FGTS: nova regra de rendimento muda algo no saque-aniversário? Tire essa e outras dúvidas
STF decidiu que o saldo do Fundo precisa ser reajustado ao menos pela inflação, usando como referência o IPCA. Decisão não é retroativa. Entenda o impacto da decisão
Agência de notícias
Publicado em 14 de junho de 2024 às 08h13.
O saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) terá que ser corrigido, pelo menos, pela inflação, seguindo IPCA, índice que aponta a inflação oficial do país, calculado pelo IBGE. Essa foi a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento que finalizou ontem.
A mudança nas regras de rendimento do Fundo levanta dúvidas entre os trabalhadores que têm usado o recurso do saque-aniversário, criado no governo Bolsonaro, para acessar parte dos recursos de suas contas vinculdas.
Muita gente inclusive recorre a bancos para adiantar essa retirada mediante pagamento de juros. A principal dúvida é: o que vai mudar no saque-aniversário?
A resposta é: praticamente nada. As regras para o saque-aniversário — parcela do FGTS que o trabalhador pode retirar todos os anos nos meses próximos a seu aniversário — continuam as mesmas.
Mas o saque-aniversário é calculado como um percentual do saldo disponível na conta do trabalhador. E este saldo, a partir de agora, terá a garantia de manter seu poder de compra, ou seja, de ser corrigido ao menos pela inflação. Na prática, então, não haverá mais risco de o valor anual do saque-aniversário ser corroído pela inflação.
O que o STF decidiu?
A ação no Supremo questionava a perda do poder de compra do trabalhador com o critério de correção do saldo do FGTS. Em seus argumentos iniciais, o Partido Solidariedade, que é o autor da ação apresentada ao Supremo em 2014, mostrava que, entre janeiro de 1999 e 2013, houve perda de 88,3% no poder de compra do trabalhador. Neste período, a inflação superou a rentabilidade do Fundo.
O STF decidiu que o FGTS deve garantir ao trabalhador no mínimo a reposição da inflação, usando como critério o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo, calculado pelo IBGE).
Quando começa a valer a correção do FGTS?
A nova regra de correção do FGTS entra em vigor assim que o STF publicar o acórdão sobre a decisão, o que deve ocorrer nos próximos dias.
A nova regra será mais vantajosa para o trabalhador?
A mudança no cálculo não necessariamente vai representar um ganho para o trabalhador. Mas estará garantido que, em momentos de alta da inflação, o saldo do FGTS manterá seu poder de compra.
Para se ter uma ideia, desde 2016, a rentabilidade do Fundo supera a inflação em todos os anos, à exceção de 2011. Isso ocorreu também porque, além da correção básica do saldo (a regra atual é o reajuste por TR mais 3% ao ano), o FGTS decidiu distribuir uma parcela significativa de seu lucro aos trabalhadores. Com isso, o ganho final ficou maior.
Desde 2016, a inflação superou, em todos os anos, o índice de TR mais 3% anuais. Mas, considerando a distribuição dos lucros, que nesse período foi de pelo menos R$ 6,2 bilhões anuais, a equação se inverte.
A exceção foi o ano de 2011, quando a inflação foi muito alta, superando 10%. Naquele ano, mesmo com a distribuição de uma parcela de R$ 13,2 bilhões do lucro do Fundo para o trabalhador, a rentabilidade final do saldo do FGTS foi de apenas 5,83%, representando uma perda no poder de compra.
Como será garantido que, a partir de agora, o FGTS não vai perder poder de compra?
O STF determinou que a regra de correção atual, de TR mais 3% ao ano, continua válida. Mas, se esse índice ficar abaixo do IPCA, caberá ao Conselho Curador do FGTS determinar uma forma de compensação ao trabalhador.
Estará garantido assim que, em qualquer cenário, o cotista do FGTS terá seu saldo corrigido ao menos pela inflação.
Como será a compensação?
Não foi definido como será feita a compensação caso a rentabilidade do Fundo fique abaixo da inflação. Nos últimos anos, o governo tem feito uma distribuição maior de parte do lucro do FGTS. Em 2017, o então presidente Michel Temer decidiu repartir 50% dos ganhos obtidos pelo Fundo em 2016 com o trabalhador, patamar que se repetiu no ano seguinte.
Em 2019, uma lei determinou que a totalidade do lucro fosse distribuída. E, em 2020, essa parcela passou a ser definida pelo Conselho Curador – regra que está em vigor até hoje. É essa instância tripartite, formada por representantes dos trabalhadores, do governo e dos empresários, que define qual será o percentual do lucro a ser repassado para os cotistas do Fundo.
Em 2022, foram distribuídos R$ 12,7 bilhões, o equivalente a 99% do lucro do FGTS. Este valor foi depositado na conta dos trabalhadores no ano seguinte, ou seja, 2023. Ainda não foi definida a parcela do lucro de 2023 que será distribuída e que será depositada para os trabalhadores em 2024. O valor, ainda não confirmado, deve ser de R$ 14 bilhões.
Além disso, o governo poderá fazer este ano, excepcionalmente, um repasse extra de R$ 20 bilhões do patrimônio líquido do Fundo para os cotistas. Essa sinalização foi feita nos bastidores ao STF como parte de um acordo para tentar evitar que o Supremo determinasse uma mudança retroativa na correção do FGTS. Ou seja, este ano, no total, devem ser repassados R$ 34 bilhões ao trabalhador.
Por que a decisão não foi retroativa?
O governo temia que o STF determinasse uma correção retroativa dos saldos do FGTS desde 1999. E chegou a apresentar uma estimativa de que, se isso fosse feito, representaria uma conta de R$ 295 bilhões para os cofres públicos.
O Supremo foi sensível a esses argumentos e determinou que a nova regra valeria daqui por diante.