Negócios

Startup transforma sobras de cerveja em proteína e mira mercado de US$ 252 bilhões

Com o micélio, a foodtech já planeja expansão para o mercado europeu; mercado de fermentação pode atingir US$ 250 bilhões de dólares até 2029

Eduardo Sydney e Paulo Ibri, da Typcal: mercado de fermentação recebeu 70% dos investimentos em foodtechs nos últimos 12 meses (Typcal)

Eduardo Sydney e Paulo Ibri, da Typcal: mercado de fermentação recebeu 70% dos investimentos em foodtechs nos últimos 12 meses (Typcal)

Laura Pancini
Laura Pancini

Repórter

Publicado em 14 de outubro de 2024 às 10h10.

Última atualização em 14 de outubro de 2024 às 16h15.

Tudo sobreFoodtechs
Saiba mais

O mercado de foodtechs, que inicialmente emergiu com promessas de inovação e sustentabilidade, enfrenta hoje novos desafios. A desaceleração do consumo de produtos à base de planta obrigou muitas startups a repensarem seus modelos. A carne cultivada em laboratório também é muito custosa e não entrou com tanta facilidade nos lares brasileiros. Mais barata e eficiente, a aposta agora é na fermentação, mercado com projeção de atingir US$ 252 bilhões de dólares até 2029 e que recebeu 70% dos investimentos em foodtechs no último ano.

Nesse contexto, surge a brasileira Typcal, a primeira foodtech a desenvolver a proteína de micélio na América Latina. Proveniente da parte vegetativa dos fungos, o micélio é rico em proteínas e pode ser produzido em questão de horas. A startup quer complementar os produtos já existentes no mercado, seja de origem animal ou vegetal, em vez de substituí-los. Com essa proposta, a empresa aposta em um modelo B2B que promete transformar a indústria alimentícia e já mira a expansão para o mercado europeu em 2024​​.

Fundada em 2021, a Typcal é liderada por Paulo Ibri e Eduardo Sydney, profissionais com experiências complementares. Ibri traz uma sólida carreira no setor de bens de consumo, com passagens por gigantes como Red Bull e Coca-Cola, enquanto Sydney é doutor em biotecnologia e especialista em fermentação. Foi essa combinação de visão estratégica e conhecimento técnico que impulsionou a criação da empresa, hoje pioneira na produção de micélio na América Latina.

A opção pelo modelo B2B foi uma decisão estratégica. Segundo Ibri, o foco é fornecer ingredientes inovadores para outras empresas, ampliando o impacto da proteína de micélio no mercado e evitando competir diretamente no varejo. Com isso, a Typcal pode estar presente em diversas categorias – de carnes a laticínios e snacks – e atender à demanda por alimentos mais saudáveis e sustentáveis sem a necessidade de construir uma marca voltada ao consumidor final.

O que é o micélio e como ele é produzido?

O micélio é a parte vegetativa dos fungos, formada por filamentos finos chamados hifas. Rico em proteínas e fibras, o micélio não possui sabor amargo, o que facilita sua aplicação em alimentos, além de contribuir para a redução de gordura, sódio e açúcar nos produtos finais​​. Embora já seja consumido indiretamente há séculos em produtos como queijos e molhos, seu uso como fonte proteica é uma inovação recente.

O diferencial da Typcal está em um processo biotecnológico que utiliza a fermentação controlada do micélio, feita de forma verticalizada – ou seja, sem a necessidade de grandes áreas de plantio. Eduardo Sydney explica que, comparado aos métodos tradicionais de produção de proteínas – sejam elas vegetais ou animais – a fermentação de micélio é 6.000 vezes mais eficiente. Essa eficiência não apenas reduz a necessidade de terras férteis e água, mas também permite que o processo seja totalmente controlado em ambientes fechados, como fábricas.

Com um ciclo produtivo rápido, o micélio pode se multiplicar em poucas horas. Para crescer, ele se alimenta de subprodutos da indústria alimentícia, como as sobras do processo de produção de cerveja. A Typcal já trabalha com a Ambev e poderia, por exemplo, aproveitar do que resta nas fábricas da Brahma, Budweiser e Corona. Isso se alinha ao conceito de economia circular, uma vez que utiliza resíduos que seriam descartados para gerar um produto com alto valor agregado.

Segundo Ibri, em dois a três anos, o custo da proteína de micélio será equivalente ao das proteínas vegetais como a ervilha. Além disso, o cofundador projetou que em até 10 anos, a proteína de micélio será mais barata que a soja. Para efeitos de comparação, somente o Brasil importa cerca de 100 milhões de toneladas de soja por safra.

Além disso, o processo de fermentação reduz drasticamente as emissões de carbono, com 98% menos CO₂ que o gado, 88% menos que o frango e 45% menos que a soja. A pegada hídrica também é incomparável: 99,8% menor que a do gado, 99,5% menor que a do frango e 96% menor que a da soja, tornando essa tecnologia uma das mais sustentáveis no setor alimentício​.

Um mercado em expansão

Apesar de ser a primeira na América Latina, a Typcal não está sozinha nessa. Segundo um estudo da Markets and Markets, o mercado de fermentação de micélio pode atingir US$ 252 bilhões até 2029. A foodtech brasileira já projeta uma expansão internacional em 2024, com a abertura de uma fábrica comercial e a entrada no mercado europeu.

Isso porque o continente concentra os maiores aportes financeiros em foodtechs, especialmente nas áreas de fermentação e carne cultivada. Além disso, regulamentações mais rígidas e incentivos para alternativas de menor impacto ambiental tornam o mercado europeu um terreno fértil para a adoção de novas tecnologias alimentares. Como a proteína de micélio utilizada pela Typcal já é aprovada para comercialização na Europa, a empresa poderá lançar produtos mais rapidamente.

Em 2023, a empresa foi acelerada por um programa suíço especializado na indústria alimentícia, o que abriu portas para parcerias com grandes players como a Givaudan. Além disso, a Europa oferece um mercado consumidor altamente preocupado com a sustentabilidade e a saúde, características que impulsionam o consumo de alternativas como a proteína de micélio. A Typcal não divulgou nomes, mas disse que, em 2025, pretende lançar uma linha de produtos em parceria com grandes indústrias dentro e fora do Brasil.

Acompanhe tudo sobre:FoodtechsStartupsProteínas

Mais de Negócios

Startup do Recife quer ser o primeiro serviço centralizado para mulheres grávidas

Como o grupo da Leroy Merlin quer faturar R$ 3 bilhões com atacarejo de construção no Brasil

Esta agência de conteúdo carioca começou com R$ 300 e hoje fatura R$ 3 milhões

Quer trabalhar na Tesla? Na montadora, salário menor é compensado por ações