Meu pai doou parte de um terreno para minha irmã antes de falecer. Pode?
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Marília Almeida
Publicado em 23 de janeiro de 2022 às 15h59.
Pergunta do leitor: Meu pai faleceu há 22 anos, deu uma parte do único terreno que tem para a minha irmã construir uma casa para ela e não me comunicou. Hoje minha mãe (com mal de Alzheimer) mora na casa construída por meu pai e minha irmã cuida dela. Meu sobrinho já se apoderou de um quarto onde mora com a esposa e o filho, e somente descobri isso no ano passado. Ela também já fez a escrituração da divisão do terreno onde construiu a casa dela. Isto é legal? Nada foi assinado por mim abrindo mão desta parte do terreno.
Resposta de Samir Choaib e Lais Meinberg Siqueira*
De acordo com a legislação brasileira, é nula a doação que ultrapassar o valor de 50% dos bens do doador no momento da liberalidade (artigo 549 do Código Civil).
Com esta disposição, a lei visa proteger os herdeiros necessários (descendentes, ascendentes e/ou cônjuges), de forma a garantir que estes recebam a parcela da ‘herança legítima’ (50% do patrimônio), ao passo que a parcela remanescente dos bens, denominada de ‘herança disponível’, pode ser doada em vida ou destinada em testamento, da forma como o detentor dos bens desejar, inclusive beneficiando terceiros não consanguíneos.
Assim, para analisar a validade da doação realizada pelo seu pai à sua irmã, primeiramente, é preciso verificar se a parcela do terreno doada ultrapassa 50% do valor total dos bens detidos à época da doação.
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Neste caso, caber checar, ainda, se constou expressamente, no contrato ou escritura, que a doação foi realizada da “parcela disponível”, pois, na ausência desta informação, ou caso conste como “doação da legítima”, o documento deveria ter sido apresentado obrigatoriamente no processo de inventário e partilha dos bens do seu pai, de maneira que os demais herdeiros pudessem ser compensados e recebessem o valor equivalente a esta doação no referido processo.
Caso se verifique, no entanto, que a doação foi realizada da parcela disponível e tenha ultrapassado o valor equivalente a 50% do patrimônio do seu pai à época da liberalidade, caberá ação judicial para redução da doação até o limite permitido por lei.
Importante verificar, no entanto, se não houve perda do direito de ingresso da ação judicial por prescrição (tem prevalecido nos tribunais que, para a ação de redução, o prazo prescricional é de 10 anos, a contar da liberalidade, para doações realizadas a partir de janeiro de 2003 e de 20 anos para doações realizadas antes deste período, na vigência do Código Civil de 1916).
*Samir Choaib é advogado e economista formado pela Universidade Mackenzie, pós-graduado em direito tributário pela PUC-SP. É sócio do escritório Choaib, Paiva e Justo, Advogados Associados, responsável pela área de planejamento sucessório do escritório.
*Lais Meinberg Siqueira - Advogada formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Cursou Contabilidade Aplicada ao Direito pela GVLaw/SP e atualmente cursando pós-graduação em Direito Empresarial pela FGV. Atua no escritório nas áreas de Planejamento Sucessório e assessoria tributária às pessoas físicas.
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