Meta vs Microsoft: empresas divergem sobre metaverso e inteligência artificial
Gigantes da tecnologia adotaram estratégias diferentes em apostas sobre negócios do futuro
João Pedro Malar
Publicado em 6 de fevereiro de 2023 às 16h38.
Acertar uma aposta de qual será a próxima grande tecnologia do futuro pode representar a diferença entre ganhos astronômicos e perdas na casa dos bilhões. E duas gigantes do setor têm mostrado visões divergentes nesse quesito. De um lado está a Microsoft, pioneira na área de softwares, e do outro a Meta, uma das maiores empresas de redes sociais do mundo.
Recentemente, a companhia fundada por Bill Gates anunciou um novo investimento de US$ 10 bilhões na OpenIA, empresa responsável por desenvolver a inteligência artificial do momento: o ChatGPT. A ferramenta já tem sido incorporada em alguns serviços da Microsoft, como a plataforma Teams, em um processo que deve continuar nos próximos meses.
Do outro lado, a empresa de Mark Zuckerberg tem investido bilhões de dólares em pesquisa e desenvolvimento de aplicações para o metaverso. A aposta nessa área, que promete mudar a forma como as interações sociais ocorrem, ganhou tanta força que acabou sendo incorporada no novo nome da dona do Facebook, Instagram e WhatsApp.
Isso não significa que a Microsoft não invista no metaverso, e a Meta em inteligências artificiais, mas os movimentos recentes mostram que o foco dessas gigantes de tecnologia não é o mesmo, de acordo com avaliações de especialistas para a EXAME.
Apostas no futuro
Por trás das decisões das duas empresas, está o mesmo objetivo: acertar qual será a tecnologia mais importante para o dia a dia das pessoas e empresas nos próximos anos, e portanto a mais lucrativa. Somam-se a isso outros fatores importantes, como casos de uso e o investimento necessário para viabilizar essas ferramentas.
Junior Borneli, fundador da StartSe, lembra que tanto a Meta quanto a Microsoft investiram em inteligência artificial nos últimos dez anos, mas com destinos diferentes. “O metaverso é uma tecnologia baseada em realidade virtual, aumentada, mas que usa também usa inteligência artificial para que funcione, as pessoas se conectem, tenham boas experiencias, recomendações. A aposta é que as pessoas vão se relacionar em outro ambiente, essa nova realidade, é uma outra aplicabilidade”.
“Já a Microsoft é a maior empresa de produtividade do mundo, tem diversos recursos para isso, criando um pacote de produtividade. Ela já olha mais para a inteligência artificial com esse foco, de como tornar as pessoas que utilizam essa ferramenta mais produtivas. A ideia é aplicar IA nisso, criar modelos, o que daria um ganho de eficiência muito maior”, destaca.
Na visão dele, a Microsoft tem sido bem-sucedida nesse esforço, até por ser a big tech com receita melhor distribuída, sem depender excessivamente de um produto ou área como fonte de receita. É um caso diferente do da Meta, que tem mais de 95% da sua receita dependente de publicidade.
“A Microsoft sempre escolheu um caminho para ter receita de várias áreas, onde pudesse explorar caminhos diferentes. Mesmo com investimento gigantesco, ela não se transforma em uma empresa de inteligência artificial, ela integra no seu ecossistema. É uma empresa que congrega, ao invés de ser empresa de algo”, avalia.
Para Borneli, a vantagem da inteligência artificial é a capacidade de oferecer serviços mais adequados aos clientes e com mais eficiência, demandando menos custos e pessoal. Por outro lado, o metaverso tem sido um “grande consumidor de caixa”, demandando muito investimento com pouco resultado. É um cenário diferente do da Microsoft, já que uma IA traz “resultados muito rápidos”.
“A Meta reduziu investimentos em metaverso ao perceber que o equilíbrio entre receita e investimentos e custo estava ficando ruim”, pondera. Mesmo assim, a empresa entrou de cabeça nessa área, algo sinalizado até pela sua mudança de nome. Até o momento, porém, esse movimento não rendeu tanto quanto o mercado esperava, com a divisão da empresa para metaverso acumulando um prejuízo bilionário.
