Donald Trump, ex-presidente dos Estados Unidos (Giorgio Viera/AFP)
Agência de notícias
Publicado em 22 de julho de 2024 às 16h51.
Última atualização em 22 de julho de 2024 às 17h04.
A decisão de Joe Biden de abandonar a disputa presidencial dos Estados Unidos, após semanas de pressão, relegou ao ex-presidente e candidato republicano, Donald Trump, o título de pessoa mais velha a concorrer para a Casa Branca. Aos 78 anos, o bilionário garante estar em plena forma física, mas há muitas questões em aberto, inclusive após o atentado do dia 13 de julho.
Desde o momento em que uma bala de fuzil passou a centímetros de sua cabeça na Pensilvânia, uma semana se passou até que informações mais detalhadas sobre o estado do ex-presidente fossem apresentadas: no sábado, o deputado Ronny Jackson, ex-médico da Casa Branca, afirmou em comunicado que o disparo causou um ferimento de 2 cm na orelha, que não precisou ser suturado, mas cujas bandagens são trocadas com frequência — os curativos se tornaram um símbolo na Convençao Nacional Republicana, na semana passada.
Ao chegar ao hospital, escreveu Jackson, ele foi submetido “a uma extensa avaliação para determinar outros ferimentos, incluindo uma tomografia de sua cabeça”. O deputado disse ainda que Trump “passará por novas avaliações, incluindo um exame de audição, se necessário”, e que será examinado de forma regular, inclusive pelos médicos que o avaliaram logo após o ataque. Não foram fornecidas informações detalhadas sobre os exames ou avaliações posteriores.
"É necessária uma avaliação pública completa dos ferimentos de Trump, tanto para a saúde do antigo presidente como para a clareza que pode proporcionar aos eleitores sobre a recuperação do homem que poderá voltar a ser presidente dos Estados Unidos", escreveu, em artigo, Sanjay Gupta, colunista da rede CNN. "A preocupação é que tiros perto da cabeça possam causar lesões que não são imediatamente perceptíveis, como sangramento no cérebro, danos ao ouvido interno ou até trauma psicológico."
Mesmo antes de chegar à Casa Branca, Donald Trump não raro se gabava se sua saúde “perfeita”. Em 2015, pouco depois do anúncio da pré-candidatura, um médico chamado Harold Bornstein, que cuidou do republicano por 35 anos, escreveu uma carta recheada de elogios e declarou de “maneira inequívoca”, que Trump seria o “mais saudável indivíduo já eleito à Presidência dos EUA".
Já em 2018, Ronny Jackson disse que o então presidente insistiu em realizar um teste cognitivo, e concluiu que Trump “mentalmente estava muito aguçado, e muito preservado”. O republicano passou a usar o teste como mais uma prova de que estava mais do que apto para o cargo, e vinha desafiando o agora ex-rival na disputa presidencial para realizar o mesmo exame.
"Ele [Joe Biden] não sabe nem o que a palavra “inflação” significa. Acho que deveria realizar um exame cognitivo, como eu fiz", disse Trump durante discurso em Detroit.
Em novembro do ano passado, Trump publicou em sua rede social, o Truth Social, uma carta do médico Bruce Aronwald, declarando que seus exames cognitivos “foram excepcionais, que os exames de sangue estavam dentro do normal e que avaliações para doenças cardiovasculares e para o desenvolvimento de tumores não apresentaram riscos.
As cartas e declarações podem servir como excelentes ferramentas de propaganda, mas há uma grande distância entre o que elas dizem e o que elas não dizem.
Nenhuma das declarações médicas — mesmo as feitas na Casa Branca — apresentaram informações complementares sobre os exames, tampouco esclareceram quais testes foram feitos: sobre o teste cognitivo de 2018, Trump disse posteriormente que “acertou todas as questões”. Os médicos não divulgaram quais medicamentos ele usou na Casa Branca, muito menos depois de deixar o poder. E ainda há dúvidas sobre o que já foi dito a seu favor. Em entrevista à NBC, em 2016, Bornstein reiterou acreditar que a saúde de Trump “é excelente”, mas revelou que a carta usada pelo então candidato na campanha foi escrita em cinco minutos, a pedido do bilionário, e que sequer teve tempo de revisá-la.
"Existe um desejo do público de saber sobre a capacidade física e mental de qualquer pessoa que vá ocupar o mais alto cargo do país", disse Joe Verghese, professor de neurologia na Faculdade Albert Einstein de Medicina, em entrevista ao New York Times. "Você quer ter a certeza de que passos foram tomados para garantir que a pessoa que você está elegendo para o cargo terá capacidade física e mental para isso."
Logo que lançou a candidatura em 2016, seus curiosos hábitos alimentares acenderam alertas entre nutricionistas, cardiologistas e médicos de praticamente todas as especialidades: Trump bebia, de acordo com a imprensa americana, entre 12 e 14 latas de Coca-Cola Diet por dia, e teria um botão especial na mesa do Salão Oval para pedir a bebida. Fã de fast food, ele inundou o Instagram com fotos de hambúrgueres, pratos de comida mexicana e filés bem-passados, servidos com muito catchup.
Aliado à falta de exercícios, um comportamento que poderia aumentar suas possibilidades de sofrer um ataque cardíaco ou um acidente vascular cerebral, como escreveu seu médico particular em 2018 — o então presidente teria mudado de hábitos, mas a recente perda de peso levantou questões sobre o uso de Ozempic, um medicamento conhecido pelos seus efeitos no emagrecimento.
Com Biden fora do páreo, e com uma chapa democrata provavelmente composta por pessoas com algumas décadas a menos de idade, a saúde de Trump deve ser cada vez mais questionada em público, e episódios outrora pouco notados podem ganhar evidência.
Assim como o atual presidente, o bilionário também comete gafes recorrentes: em janeiro, confundiu Nikki Haley, ex-governadora e ex-pré-candidata republicana à Presidência, com a ex-presidente da Câmara, Nancy Pelosi. Também disse ter derrotado o ex-presidente Barack Obama em 2016, quando a vitória foi sobre Hillary Clinton.
Em junho, no discurso em que sugeriu a Biden realizar um teste cognitivo, errou o nome do deputado Ronny Jackson, o chamando de Ronny Johnson. Em entrevista coletiva recente, disse que o governador de Nova York era Andrew Cuomo, que renunciou em 2021, sendo substituído por Kathy Hochul.
"Ele para no meio de frases, está lendo o teleprompter e mesmo assim sua mente parece ficar em branco. Trocando Nikki Haley por Nancy Pelosi, Barack Obama por Joe Biden, e é tão patético e triste", disse o apresentador Joe Scarborough, da MSNBC, após uma sequência de gafes de Trump em um discurso, em março. "Alguns estão dizendo que ele está fazendo de propósito. Não, ele não está fazendo nada disso de propósito. Considere o fato de que sua mente fica em branco e ele parece perdido."