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Black Friday tem melhor ano desde 2021,mas pode ter drenado vendas do Natal

Entre quinta e domingo, a data movimentou R$ 10,1 bilhões, mas a antecipação de compras levanta dúvidas sobre o risco de dezembro ter sido canibalizado

Especialistas apontam que a combinação de campanhas intensas do e-commerce ao longo de novembro e a antecipação de compras pode deslocar parte do consumo tradicionalmente concentrado em dezembro (Leandro Fonseca/Exame)

Especialistas apontam que a combinação de campanhas intensas do e-commerce ao longo de novembro e a antecipação de compras pode deslocar parte do consumo tradicionalmente concentrado em dezembro (Leandro Fonseca/Exame)

Publicado em 1 de dezembro de 2025 às 16h20.

A Black Friday de 2025 começou quente, mas perdeu fôlego exatamente na sexta-feira, 28, data oficial do evento. Apesar disso, o conjunto da semana, e especialmente do mês, manteve ritmo forte.

Os novos dados da Confi Neotrust, que monitora transações reais de 80 milhões de consumidores em sete mil lojas online, indicam que o comércio online movimentou R$ 47 bilhões em novembro, alta de 26,1% ante 2024, marcando um resultado histórico para o mês.

A estratégia de alongar promoções também funcionou. O faturamento acumulado até 23 de novembro cresceu 33,4%, com o dia 11.11 saltando 105%. Essa aceleração inicial levantou dúvidas sobre uma possível antecipação de demanda, percepção que, de certa forma, acabou se confirmando, com uma desaceleração na própria semana da Black Friday.

Entre quinta, 27, e domingo, 30, a Black Friday faturou R$ 10,1 bilhões neste ano. Esse é o maior volume da data desde 2021, quando o rendimento foi de R$ 9,91 bilhões. Mas o total ficou abaixo do piso das projeções da empresa, que iam de R$ 10,7 bilhões a R$ 11,4 bilhões.

Segundo Léo Homrich Bicalho, head de negócios da Neotrust, o desempenho foi impulsionado pela disputa intensa entre grandes marketplaces e pelo uso agressivo de cupons.

Mas o balanço final também antecipa uma preocupação que começa a aparecer nos relatórios do mercado financeiro: a possibilidade de canibalização das vendas de Natal, conforme avaliou a XP Investimentos.

Risco de canibalização do Natal é real

A XP aponta que a combinação de campanhas intensas do e-commerce ao longo de novembro e a antecipação de compras pode deslocar parte do consumo tradicionalmente concentrado em dezembro.

O relatório da instituição, divulgado na semana passada, na véspera da data promocional, menciona o dado de uma pesquisa do Mercado Pago que apontava que 47% dos consumidores pretendiam antecipar presentes de Natal na data. Enquanto 38% tomariam a decisão de acordo com as oportunidades oferecidas.

A própria XP lembrou que esse efeito já apareceu no ano passado e tendência era se intensificar em 2025.

O risco de esvaziamento do Natal não é consenso entre os especialistas em varejo, mas já aparece com força na análise de parte do setor. Para Marcelo Prado, consultor e diretor do Inteligência de Mercado (Iemi), a Black Friday tem funcionado como um "alívio" para um consumidor pressionado e, por isso mesmo, pode acabar drenando demanda da principal data do ano.

Nessas condições, dezembro tende a perder intensidade em algumas categorias, principalmente em bens duráveis e semiduráveis, justamente os mais sensíveis a preço.

"Sem dúvida, este ano, a Black Friday está sendo uma oportunidade importante para os consumidores adquirirem o que realmente estão precisando por um preço menor, num cenário desfavorável ao consumo. Entendemos que teremos bons números para este ano, mas não grandes recordes de vendas para as datas de final de ano", diz Prado.

Marcos Gouvêa de Souza, fundador e diretor-geral da Gouvêa Ecosystem, empresa de consultoria para varejo fundada em 1989, concorda que o consumidor está muito mais racional, mas vê o fenômeno dentro de uma mudança estrutural do varejo e não apenas como reflexo da Black Friday.

