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G20: Bolsonaro adota discurso mais "light" do que o discutido por equipe

No lugar de referências à globalização, defendeu o sistema multilateral e a reforma da Organização Mundial do Comércio (OMC), em linha com outros países

Bolsonaro - Japão - G20 (Clauber Cleber Caetano/ PR/Reprodução)

Bolsonaro - Japão - G20 (Clauber Cleber Caetano/ PR/Reprodução)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 28 de junho de 2019 às 11h22.

Última atualização em 28 de junho de 2019 às 11h34.

Osaka — O tom adotado pelo presidente Jair Bolsonaro no discurso com líderes dos demais países que formam os Brics nesta sexta-feira (28), na cúpula do G-20, no Japão, foi diferente do que o que chegou a ser ensaiado nos bastidores da delegação brasileira. Um dos rascunhos da fala do presidente brasileiro, ao qual o jornal O Estado de S. Paulo teve acesso, continha crítica ao processo de globalização, defesa do nacionalismo e um pedido aos demais países para que apoiem a transição de governo na Venezuela.

No evento, contudo, Bolsonaro optou por uma linha mais moderada. No lugar de referências à globalização, defendeu o sistema multilateral e a reforma da Organização Mundial do Comércio (OMC), em linha com o comunicado do grupo. As críticas foram direcionadas para o protecionismo no comércio.

O discurso no evento dos Brics, que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, foi o primeiro de Bolsonaro no Japão, onde participa do encontro do G-20. A ideia do presidente brasileiro é aproveitar a vitrine internacional da cúpula das 20 maiores economias do globo para modular a imagem que tem no exterior. Desde que assumiu a Presidência, Bolsonaro se queixa de como foi retratado em veículos internacionais.

A prévia do discurso de Bolsonaro sugeria que o presidente abordasse que um dos desafios do momento é o de "dar face humana ao processo de globalização". Um dos trechos que constavam no rascunho e foram retirados do discurso final afirmava: "Não queremos, porém, que a globalização destrua nossas identidades nacionais, mas que seja um fator a reforçá-las. Nossos povos têm em comum esse anseio e precisamos trabalhar para atendê-los".

A defesa do nacionalismo, tradicionalmente bandeira do chanceler, Ernesto Araújo, e do assessor de assuntos internacionais do Planalto, Filipe Martins, foi substituída pelo apoio enfático ao sistema multilateral de comércio.

"Em meu governo, o Brasil reafirmou seu apoio ao sistema multilateral de comércio, por ter certeza de que o dinamismo da economia mundial depende dele. Estamos plenamente dispostos a seguir colaborando para a reforma da OMC e para a construção de uma agenda negociadora equilibrada", afirmou Bolsonaro no evento. Correntes protecionistas e práticas econômicas desleais foram citadas pelo presidente como fonte de tensões comerciais e risco para a estabilidade das regras internacionais de comércio.

Em tempos de guerra comercial entre China e Estados Unidos e imposição de tarifas mútuas a produtos pelos dois lados, a crítica ao protecionismo respinga na política comercial de Donald Trump, aliado do brasileiro. Trump, por sinal, é conhecido por desprezar o sistema multilateral e fazer duras críticas à OMC.

O presidente brasileiro defendeu ainda a busca de soluções para o impasse envolvendo o Órgão de Apelação e o sistema de solução de controvérsias da OMC, também na mesma linha da declaração conjunta do grupo. O governo Trump bloqueou a nomeação de juízes para a Organização, o que faz o órgão trabalhar com o número mínimo de juízes exigidos para funcionar - três das sete vagas.

Em dezembro, o bloqueio poderá paralisar o tribunal por completo. O Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado, apurou na semana passada que, para evitar que isso aconteça, os membros da Organização têm buscado um "plano B", mas que devido à necessidade de um consenso, tem ocorrido uma "bateção de cabeças".

Venezuela

A menção à crise na Venezuela foi praticamente suprimida do discurso final. A ideia de uma das versões elaboradas pela equipe do presidente era pedir que países do bloco que "mantêm importantes relações com a Venezuela" pudessem "contribuir decisivamente para o fim dessa grave crise" e pedia explicitamente apoio para a transição de poder no país vizinho.

A mensagem sobre a Venezuela seria um claro recado a chineses e, especialmente, russos. Os dois países deram sustentação ao regime chavista e fortaleceram o discurso de Nicolás Maduro de que ele não está sozinho perante o apoio da comunidade internacional. Anos de parceria com Rússia e China também possibilitaram que o regime chavista montasse um arsenal militar, com blindados usados na repressão de manifestantes.

No discurso final, no entanto, Bolsonaro retirou a fala prevista sobre a Venezuela. O presidente brasileiro se limitou a falar sobre o tema brevemente após discurso do presidente da Rússia, Vladimir Putin, e sem pedir a transição de regime defendida pela diplomacia brasileira. "Temos alguns problemas, sim, e espero contar com a participação de todos para solucionarmos pacificamente a questão da nossa Venezuela", disse Bolsonaro.

Em janeiro, China e Rússia mostraram oposição ao reconhecimento de Juan Guaidó como presidente interino da Venezuela, iniciativa encabeçada pelos Estados Unidos e seguida por cerca de 50 países, incluindo o Brasil. A pressão sobre Rússia e China para que deixem de apoiar Maduro é uma das frentes adotadas pelo governo americano contra o regime chavista.

Bolsonaro foi o primeiro a discursar na reunião dos líderes dos Brics. Em novembro, o Brasil vai sediar uma cúpula do grupo pela terceira vez, em Brasília.

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