Olimpíadas ofuscam Bolsonaro e política nas redes sociais
Disputa nas Olimpíadas e medalhas marcantes fizeram brasileiro "esquecer" política e pautas polarizadoras, mostra levantamento da Bites
Carolina Riveira
Publicado em 4 de agosto de 2021 às 06h00.
Última atualização em 4 de agosto de 2021 às 13h05.
Quase não se fala de outra coisa na internet brasileira. Desde os primeiros jogos das Olimpíadas de Tóquio , há pouco mais de uma semana, os comentários sobre os esportes olímpicos e as vitórias dos atletas brasileiros dispararam nas redes sociais.
Mas o auge das Olimpíadas fez ainda uma outra obsessão recente ficar esquecida — a política.
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Levantamento da consultoria de análise de redes sociais Bites feito a pedido da EXAME mostra que as menções diretas às Olimpíadas superaram as citações às principais pautas políticas ou ao presidente Jair Bolsonaro, que costuma ser um campeão de interações.
Até o começo desta semana, os Jogos ultrapassaram no Twitter tanto pautas do governo (como o voto impresso) quanto da oposição (como a CPI da covid-19 e a investigação sobre a compra da vacina Covaxin).
- As Olimpíadas tiveram 16,2 milhões de menções no Twitter desde 4 de julho;
- O presidente Jair Bolsonaro teve 15,7 milhões no período;
- Em terceiro vem a CPI da covid, com 6,4 milhões;
- Os termos CPI e Covaxin juntos tiveram 3,5 milhões;
- E o voto impresso, 2 milhões.
As Olimpíadas também coincidiram com o recesso do Congresso, que parou em meados de julho e voltou nesta semana. A CPI foi retomada nesta terça-feira, 3.
A magnitude incomum de um evento como os Jogos Olímpicos, somada ao recesso em Brasília, ajudaram a fazer a política ser ofuscada, diz André Eler, diretor-adjunto da Bites.
"A Olimpíada tem a vantagem de permitir que as pessoas falem de muitas coisas diferentes. Tem o fato de engajar todo mundo, os 'dois lados', quem apoia o presidente e quem não apoia, quem gosta de futebol e quem não gosta", diz Eler.
"E isso é uma coisa que não tem sido tão comum ultimamente."
O auge de menções foi no primeiro fim de semana da competição, que teve pratas de Kelvin Hoefler e de Rayssa Leal no skate street. Na sequência, em 27 de julho, Ítalo Ferreira também faturou o primeiro ouro do Brasil no surfe.
Nas buscas do Google, a "inversão de prioridades" dos brasileiros também ficou perceptível. No buscador, muito usado para procurar histórico dos atletas ou horário das competições, as Olimpíadas superam em ao menos 20 vezes a procura pelo presidente Jair Bolsonaro, que no geral é uma das mais altas do Brasil.
Alguns eventos específicos até colocaram de novo a política no radar, mas em patamar abaixo do esporte olímpico.
Nos perfis oficiais de Bolsonaro em Instagram, Facebook e Twitter, os picos de interesse aconteceram durante sua internação com obstrução intestinal e antes e depois de uma transmissão nas redes sociais em que defendeu a instalação de um sistema de voto impresso no Brasil, na última quinta-feira, 29 de julho.
Protestos sobre o mesmo tema no domingo, 1º de agosto, também ganharam algum espaço nas redes.
Apesar de posts específicos terem tido interesse acima da média, a tração geral de Bolsonaro — uma métrica criada pela Bites para medir a capacidade de repercussão e interações nas redes sociais — diminuiu desde o começo das Olimpíadas.
O volume de interação total nos posts caiu 41%, e a interação a cada post caiu 37% (desde a abertura das Olimpíadas, em relação aos 12 dias anteriores). Na prática, a base online do presidente continua forte e muito acima da oposição, mas houve menos assuntos para movimentar os apoiadores no período.
"Não é exatamente uma queda de interesse por Bolsonaro, mas mais propriamente a manutenção do interesse por ele no patamar de dias menos noticiosos, enquanto o interesse por Olimpíadas teve um grande pico", diz Eler.
Mas sair do radar é bom para Bolsonaro e outros políticos? Depende.
Para Maurício Moura, do instituto especializado em opinião pública IDEIA , as notícias sobre o presidente vinham sendo majoritariamente negativas em meio à CPI da covid-19, e a pausa na atenção pode ser benéfica para o governo — especialmente no caso de um evento agregador como as Olimpíadas.
"Tínhamos uma agenda muito negativa da CPI, principalmente em relação à vacinação. Foi muito positivo para o governo que isso saiu da pauta para entrar no lugar uma agenda muito antipolarizadora, que é torcer para o Brasil nos Jogos Olímpicos, independentemente da modalidade", diz.
Pouco antes do início dos Jogos, a avaliação negativa do governo também havia caído após a internação de Bolsonaro, segundo a última pesquisa EXAME/IDEIA . Ainda assim, a fatia de pessoas avaliando o governo como ruim ou péssimo segue acima de 50% desde abril.
Eler, no entanto, avalia que a estratégia online de Bolsonaro não parece ser de se esconder das polêmicas nas redes, desde que dentro dos temas pautados por sua base.
"Me parece que a estratégia do presidente não é sair do radar em momento nenhum. A live do voto impresso justamente alimenta o interesse por ele de novo [ em um momento em que estava com menos interações ]", diz.
"Esse conflito, com nomes como o do ministro Barroso, com o Supremo Tribunal Federal, às vezes com o Lula, parece ser relevante para o presidente. E são pontos que ele sabe que vão funcionar para motivar suas redes."
Já para a oposição, o recesso da CPI certamente não ajudou. "A oposição perde espaço sem a CPI, porque não tem mais um palco e não tem uma figura que galvanize o interesse. Já Bolsonaro pode fazer palco constante em manifestações, em suas declarações, que continuam tendo uma cobertura grande", completa Eler.
Levantamento anterior da Bites mostra que a tração do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, embora se aproxime do Bolsonaro em alguns picos, é muito abaixo da do presidente nas redes sociais. Lula lidera as pesquisas de intenção de voto para a Presidência em 2022.
O fato é que, com as Olimpíadas perto do fim nesta semana e a retomada dos trabalhos no Congresso, a política deve voltar a ganhar mais atenção. E as polêmicas também.
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