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Em 2022, o fundador Yvon Chouinard anunciou a "Terra como única acionista" da empresa (Campbell Brewer/Divulgação)
Repórter de ESG
Publicado em 19 de dezembro de 2025 às 06h00.
"Há três anos, fizemos da Terra nossa única acionista. Desde então, prestar contas a ela não tem sido fácil", admitiu Willem Swager, Diretor de Finanças e Operações da Patagonia, em publicação de celebração à divulgação do primeiro relatório de impacto da marca de roupas esportivas fundada em 1973 e guiada pelo propósito da sustentabilidade há mais de cinco décadas.
O documento avalia o desempenho da empresa entre 1 de maio de 2024 e 30 de abril de 2025 em áreas como produtos, envolvimento comunitário e ecossistema de doações. E não esconde os tropeços: é uma mistura entre boletim escolar e carta aberta, detalhando "a verdade sobre nossos erros, nossos avanços e todos os desafios persistentes que ainda temos pela frente", destacou o diretor.
Para compreender o peso desta prestação de contas, é preciso voltar a setembro de 2022. Foi quando Yvon Chouinard, fundador e bilionário, decidiu doar a empresa avaliada em US$ 3 bilhões (cerca de R$ 15,5 bilhões) para lutar contra a crise climática.
O modelo criado transferiu 98% das ações sem direito a voto para o Holdfast Collective, organização que recebe os lucros excedentes da marca para financiar iniciativas ambientais, comunitárias e políticas. Os restantes 2% ficaram nas mãos do Patagonia Purpose Trust, que detém o controlo da empresa e tem como responsabilidade "maximizar os esforços para salvar o planeta".
Desde então, já foram distribuídos 180 milhões de dólares (cerca de 154,5 milhões de euros) para causas socioambientais. "Existimos para salvar nosso planeta. Isso não é apenas uma declaração de propósito — faz parte de nossa carta constitutiva e está intrinsecamente ligado à forma como a Patagonia é propriedade e administrada", se posicionou a empresa.
O relatório traz números que demonstram avanços concretos. A eliminação total dos PFAS, os chamados "químicos eternos", de todas as novas linhas de produtos é apresentada como uma "grande conquista".
No âmbito dos materiais, a Patagonia atingiu 84,1% de materiais de origem responsável, um crescimento de 0,9 pontos percentuais em relação a 2024. A maioria do poliéster e poliamida utilizados são reciclados, 96,6% e 89,5%, respetivamente. Além disso, todo o algodão, cânhamo e lã têm origem orgânica, reciclada, regenerativa ou segue padrões certificados.
Outro destaque vai para a parceria com o United Repair Centre, uma empresa social sediada em Amesterdã, na Holanda, formada principalmente por refugiados. Graças a esta colaboração, 14 mil peças de roupa foram reparadas no ano passado em vez de descartadas. Mais de 95% das peças da Patagonia resultam de produtoras com certificação Fair Trade, selo que garante uma produção sustentável dentro de práticas sociais, econômicas e ambientais.
"Estamos longe de ser perfeitos. Sou o primeiro a admitir isso", reconheceu Swager com franqueza, ao admitir os desafios ao longo do caminho.
A meta de obter 50% dos materiais sintéticos provenientes de "resíduos secundários" — como resíduos têxteis ou de redes de pesca — se mostrou "muito difícil de escalar", chegando a marca de apenas 6%. Já o objetivo de 100% de materiais sustentáveis permanece distante, com 16% ainda por conquistar.
E há um desafio particularmente sensível: garantir salários dignos aos trabalhadores de todas as fábricas parceiras. Atualmente, apenas 39% das unidades atingem esse nível.
"Veja nosso trabalho em torno de reparo, reutilização e circularidade. Sabemos que são vitais. Alcançar emissões líquidas zero até 2040 não será possível sem eles", explicou o diretor. "Mas encontrar soluções viáveis de fim de vida útil para muitos de nossos produtos é algo que ainda não resolvemos", acrescentou.
A empresa também redefiniu seus compromissos climáticos e abandonou a promessa de neutralidade de carbono ao considerá-la como uma "enganação". O novo objetivo é mais ousado: zerar emissões líquidas até 2040, uma década antes do prazo estabelecido nos padrões internacionais.
O relatório também aponta a necessidade de cortar cerca de 10% das emissões atuais, o que demandará investimentos significativos em fornecedores e novas tecnologias.
O caminho, porém, não tem sido linear. Os gases emitidos pela marca subiram 2% no último ano, impulsionadas principalmente pelo crescimento de linhas de produtos mais intensivas em carbono, indo na contramão da sua visão de que o "crescimento ilimitado" não é compatível com a preservação ambiental.
O maior gargalo está nas chamadas emissões do escopo 3 — aquelas geradas ao longo de toda a cadeia de produção e que representam impressionantes 99% do total. Destas, 86% vêm diretamente da fabricação têxtil, evidenciando onde a "batalha climática" será realmente travada.
No ano fiscal de 2025, a Patagonia registou receitas de 1,47 mil milhões de dólares, com 61% das vendas somente nos EUA. Em um ano marcado por reestruturações internas e pressões externas, a empresa reconhece as tensões entre o propósito e a viabilidade financeira, mas afirma que "não irá abdicar do caminho assumido".
A coerência entre missão e prática tem sido testada: em 2023, a empresa registrou a primeira queda de vendas da sua história, respondendo um ano depois com demissões corporativas e cortes em benefícios. Para analistas, as medidas contrastam com a imagem de "paraíso do trabalho" cultivada durante décadas.
A transparência do relatório não é acidental: a Patagonia assume que transformar negócios em movimento ambiental é um trabalho coletivo. "Soluções de negócios fora do comum como reparo e reutilização só alcançarão escala se colaborarmos com outros", frisa a publicação.
E o diretor termina o anúncio com um convite aberto: "Se você tiver algumas ideias sobre como poderíamos trabalhar juntos, definitivamente me mande uma mensagem. Como eu disse, ser um negócio responsável é muito um trabalho em andamento. Então, quaisquer ideias inteligentes ou oportunidades de cooperação são bem-vindas: estou de ouvidos abertos", concluiu.
Três anos depois de colocar a Terra literalmente "no comando", a marca prova levar a sério essa missão: mesmo que a "chefe seja exigente" e o caminho, repleto de obstáculos.