O fundador da StartSe lembra que todas as empresas de tecnologia tiveram queda na receita em 2022 devido ao cenário macroeconômico ruim, mas a Meta foi a que teve o maior prejuízo. “Quando olha para o resultado, é uma diferença significativa. Da Meta, a tendência é de queda, e da Microsoft é estável, então ela não precisa cortar investimentos, e deve continuar com eles”.
Marcell Almeida, CEO da PM3, observa ainda que os investimentos em inteligência artificial da Meta são menos visíveis que os da Microsoft, e o foco em metaverso tem gerado uma insatisfação do mercado por ser “uma tecnologia que falta muito para dar certo, e faltar adoção das pessoas também. É quase intangível para o momento, por mais que achem que vai ser o futuro”.
“A Meta fez isso de vincular para mostrar que não são só o Facebook, estavam sentindo o peso dessa associação, de não serem lembrados como um conglomerado. A escolha do metaverso por outro lado, acho que foi um pouco agressivo e rápido demais. Parece que trocaram um problema por outro, vão ficar lembrados como a empresa do metaverso, se der certo ou não”, diz.
Almeida também acredita que nada impede que a própria Microsoft invista mais em metaverso no futuro, e o seu foco em apresentar soluções para empresas pode colocá-la na dianteira em relação à Meta, que tem foco nos consumidores finais: “se for algo que as empresas começam a usar, aí sim cria a necessidade de comprar itens e tecnologias do metaverso, que começa a se desenvolver. Acho que Meta errou na abordagem, com foco em entrenimento, social, e não é a hora”.
Ele afirma ainda que o mercado poderia ter “mais paciência” com a demora da Meta em entregar resultados em outros tempos, mas não agora. O próprio papel de Zuckerberg como CEO do conglomerado já vinha sendo questionado, e Almeida espera que a empresa ainda enfrente “uma pressão forte por resultados, e no curto prazo o metaverso não vai trazer isso”.
Do outro lado, a Microsoft deverá “ver retornos logo” do seu investimento em inteligência artificial, e ele espera que a companhia intensifique ainda mais seus investimentos na área nos próximos meses, independentemente do quadro econômico.
Qual será a vencedora?
Almeida acredita que a aposta da Microsoft em inteligência artificial é “muito mais certeira e de curto e médio prazo” que a da Meta no metaverso. “IA já é algo que falamos há muitos anos, e ainda mais agora nos últimos meses que estamos vendo em um nível até um pouco assustador em termos de qualidade e velocidade”.
O movimento, destaca ele, é ainda mais acertado por fazer parte do esforço da empresa em diversificar o seu portfólio, retirando a dependência de produtos como o Windows e o Office, o que ajudou a reduzir os riscos de investir na empresa e também a manter uma dominância nas áreas em que atua.
Para ele, a Meta “está com um problema na mão”: ”O Facebook já não cresce em vários países, Instagram está com problemas de retenção e tem os concorrentes como TikTok, e o Whatsapp tem uma dificuldade grande de monetizar. Eles têm pouca diversificação. Com o metaverso, eles querem dominar o nicho, mas não acho impossível que eles mudem de foco e invistam em outra área. Depende do quanto de pressão eles vão conseguir aguentar”.
Borneli, da StartSe, destaca que a Microsoft tem indicado ter um “plano muito consistente” e acelerou seus investimentos em inteligência artificial, o que passa a sensação de que “sabe qual é a direção correta, tem convicção nisso e vai continuar, mesmo com ajuste”. Já a Meta “passa por um vale de desconfiança”.
“É sempre arriscado comparar, mas olhando hoje, o que ajuda a ter uma resposta mais certa é: você consegue imaginar um futuro sem IA? É difícil imaginar isso. Agora, você consegue imaginar trocar relações pessoais pelo metaverso? É mais difícil”, questiona.
Ele acredita que a Microsoft está na direção certa, e que as pessoas serão cada vez mais impactadas por inteligências artificiais, que chegam agora na área de aplicações práticas do dia a dia. Por isso, Borneli vê a gigante de tecnologia com uma “estratégia mais clara”.
“A Meta fez uma aposta de tudo ou nada, vendo os problemas nas redes sociais. É um novo caminho, mas parece que colocou todas as fichas, mudando nome, sigla na bolsa, então é algo mais arriscado. No momento não parecem ser apostas que se mostraram acertadas”, diz.
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