Duplo comando: enquanto Levy, da Fazenda, vê suas propostas de ajustes frustradas, Barbosa, do Planejamento, mostra-se influente (Valter Campanato/ABr)
Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2015 às 10h14.
São Paulo — A presidente Dilma Rousseff, cumpridos quase nove meses de seu segundo mandato, tentou aproveitar o 7 de Setembro, Dia da Independência, para transmitir ao país uma mensagem de confiança num pronunciamento em vídeo postado na internet. “Sinto-me preparada para conduzir o Brasil no caminho de um novo ciclo de crescimento, ampliando as oportunidades para o nosso povo subir na vida”, disse.
Infelizmente, não é o que a realidade tem mostrado aos brasileiros. Desde janeiro, a presidente, seus ministros, o PT e os partidos da base aliada vêm batendo cabeça, com consequências deletérias para a economia. Primeiro, as medidas do ajuste fiscal, necessário para corrigir o rombo nas contas públicas, foram frustradas.
Diante da realidade, no final de julho o jeito foi praticamente zerar a meta de poupança estabelecida para 2015. O exemplo mais recente da desorientação geral ocorreu nos dias que antecederam o envio da proposta do orçamento de 2016 ao Congresso.
O governo acalentava a intenção de ressuscitar a Contribuição Provisória sobre a Movimentação Financeira (CPMF) — uma forma de aumentar a arrecadação para evitar que as contas públicas fechem no vermelho no ano que vem.
A previsível gritaria contrária ao aumento de impostos — não só da oposição e dos empresários mas também de integrantes do alto escalão em Brasília, como o vice-presidente Michel Temer — provocou um recuo.
Sem uma nova fonte de receita e sem vontade nem condições políticas para avançar num corte de despesas mais vigoroso, o governo apresentou aos parlamentares um orçamento que prevê um déficit de 30 bilhões de reais em 2016, algo inédito na história recente do país. Agora já se especula sobre a criação de um imposto temporário.
Pode ser apenas uma das muitas ideias que aparecem a cada semana para desaparecer tão rapidamente quanto surgiram. Mas são evidências de que o Brasil não está apenas sem dinheiro. Pior: sofre também com a falta de rumo. “O governo brasileiro está à deriva”, diz o cientista político Carlos Pereira, da Fundação Getulio Vargas.
“Essa situação de fragilidade na qual a presidente se encontra será difícil de reverter e arrasta consigo o país.” O cenário de dificuldades na economia e na política caracteriza um momento de transição dramático para o Brasil. Foi essa a conclusão dos participantes do EXAME FÓRUM 2015, que reuniu mais de 600 empresários e executivos em São Paulo no dia 31 de agosto.
Dele participaram como palestrantes alguns dos principais personagens do momento, como o vice-presidente da República, Michel Temer, o juiz federal Sergio Moro, responsável pelo julgamento em primeira instância dos processos gerados pelas investigações da Operação Lava-Jato, e o ministro do Tribunal de Contas da União, Augusto Nardes, relator do processo que trata das contas do governo em 2014.
A constatação: o país está chegando ao fim de um ciclo na economia e na política — e não há nenhuma clareza sobre o que virá depois. “Estamos vendo o fim de um arranjo programático comandado pelo PT e pelo PMDB que foi majoritário por 12 anos”, disse o cientista político Ricardo Sennes, sócio da consultoria Prospectiva.
Esse arranjo permitiu ao PT governar com o apoio do Congresso, da população e de empresários. Como isso foi possível? O programa funcionou nos últimos 13 anos apoiado em uma conjunção de fatores. Primeiro, houve a explosão nos preços das matérias-primas, provocada pela ascensão chinesa e sua consequente fome por minérios e grãos.
O Brasil, como vários outros países emergentes, ganhou com isso: as exportações avançaram de 60 bilhões de dólares, em 2003, para 242 bilhões, em 2013. A riqueza serviu para financiar os gastos públicos e bombar a oferta de crédito. A expansão de programas sociais, como o Bolsa Família e o Prouni, que banca universitários, encantou a população, principalmente os mais pobres.