Souza aponta que o setor convive com fatores que comprimem o consumo ao longo de 2025, como inadimplência elevada, endividamento persistente e até desvio de renda para apostas online.

“Temos desemprego baixo e massa salarial maior, mas o varejo mostra um desempenho pífio. O consumidor está hiper racional, mais focado em preço e comparação. Isso altera o ritmo das datas sazonais", afirma.

De acordo com a mais recente Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) do IBGE, a embora as vendas do varejo tenham tido variação positiva de 0,8% em setembro ante 2024, o acumulado em 12 meses é de apenas 2,1%, a menor taxa desde janeiro de 2024.

O lado 'bom e ruim' da antecipação do Natal

No curto prazo, porém, o setor busca se equilibrar entre duas datas comerciais em sequência. O 12 de dezembro, mais conhecido como 12.12, voltado a cupons, e o próprio Natal, essa última data já longe da relevância que tinha no passado para o comércio.

"Nossos indicadores mostram uma canibalização clara para algumas linhas do varejo, como eletrônicos, mobiliários, decorativos, artigos para casa e outros", afirma o consultor do Iemi.

"Para linhas de produto de uso pessoal, como roupas, calçados e cosméticos, essa canibalização ainda não ocorre, ainda que parte das vendas desses produtos ocorra em novembro, as vendas de dezembro, estimulado pelos presentes de Natal, ainda são muito maiores do que é gerado na Black Friday",

A antecipação das compras tem um "lado bom e um lado ruim" para o varejo, como destacou o diretor da Gouvêa Ecosystem.

O lado positivo é que ela ajuda a desconcentrar o pico histórico de demanda do Natal, reduzindo a pressão sobre estoques, logística e operações em dezembro. Ao espalhar as vendas por mais dias e semanas, o setor trabalha com mais eficiência e menor risco operacional.

Já o lado negativo é que esse movimento aumenta a fatia de compras feitas com descontos, reduzindo o peso das vendas a preço cheio no período natalino, justamente quando o varejo costuma obter suas margens mais altas. Esse movimento pressiona rentabilidade e pode esvaziar parte da força comercial do Natal, ainda que seja positiva para o bolso do consumidor.

E-commerce deve faturar R$ 26,82 bi no Natal

Ainda assim, o clima está longe de ser negativo. A Associação Brasileira de Inteligência Artificial e E-commerce (Abiacom) projeta um Natal forte no e-commerce, de acordo com dados divulgados com exclusividade à EXAME. O setor deve faturar R$ 26,82 bilhões em 2025, alta de 14,95%.

A estimativa inclui as vendas desde a semana da Black Friday até o dia 25 de dezembro. O número de pedidos deve chegar a 38,28 milhões, com ticket médio de R$ 700,70.

A associação, porém, interpreta o cenário de forma distinta do mercado financeiro. Para o presidente da Abiacom, Fernando Mansano, o surgimento de novas datas promocionais é bem-vindo e não representa canibalização, mas sim estímulo contínuo às vendas e oportunidade de renovação de estoque e fortalecimento de capital de giro.

"O Natal continua sendo o ápice do e-commerce brasileiro, momento em que permeia um sentimento positivo nas pessoas e o simbolismo de presentear amigos e familiares, além de se auto presentear. O que podemos observar nos próximos anos é a diluição de parte das vendas da véspera de Natal para a Black Friday, com o objetivo de antecipar os presentes de Natal”, afirmou Mansano.

O presidente da associação pondera, contudo, que essa antecipação muda a forma como o lojista deve se preparar e reforça o papel das estratégias omnicanal.

Bicalho, da Neotrust, acrescenta ainda que, no e-commerce, o Natal historicamente tem menor relevância do que a Black Friday, por não estimular o consumidor a comprar itens de alto tíquete como eletrônicos e eletrodomésticos. “O Natal tende a ser a data mais relevante em vendas, com alto consumo de produtos de supermercado (FMCG) e presentes”, conclui.

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