Jair Bolsonaro: presidente não havia se pronunciado na sexta-feira (8) quando Lula foi solto (Alan Santos/PR/Flickr)
Estadão Conteúdo
Publicado em 10 de novembro de 2019 às 10h33.
Última atualização em 10 de novembro de 2019 às 16h26.
São Paulo - O segundo dia do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fora da prisão deu o tom do acirramento da polarização política no país e do papel que o petista deve ocupar na oposição ao governo Jair Bolsonaro. Discursando para apoiadores em frente ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, Lula ligou Bolsonaro a milicianos, chamou o ministro da Economia Paulo Guedes de "destruidor de sonhos" e voltou a dizer que o ministro da Justiça e Segurança Pública Sérgio Moro é "mentiroso".
Ao deixar o Palácio do Alvorada, no sábado de manhã, 9, para comparecer a um churrasco no setor militar de Brasília, Bolsonaro comentou a soltura do petista pela primeira vez. "Está solto, mas continua com todos os crimes dele nas costas", disse. "Não vamos dar espaço e nem contemporizar para um presidiário", afirmou. Nas redes sociais, o presidente pediu que seus simpatizantes não dêem "munição ao canalha, que momentaneamente está livre". Enquanto Lula discursava no ABC, Bolsonaro tomava sorvete na Praça dos Três Poderes.
Responsável por condenar Lula por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá, o agora ministro Moro também recorreu às redes sociais para responder aos ataques que tem sofrido de Lula nos dois últimos dias. "Aos que me pedem respostas a ofensas, esclareço: não respondo a criminosos, presos ou soltos. Algumas pessoas só merecem ser ignoradas", escreveu. Em seu discurso, Lula lembrou que Bolsonaro disse anteontem que deve sua eleição a Moro.
Aos que me pedem respostas a ofensas, esclareço: não respondo a criminosos, presos ou soltos. Algumas pessoas só merecem ser ignoradas.
— Sergio Moro (@SF_Moro) November 9, 2019
A polarização também ficou clara nas manifestações contra a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de derrubar o cumprimento da pena após prisão em segunda instância. Aliado de Bolsonaro, o empresário Luciano Hang, dono da rede lojas Havan, atacou a esquerda ao discursar, na Avenida Paulista. "A esquerda destruiu o Brasil."
Ao longo do discurso, Lula citou os protestos populares que tomaram as ruas do Chile nas últimas semanas contra a política econômica do governo para criticar Guedes. "O Chile é o modelo de país que o Guedes quer fazer aqui. Os aposentados lá estão morrendo." O ministro não comentou as declarações. "Duvido que Bolsonaro durma com a consciência tranquila. Duvido que o ministro dele destruidor de sonhos do povo brasileiro durma bem", afirmou o ex-presidente.
Pela manhã, Bolsonaro se reuniu com o comando militar para avaliar o cenário após Lula ter deixado a prisão. Entre os militares, a avaliação é que não há sinais de movimentações atípicas, mas há a preocupação de que o discurso de Lula possa incitar a violência.
Lula afirmou que a eleição de Bolsonaro deve ser respeitada, mas cobrou o presidente sobre a morte da ex-vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e sobre a investigação que envolve o ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz, que trabalhou para Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) na Assembleia do Rio. "Tem gente que fala em impeachment. Veja, o cara foi eleito democraticamente e nós aceitamos isso, mas ele (Bolsonaro) foi eleito para governar para o povo brasileiro, e não para os milicianos do Rio de Janeiro."
Como já havia feito ao deixar a Superintendência da Polícia Federal (PF), em Curitiba, Lula criticou a força-tarefa da Lava Jato. Dessa vez, acusou o procurador da República Deltan Dallagnol, de "montar uma quadrilha para tomar dinheiro da Petrobrás e das empreiteiras". Não existe nenhuma acusação ou investigação contra Dallagnol sobre crimes. O procurador é alvo de procedimentos disciplinares administrativos no Conselho Nacional do Ministério Público sobre comentários feitos por ele contra políticos. Dallagnol não comentou os ataques ontem.
O ex-presidente voltou a afirmar que pretende rodar o país ao lado de Fernando Haddad, candidato derrotado do PT à Presidência, da presidente do partido, Gleisi Hoffmann, e de "companheiros" de outras legendas, como PSOL e PCdoB. Ele determinou a seus colaboradores um levantamento aprofundado de números sobre emprego, renda e condições de vida dos brasileiros desde que o PT deixou o governo. Os dados devem embasar o pronunciamento que ele pretende fazer no Congresso do PT, entre os dias 22 e 24, quando deve subir mais um degrau na polarização com Bolsonaro.
"Lula está com o foco na defesa da qualidade de vida das pessoas", disse Gleisi. Segundo ela, a libertação de Lula e a forma como ele se colocou contra Bolsonaro já no segundo dia fora da prisão representam um salto para a oposição. A ideia é que Lula adote um discurso focado na realidade das pessoas, especialmente na economia, para se reconectar com seu eleitorado. Além disso, Lula pediu a auxiliares que examinem uma agenda de viagens para o exterior. "Estou de bem com a vida e vou lutar por esse País." Ao final do discurso, o petista antecipou a discussão sobre eleições em 2022: "Se nós trabalharmos direitinho, em 2022 a chamada esquerda que o Bolsonaro tanto tem medo vai derrotar a extrema direita." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Adriana Ferraz, Bruno Ribeiro, Ricardo Galhardo, Camila Turtelli, Felipe Laurence, Ricardo Brandt, Tânia Monteiro, Tulio Kruse e Vinícius Passarelli