Parte das empresas recebeu seu quinhão na forma de subsídios e isenções tributárias. O crescimento do Estado e de sua intervenção na economia contribuiu para angariar apoio político, numa coligação que incluiu partidos desde a extrema esquerda, como o PCdoB, até a direita, como o PP. Junte-se a isso a existência de legiões de desempregados disponíveis para atender ao crescimento da economia.
De 2003 a 2014, o desemprego caiu de 13% para 5%. “Criou-se um circuito no qual a demanda doméstica crescia acima da expansão do PIB, que, por sua vez, crescia mais do que podia”, diz o economista Fabio Giambiagi, especialista em contas públicas. “Isso se esgotou com o encolhimento do contingente de mão de obra disponível e com a queda nos preços das commodities.”
A atual crise mostrou que o modelo é insustentável: o déficit total das contas públicas já chega a 8% do PIB. E a dificuldade de manter alianças tão heterogêneas é uma das razões, de um lado, para o inchaço do Estado, que mantém 39 ministérios e cerca de 24 000 funcionários em cargos de indicação política — e, de outro, para a corrupção que vai sendo descoberta pela Operação Lava-Jato.
Mais: tudo isso levou o Brasil a se situar à beira do abismo na economia, às voltas com uma recessão que poderá chegar a 3% neste ano e, nas projeções de economistas, pode se estender pelo ano que vem. “O modelo não funciona porque exige aumento constante da carga tributária”, diz o economista Mansueto Almeida, um dos palestrantes do EXAME FÓRUM. “O país está rejeitando essa saída.”
Não é de estranhar, portanto, o desmonte e o gosto de fim de festa. Dilma tem o menor índice de popularidade de um governante desde a redemocratização: em agosto, apenas 8% da população considerava seu governo bom ou ótimo, segundo o Instituto Datafolha.
A confiança do consumidor nunca esteve tão baixa, de acordo com a sondagem da empresa de pesquisa de mercado Ipsos e da agência de notícias Thomson Reuters. Os dados mostram que só 10% dos brasileiros acreditam que a economia do país esteja indo bem. A situação não é melhor entre os empresários.
Um levantamento feito pela consultoria Betania Tanure Associados com exclusividade para EXAME mostra que 65% dos executivos das maiores empresas consideram 2015 um ano perdido e 60% afirmam que 2016 irá pelo mesmo caminho. “A única certeza hoje é que 2016 será mais um ano muito difícil”, diz Thilo Mannhardt, presidente do Grupo Ultra, controlador da rede de postos Ipiranga.
“Ninguém sabe quando a economia retomará o caminho do crescimento.” Sem perspectivas, os investimentos travam. A siderúrgica ArcelorMittal recebeu em 2013 máquinas no valor de 1,2 bilhão de dólares. A empresa planejava dobrar a capacidade de produção de aço em sua fábrica de João Monlevade, em Minas Gerais. Mas o equipamento está encaixotado até hoje.
A queda na demanda dos clientes, entre eles montadoras e empresas da construção, adiou o plano de expansão. “Os investimentos estão suspensos por tempo indeterminado”, diz Benjamin Baptista Filho, presidente da ArcelorMittal. Em outras palavras, quem olha para o futuro consegue enxergar pouca coisa.
“Está cada vez mais difícil apresentar o Brasil lá fora como um bom lugar para investir”, disse no EXAME FÓRUM o presidente do Citi, Helio Magalhães. Não poderia ser diferente: sem apoio político e sem popularidade, Dilma vê o mandato ameaçado pelas implicações das investigações da Operação Lava-Jato, numa frente, e pelo risco de rejeição das contas do governo, em outra.
Mais imediatamente, porém, é a permanência de Joaquim Levy no Ministério da Fazenda que preocupa — agravando o temor de perda do selo de país seguro para investimento. Colocado no cargo para promover um forte corte de custos, ele não consegue reduzir as despesas.
O que se vê, por outro lado, é o crescimento da influência dos ministros do Planejamento, Nelson Barbosa, e da Casa Civil, Aloizio Mercadante, com ideias opostas às de Levy. O ministro da Fazenda foi voto vencido no episódio que resultou no envio de uma proposta de orçamento com déficit ao Congresso.
