Afeganistão: dezenas de familiares das vítimas se reuniram no escritório do governador, levando consigo corpos das crianças mortas (Parwiz/Reuters)
AFP
Publicado em 3 de novembro de 2016 às 21h47.
Pelo menos 30 civis, incluindo várias crianças, morreram nesta quinta-feira em um bombardeio da Otan na província afegã de Kunduz, pouco depois de dois soldados americanos terem sido mortos em um ataque talibã.
O bombardeio causou protestos na cidade de Kunduz, capital da província homônima, no norte do país. Dezenas de familiares das vítimas se reuniram no escritório do governador, levando consigo corpos das crianças mortas.
"Estou com o coração destroçado. Perdi sete membros da minha família. Quero saber por que essas crianças inocentes morreram. Por acaso eram talibãs?", lamentou Taza Gul, um pedreiro de 55 anos.
"As forças afegãs e as tropas da coalizão executaram uma operação conjunta contra os insurgentes talibãs na qual morreram 30 civis afegãos e outros 25 ficaram feridos", disse à AFP Mahmud Danish, porta-voz do executivo da província.
Um porta-voz da polícia, Mahmoodulah Akbari, confirmou o balanço de vítimas e afirmou que entre elas havia várias crianças, incluindo um bebê de três meses. "Estavam dormindo quando sua casa foi atacada pelas tropas da coalizão", explicou.
O QG da Otan no Afeganistão e um encarregado americano da Defesa confirmaram que as forças americanas realizaram bombardeios aéreos em Kunduz "para defender forças aliadas que estavam sendo atacadas", mas não informaram o número de vítimas civis.
As fontes revelaram que foi aberta uma investigação para determinar as circunstâncias do bombardeio e o impacto que ele teve para a população civil.
O porta-voz do Departamento de Estado Mark Toner admitiu que se tratou de um "acontecimento trágico".
O general Charles Cleveland, um dos comandantes das forças americanas no Afeganistão, indicou que a investigação será realizada com as autoridades afegãs.
O ataque aconteceu na periferia de Kunduz nas primeiras horas de quinta-feira, pouco depois que dois soldados americanos e três membros das forças especiais afegãs morreram em uma operação contra os talibãs na mesma província.
Os dois eventos mostram a crescente insegurança na capital da província, um mês depois que os talibãs tentaram conquistá-la pela segunda vez no último ano.
Os soldados mortos foram atacados enquanto ajudavam as tropas afegãs a "limpar uma posição dos talibãs no distrito de Kunduz", informou a Otan no Afeganistão.
"Essa perda nos parte o coração", escreveu o general John Nicholson, que dirige as forças americanas e o conjunto da operação da Otan no Afeganistão.
A poucos dias da eleição presidencial nos Estados Unidos, o ataque lembra que o próximo presidente, seja Hillary Clinton ou Donald Trump, terá que administrar o longo conflito iniciado em 2001, sem qualquer solução em vista, uma questão apenas mencionada durante a campanha.
Desde a retirada da maior parte das forças ocidentais no fim de 2014, a operação Resolute Support conta com 12.000 homens, entre eles cerca de 10.000 americanos, que se encarregam de formar, aconselhar e assistir os soldados afegãos.
Após o presidente Barack Obama estender em junho o mandato de suas tropas no país asiático, a aviação americana bombardeia posições para proteger seus aliados afegãos ou frear o avanço dos insurgentes talibãs.
As tropas afegãs, que combatem os talibãs na primeira linha desde o final da missão de combate da Otan, há quase dois anos, sofrem enormes perdas, apesar dos comunicados entusiastas da organização transatlântica sobre seus avanços.
Em 2015, morreram cerca de 5.000 soldados afegãos e, em 2016, as perdas são ainda mais preocupantes: 5.523 mortos entre 1 de janeiro e 19 de agosto, segundo o Inspetor Geral para a Reconstrução do Afeganistão, um organismo americano.
A título comparativo, o exército americano perdeu 2.000 soldados no combate desde a invasão dos EUA ao Afeganistão em 2001.
Os talibãs, que lançaram várias ofensivas no país, parecem ter transformado Kunduz em um de seus principais alvos estratégicos.