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Bancos vão se tornar marketplace não só financeiro, diz CEO da Mastercard

Para João Pedro Paro Neto, bancos e corretoras com bases amplas de clientes vão cada vez mais reunir parceiros e ampliar oferta de soluções e produtos

João Pedro Paro Neto, CEO da Mastercard: foco também no segmento de pagamentos B2B
 (Leandro Fonseca/Exame)

João Pedro Paro Neto, CEO da Mastercard: foco também no segmento de pagamentos B2B (Leandro Fonseca/Exame)

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Marcelo Sakate

Publicado em 6 de dezembro de 2020 às 09h53.

Última atualização em 6 de dezembro de 2020 às 09h54.

Pague como quiser, da maneira como achar conveniente. E não precisa ser com cartão de crédito ou débito. Em alguns casos, será por aproximação com pulseira ou outro objeto. Em outros, a compra vai se dar no marketplace (o mercado virtual) de um banco, de uma corretora, de uma rede varejista ou até da indústria de materiais de construção. Em todos os casos, a briga será para oferecer a melhor experiência para o cliente. É o afirma João Pedro Paro Neto, CEO da Mastercard Brasil e Cone Sul, em entrevista à EXAME Invest.

"O banco ou a corretora focado só no negócio dele não é suficiente para o tamanho e a expressão que gostariam de ter", afirma Paro Neto, ou JP, como também é conhecido. "A tendência é que toda empresa com uma boa base de clientes tente criar uma oferta de soluções e produtos mais robusta e integrada, juntando parceiros", diz o executivo, explicando a presença da Mastercard nesse arranjo.

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"Não importa como o cliente vai pagar, nós queremos oferecer a solução", afirma Paro Neto. É a estratégia conhecida como multi rail (algo como multi trilhos, na tradução livre). A empresa que é sinônimo -- junto com a eterna rival Visa -- de cartão de crédito tem investido fortemente em tecnologia e dados para ampliar as soluções para os parceiros.

Paro Neto falou sobre a chegada do Pix e do open banking e de impactos da interoperabilidade no segmento de meios de pagamento e transferências. Veja abaixo a entrevista de João Pedro Paro Neto à EXAME Invest:

A Mastercard acertou parcerias recentes de exclusividade com instituições como o C6 Bank e o BTG Pactual. Qual a estratégia por trás dos acordos?

Essas parcerias sempre existiram, mas há uma mudança. A tendência é que todo mundo com uma boa base de clientes tente criar uma oferta de soluções e produtos mais robusta e integrada, juntando parceiros. É difícil que alguma instituição diga "vou fazer só banking". A instituição se torna um marketplace financeiro e de outros segmentos. O banco ou a corretora focado só no negócio dele não é suficiente para o tamanho e a expressão que gostariam de ter. Daí vem a decisão de fazer a expansão. A proposta de valor futuro é semelhante.

Vamos olhar o exemplo do próprio C6: quantos parceiros já não foram colocados dentro da loja deles, a Carbon Store? Dezenas.

Qual o impacto para os clientes?

Para o cliente, isso significa ter uma série de produtos e soluções disponíveis para escolher o que é melhor para ele. Antes, o cliente tinha que ir até uma agência física e estava limitado aos produtos do banco. O cliente percebeu que a presença física não é mais necessária. É uma mudança que nós incorporamos. E os nossos parceiros, que são as empresas, os emissores, os bancos, as asset management,  também querem incorporar mais produtos e soluções para se tornar mais robusto na relação com os clientes.

Como ficam as empresas não financeiras?

O outro lado da tendência são as empresas de varejo, que antes faziam os cartões co-branded: o Pão de Açúcar com o Itaú e assim vai. Pouco a pouco, essas empresas passaram a cultivar uma relação com os clientes, até que eles se tornaram os 'donos' do cliente. Criaram o aplicativo, o seu programa de vendas, o marketplace. É só perceber o que o Magazine Luiza se tornou hoje. É a história do one stop shop.

Até a indústria pegou esse caminho. Tem o exemplo do programa de relacionamento Juntos Somos Mais, que reúne Tigre, Votorantim e outras grandes empresas do setor de materiais de construção, que decidiram se juntar. Já estão presentes mais de 60 mil comércios e o programa está se expandindo.

Você, como cliente, vai escolher dois ou três desses relacionamentos com múltiplos serviços que te atendam da melhor maneira possível. Muda radicalmente a forma como as empresas fazem negócios com os seus clientes.

Se todos adotam esse modelo, quais serão os diferenciais na disputa pelo cliente?

Quem conseguir oferecer a experiência mais invisível possível vai se dar melhor. Tudo que for mais fácil, mais simples, mais prático, mais eficiente vai ganhar o jogo. Vou dar mais um exemplo. Você, cliente, entrou na C&C. E a rede sabe que você é cliente do C6, para ficarmos só na letra C. Ele vai te fazer uma proposta: vou oferecer um desconto na seção de tintas, por exemplo. As empresas vão querer encantar o cliente.

Outro ponto do qual falamos muito na Mastercard: no futuro, os pagamentos serão feitos de qualquer maneira, com a combinação que o cliente quiser usar. Pode ser o cartão de crédito, de débito, os pontos do programa de relacionamento, inúmeras formas. O consumidor terá tudo à sua frente à disposição a cada momento.

Todo mundo pensa que o maior site de buscas é o Google. Mas existem muitos outros que estão invisíveis: as pessoas fazem buscas em diferentes sites, de bancos, de empresas de e-commerce, sem se dar conta de quem é a engenharia por trás. E aí entra a importância dos dados, que é uma frente em que a Mastercard tem investido muito. Não são apenas os dados da Mastercard, mas os meus e os dos meus parceiros. E essa combinação vai nos fazer muito mais eficientes.