É difícil, no momento, determinar onde fica a saída para o enrosco atual. “A situação ainda vai ficar muito pior antes de começar a melhorar”, diz Patrice Etlin, sócio do fundo Advent. Uma das razões é que, simultâneas, as crises política e econômica acabam realimentando uma à outra e deixando tudo pior.
“A crise hoje é principalmente política”, diz Abilio Diniz, presidente do conselho de administração da empresa de alimentos BRF e acionista do varejista Carrefour. “Se superarmos as dificuldades políticas, a recuperação econômica começará a aparecer.” É um ponto de vista. Mas se há algo positivo a extrair do momento é o ressurgimento de um senso de urgência, há muito adormecido, para resolver os problemas do país.
“Os avanços econômicos no Brasil sempre aconteceram quando a situação ficou muito ruim”, diz José Roberto Mendonça de Barros, da MB Associados. A forma como o Brasil combateu a hiperinflação na década de 90 é um exemplo. A alta de preços teve de se tornar insuportável para que se formasse um consenso de como combatê-la — o que resultou nas reformas que criaram o Plano Real em 1994.
O momento é adequado, portanto, para retomar uma agenda há muitos anos esquecida. “Precisamos de um projeto para modernizar a economia”, diz o economista Persio Arida, do BTG Pactual. No que consistiria essa agenda? Essencialmente, um choque de capitalismo. Ampliar a abertura comercial é um bom ponto de partida.
Segundo um estudo do Banco Mundial, a economia brasileira é a mais fechada das 20 maiores do planeta. Esse isolamento se manifesta, por exemplo, na existência de regras de conteúdo local impostas a fornecedores de setores como o de petróleo. Protegidas por essa barreira, as indústrias brasileiras beneficiadas deixam de perseguir ganhos de eficiência e produtividade.
De acordo com outro estudo, da consultoria McKinsey, o país deixa de crescer o equivalente a 1,25 ponto percentual do PIB por ano em decorrência do isolamento. A última grande liberalização do comércio com o exterior ocorreu nos anos 90, quando as alíquotas médias do imposto de importação caíram pela metade.
De 1990 a 1995, as importações dobraram e as exportações cresceram 50%. De lá para cá, os avanços foram tímidos. Tome-se o exemplo dos acordos internacionais. Enquanto países como Colômbia e Peru passaram a negociar diretamente tratados comerciais no mundo todo, o Brasil não se moveu. O custo da imobilidade é alto.
O maior acordo em gestação no mundo envolve os Estados Unidos e a União Europeia. O objetivo é eliminar barreiras não tarifárias, como certificações sanitárias e técnicas. Se ficar fora desse acordo, o Brasil deve perder 4 bilhões de dólares em exportações por ano para os mercados europeu e americano, segundo um estudo da Fundação Getulio Vargas.
Se fizer parte do acordo, pode ganhar 51 bilhões de dólares. “A marcha lenta do governo nas negociações internacionais derruba a produtividade da indústria e reduz as exportações”, diz Lucas Ferraz, professor da FGV e um dos autores do estudo. As leis brasileiras também não colaboram para resolver outro nó: a falta de mão de obra de qualidade.
Uma das maneiras de suprir a carência de profissionais é atrair imigrantes qualificados. Hoje, apenas 0,3% da população brasileira é formada por imigrantes. É quase nada em comparação com países como a Suíça, em que 23% da população é estrangeira.
Uma pesquisa feita em 2014 pela consultoria Brookfield com profissionais de 143 empresas de todo o mundo mostra que o Brasil só perde para a China em restrições para o trabalho de expatriados. A legislação para o trabalho de estrangeiros é da década de 80.
“Existe um conflito em relação ao conteúdo de uma nova lei, se deve ser mais voltado para os direitos humanos ou para o mercado de trabalho”, diz Maria Vincenza Desiderio, analista do Instituto de Políticas de Migração da Europa, que fez um estudo encomendado pelo governo brasileiro sobre atração de profissionais.
Sem facilitar o acesso, o Brasil não terá capacidade de suprir a demanda por trabalhadores qualificados nos próximos anos. No setor de tecnologia da informação, mesmo com a crise econômica, espera-se um déficit de 128 000 profissionais em 2016. A carência deve triplicar até 2022.
