Alvim, recentemente exonerado após fazer referência ao nazismo em vídeo divulgado nas redes sociais.
Após o anúncio da nomeação de Sérgio Camargo, diversas publicações do presidente nas redes sociais levaram a questionamentos sobre sua visão sobre o movimento negro.
Em seu perfil no Facebook, o jornalista afirmou que o "Brasil tem racismo nutella". "Racismo real existe nos EUA. A negrada [sic] daqui reclama porque é imbecil e desinformada pela esquerda", escreveu.
Em outra publicação, Camargo defende o fim do feriado do Dia da Consciência Negra, lembrado todo dia 20 de novembro: "O Dia da Consciência Negra é uma vergonha e precisa ser combatido incansavelmente até que perca a pouca relevância que tem e desapareça do calendário".
Em primeira instância, o juiz Emanuel Guerra considerou que Camargo cometeu "excessos" nas redes sociais e, em virtude das declarações, a nomeação "contraria frontalmente os motivos determinantes para a criação" da Fundação Palmares. A Advocacia-Geral da União recorreu ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região, mas a decisão foi mantida.
Ao STJ, a União alegou que a suspensão da nomeação "causa grave lesão à ordem pública e administrativa" e indicou ainda que o ato "atendeu a todos os requisitos exigidos pelo Decreto n. 9.727/2019, bem como aos elementos apontados pela doutrina administrativista como necessários à validade do ato administrativo".
Após analisar o caso, Noronha entendeu que a nomeação preencheu todos os requisitos legais e que há documentação apta a demonstrar a aptidão de Camargo para exercer as funções do cargo.
O magistrado considerou que a visão do TRF-5 e do juízo da 18ª Vara Federal de Sobral sobre "possível contrariedade dos pensamentos expostos pelo nomeado aos valores e posições de minorias" implica "juízo e censura do Judiciário".
Para o ministro, o fato de Camargo "ter se excedido" nas manifestações "não autoriza juízo de valor acerca de seus valores éticos e morais ou mesmo de sua competência profissional". "Sobretudo quando se sabe das particularidades que permeiam as manifestações no citado meio virtual, território de fácil acesso e tido como aparentemente livre, o qual, por isso mesmo, acaba por estimular eventuais excessos dos que ali se confrontam", assinalou ainda o magistrado.