De que maneira?

A Mastercard está fazendo o movimento de adquirir empresas que saibam usar dados. Compramos no exterior uma empresa, a Truata, que permite -- no modelo open banking -- usar os dados dos usuários de acordo com cada legislação, sem o impacto das restrições da lei. A empresa que quiser ganhar o jogo precisa saber usar bem. São investimentos com retorno garantido.

E tem a estratégia do multi-rail: não importa como o cliente vai pagar, nós queremos oferecer a solução. A empresa que é nossa parceira não pode contar com esta ou aquela solução e não dispor de outras, senão ela vai procurar quem entrega tudo. A Mastercard abraçou a agenda de abrir todas as plataformas: são 220 no mundo de cartão e 39 no de transferências instantâneas.

E a beleza disso é a interoperabilidade, como fazer tudo isso dialogar. É o que está em discussão no Banco Central. Vai permitir chegar a um mercado competitivo, totalmente aberto, com todas as opções disponíveis e a segurança necessária.

Como essa inteligência de dados se traduz para o consumidor?

Eu tenho o dado da transação, mas não das pessoas. Eu não sei que o cartão com numeração '123' é do Marcelo. Eu sei que esse cartão foi utilizado para compra em dado lugar, o horário, qual o valor. Eu tenho as informações numéricas da transação e daí consigo encontrar as lógicas por trás.

Quando eu pego os meus números e junto com os dados do banco parceiro, que tem as informações do cliente, eu consigo gerar mais qualidade nessa análise e ser mais eficiente. E assim vamos incorporando.

Antes da transação: vamos supor que eu trabalhe para que um banco parceiro tenha mais clientes. Nós teremos condições de dizer se uma oferta tem mais a ver com o padrão do cliente, se será mais sensível a ela. As ferramentas permitem apontar se uma campanha tem chances de atingir os objetivos ou não.

Durante a transação, nós utilizamos as informações para "escoragem" (avaliação do risco de crédito), evitar fraudes e aprovar com maior rapidez as operações. E, depois da transação, para que o consumidor possa voltar a consumir. Há muitas ferramentas para trazer o cliente de volta: os programas de fidelidade, cashback e por aí vai.

E como fica a concorrência para a Mastercard nesse novo ambiente?

Há uma mudança na forma: é um mundo com muitas possibilidades a mais de oferta, dentro do mesmo conceito. Você não vai conseguir encontrar em um só lugar tudo o que você quer. O desafio será oferecer o maior número de soluções de forma eficiente. Sobre o nosso negócio, 50% do consumo dos brasileiros se dá por meio de pagamento eletrônico. Ou seja, tem outros 50% para avançar. Todas as ferramentas que estão sendo comentadas, como o Pix, são bem-vindas para ajudar nesse processo. A definição sobre que empresa vai dominar o negócio vai depender do que falamos, da experiência oferecida ao cliente.

O Pix acaba de entrar em operação e em breve chega o open banking. Quais serão os impactos para as pessoas?

Primeiro, sobre o open banking: ele funciona hoje de maneira reduzida, mas já está disponível no país há algum tempo. Lá na frente, o cliente poderá se beneficiar ao pedir, por exemplo, um financiamento imobiliário. Ele poderá pesquisar em cinco instituições financeiras fornecendo as suas mesmas informações para todas. Isso já acontece de alguma forma, mas será algo muito mais eficiente. O cliente será mais dono das suas escolhas.

No mundo das transferências e da interoperabilidade, há um problema mais sério, que é o da segurança. Cada arranjo de pagamento tem uma regra e uma forma. Quando você mistura os arranjos para que se comuniquem, a questão fica mais complicada. É preciso que haja alguns critérios e essa definição leva tempo, vai demorar alguns anos. No mundo, nenhum país conseguiu ainda chegar a esse estágio em que tudo se comunica.

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Quando esse momento chegar, nós imaginamos que o cliente terá, por exemplo, dez opções de pagamento quando chegar a uma loja ou restaurante, no dispositivo que escolher: um aplicativo, na pulseira, como preferir. Nesse contexto, entendemos que uma de nossas soluções, que é o cartão por aproximação, é difícil de ser superada. Você chega em qualquer lugar, aproxima o cartão e pronto, já pode ir embora.

O que for melhor, mais fácil e mais conveniente é o que terá melhores condições de ganhar. Depende de cada situação. Outro exemplo: o motociclista na estrada passando pelo pedágio. Ele não vai querer tirar o celular ou a carteira para pagar. Nesse caso, pagar por aproximação com uma pulseira ou um relógio será mais prático. A interoperabilidade vai permitir esse tipo de competição.

Em meio a tantas novidades, o que mais chama a sua atenção no segmento de pagamentos?

Nós temos trabalhado mais no B2B, o mundo corporativo de pagamentos, em que nossa participação é irrelevante. Estamos fazendo grandes investimentos porque entendemos que esse mercado é muito fragmentado. Quando conversamos com as empresas e escutamos como são os processos, vemos que as necessidades são enormes.

O mercado em que estamos inseridos, de pagamento e consumo das famílias -- vou arredondar os números --, é de 50 trilhões de dólares ao ano no mundo. O outro mercado é de 250 trilhões de dólares. É uma oportunidade gigantesca e vemos que há possibilidade de oferecermos diferenciais.

E outra fronteira é a de governos. Por que não podemos pagar imposto com cartão? Mas isso começa a evoluir: algumas cidades já estão aceitando e o governo federal está criando a sua própria plataforma. É um caminho longo e o ponto de chegada é permitir, de novo, que o consumidor possa decidir como quer pagar da forma como achar melhor.

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