“O potencial das empresas de tecnologia corre o risco de não se concretizar por falta de gente preparada”, diz Virgínia Duarte, gerente da Softex, a Associação para Promoção da Excelência do Software Brasileiro. O caminho da recuperação passa pela diminuição do tamanho e da presença do Estado na economia.
“Temos um modelo antiquado, dirigista, ancorado em um Estado capturado, balofo”, diz o economista Arminio Fraga, sócio da Gávea Investimentos e que integrou a campanha do senador Aécio Neves, do PSDB, nas eleições do ano passado. “Precisamos de um Estado que pare de crescer e aumente sua eficiência.”
A retomada das privatizações é uma medida nessa direção. Desde 2002, os governos Lula e Dilma tiraram o tema da agenda e por diversas vezes reiteraram o desprezo pela venda de estatais. Só recentemente, para fazer caixa, o governo passou a estudar a abertura do capital da Caixa Econômica Federal e de outras estatais.
Hoje, a União controla mais de 100 empresas, as quais, juntas, empregam meio milhão de pessoas. Segundo um levantamento da consultoria Bain, a venda das oito principais empresas públicas poderia gerar aos cofres públicos 300 bilhões de reais, dez vezes o rombo previsto para as contas em 2016. A transferência do controle de estatais ao setor privado abre espaço para o aumento da eficiência.
“A privatização costuma tornar as empresas mais produtivas”, diz o economista Saul Estrin, chefe do departamento de administração da London School of Economics e estudioso do assunto. “Isso acontece porque os incentivos para uma empresa privada melhorar o desempenho são maiores do que no caso de estatais.”
No Brasil, as empresas que passaram para mãos privadas desde 1991, como a Vale e a Embraer, tornaram-se mais eficientes e lucrativas. A experiência internacional mostra que é possível aumentar a eficiência dos serviços públicos aliviando a mão do governo.
Um exemplo vem da Suécia, outrora um símbolo do chamado estado de bem-estar social, no qual o poder público concede uma ampla gama de benesses à população. Nos anos 90, os suecos precisaram enxugar o Estado para combater uma crise econômica causada, em boa medida, pela falta de recursos diante da avassaladora expansão dos benefícios nas duas décadas anteriores.
Os gastos sociais chegavam a insuportáveis 67% do PIB. Começou, então, um processo de desmonte, mesmo em serviços tidos como tipicamente públicos. Atualmente, 20% dos hospitais e um terço das clínicas do governo são geridos por empresas privadas. A saúde pública sueca é mais eficiente do que a média europeia. Os gastos sociais já caíram para 49% do PIB.
“A iniciativa privada trabalha com orçamentos enxutos e metas de desempenho”, diz o sueco Nima Sanandaji, especialista em políticas públicas do Instituto de Assuntos Econômicos, de Londres. “Não é à toa que os hospitais administrados por empresas são mais bem avaliados pelos suecos do que os do governo.”
Uma das áreas em que há muito a ganhar é na redução do intervencionismo. Desde 2006, os programas de incentivo à indústria brasileira custaram aos cofres públicos 1,5 trilhão de reais. Aqui existe claramente uma oportunidade de queda do exorbitante custo de capital no Brasil.
A oferta de crédito subsidiado a empresas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) representa 5% do PIB — o dobro do que era em 2006. Isso causa uma distorção. Os empréstimos a juros menores vêm de recursos captados pela União a taxas de mercado. A diferença é coberta pelo Tesouro e vira dívida.
O endividamento do governo normalmente eleva as taxas de juro. Ou seja, o juro pago pela maioria das empresas e consumidores é mais alto para bancar a taxa vantajosa de poucos escolhidos.
Num estudo ainda inédito, a economista Monica de Bolle, do centro de estudos Peterson Institute, de Washington, estima que, se o BNDES voltasse a ter peso semelhante ao de 2004 e o governo fizesse um superávit primário de 3%, a taxa de juro real poderia cair até 2,5 pontos percentuais. “Seria o retorno à boa condição fiscal que o país manteve na primeira metade dos anos 2000”, diz Monica.
Um governo disposto a cortar subsídios e incentivos, porém, teria de encarar temporariamente o descontentamento de quem deixa de contar com a camaradagem. Mas os benefícios para a economia são de longo prazo. Um dos países que atacaram esse tipo de problema na história recente foi a Nova Zelândia.
Até meados da década de 80, o governo neozelandês levava pela mão produtores e indústrias ligadas ao agronegócio. Eles tinham crédito subsidiado e compensações em dinheiro no caso de perdas na produção de leite, carne e lã. Os recursos para bancar a festa vinham de uma tributação pesada sobre as importações.
Nos anos 70, quando o preço das matérias-primas caiu no mercado internacional, o modelo foi ferido de morte. De 1976 a 1984, o crescimento médio do país ficou em 1% ao ano. Foi preciso eliminar os subsídios agrícolas e as tarifas de importação. Num primeiro momento, houve turbulência: milhares de agricultores acostumados a depender do governo deixaram a atividade.
A quebradeira no campo afetou a economia, e a taxa de desemprego subiu de 4%, em 1984, para 11%, no início dos anos 90. Mas as dores compensaram. A produtividade da agroindústria neozelandesa, praticamente estagnada com os subsídios, triplicou nos últimos 30 anos. O crescimento médio nas últimas duas décadas beirou os 3%, o que reduziu o desemprego.
“A economia neozelandesa estaria numa confusão enorme caso não tivesse passado pelo ajuste”, diz o economista John Ballingall, diretor do Instituto de Economia e Pesquisas da Nova Zelândia. “Nossos exportadores hoje respondem às mudanças do mercado global, e por isso eles são mais produtivos.”
Inchada, a máquina estatal fica mais difícil de ser administrada. Ela leva à necessidade de arrecadar cada vez mais para fazer frente às muitas obrigações do poder público. No caso brasileiro, isso se reveste de algo ainda mais perverso: cerca de 90% das receitas da União já têm um destino fixo, como as áreas de educação e saúde ou os gastos previdenciários.
O que no princípio era para evitar o mau uso de dinheiro público acabou engessando a gestão pública. Há ainda destinações obrigatórias cujas regras são bombas-relógio para as próximas gerações de brasileiros, como é o caso da Previdência Social. Atualmente, os repasses para gastos sociais consomem mais de 10% do orçamento — e isso tende a crescer.
O rombo da Previdência deve chegar a 120 bilhões de reais em 2016. A consequência de um Estado grande e que se mete em tudo é a criação de uma espécie de bola de neve. Como tem muitas atribuições, o poder público precisa arrecadar cada vez mais — e, ao retirar dinheiro da economia para se financiar, reduz espaço para atuação do setor privado.
Nesse ambiente, é melhor para um empresário ser amigo dos governantes do que eficiente em suas operações. A corrupção acaba sendo quase um efeito natural dessas relações. Trata-se de uma realidade que o juiz federal Sergio Moro tem esmiuçado em suas decisões nos processos relacionados à Operação Lava-Jato.
Um exemplo: o projeto da refinaria Abreu e Lima começou com uma estimativa de investimento de 2 bilhões de dólares, que se transformaram em 18 bilhões durante as obras. “Será que a existência de um esquema de propinas nas obras não foi o causador do aumento do valor?”, diz Moro. “A corrupção sistêmica gera prejuízos ao mercado.”
Outra vantagem de enxugar o poder público é facilitar a fiscalização. No caso brasileiro, ainda vai demorar para chegar ao ponto em que, por ser menor, o Estado ficará mais fácil de ser fiscalizado. Mas um avanço que já seria possível pôr em prática é a criação de um conselho de gestão fiscal, um órgão independente que funcione como guardião dos recursos públicos.
Entidades desse tipo ganharam espaço no mundo após a crise econômica de 2008. Um estudo do Fundo Monetário Mundial indica que conselhos fiscais, como o do Canadá, melhoram até 1,5% do PIB o balanço do orçamento.
Não faltam exemplos e ideias para o conserto geral do Estado brasileiro. Corrigir o que estava errado é sempre mais difícil do que estragar o que vinha dando certo. E leva bem mais tempo. Mas já seria uma boa notícia se o país encontrasse o rumo — dessa vez, o certo.