Oceanos mais quentes levantam dúvida: subestimamos as mudanças climáticas?
Temperaturas mais altas ameaçam a vida marinha, aumentam o volume da água e a umidade na atmosfera, provocando condições meteorológicas extremas, como ventos e chuvas fortes
Agência de notícias
Publicado em 12 de abril de 2024 às 15h09.
Última atualização em 12 de abril de 2024 às 16h19.
O vertiginoso aumento da temperatura dosoceanos disparou o alerta entre especialistas, que tentam seguir o ritmo em suas pesquisas sobre um fenômeno que não dá tréguas e cujas consequências vão além do mar.
"Estas mudanças são tão rápidas que não somos capazes de acompanhar o ritmo de seu impacto e isso gera muita incerteza", reconheceu Vidar Helgesen, secretário-executivo da Comissão Oceanográfica Intergovernamental da Unesco, que considera que "ocupar-se do aquecimento dos oceanos é urgente".
"Isto exige um esforço maior para observar e investigar em tempo real e uma colaboração mais estreita entre a ciência e a elaboração de políticas", explicou à AFP, durante a Conferência da Década do Oceano que termina nesta sexta-feira, 12, em Barcelona, após reunir 1.500 cientistas internacionais, representantes políticos e de organizações desde quarta-feira, 10.
A temperatura dos oceanos, que cobrem 70% do planeta, estabeleceu um novo recorde em março, com média de 21,07°C na superfície, excluindo as zonas próximas aos polos, segundo o observatório Copernicus .
Oceanos mais quentes ameaçam a vida marinha, aumentam o volume da água e a umidade na atmosfera, provocando condições meteorológicas extremas, como ventos e chuvas fortes.
Além do mar
Os oceanos, vítimas e escudos da crise climática, contribuem para que a superfície da Terra seja habitável, absorvendo 90% do excesso de calor causado por emissões de carbono, fruto da atividade humana, desde a era industrial; e parte do CO2. Além disso, geram cerca da metade do oxigênio que respiramos.
"O oceano tem muito mais capacidade térmica do que a atmosfera, absorve muito mais calor, mas não pode absorver até o infinito", alertou Cristina González Haro, pesquisadora do Instituto de Ciências do Mar de Barcelona, que reconhece que os cientistas não sabem ao certo as causas deste aumento, que também pode influenciar fenômenos como o El Niño.
Um dos objetivos da Década do Oceano (2021-2030) é ampliar o conhecimento sobre o aquecimento e decifrar suas múltiplas implicações para contê-lo.
"Há muito o que não sabemos sobre os oceanos. Mapeamos apenas cerca de 25% dofundo dos oceanos do mundo e, ao mesmo tempo, temos de mapear e monitorar ao vivo as alterações que ocorrerem devido à mudança climática", observou Helgesen.
Segundo a Organização Meteorológica Mundial ( OMM ), agência da ONU, mais de 90% dos oceanos experimentaram ondas de calor no ano passado, enquanto a temperatura da água na superfície não para de aumentar.
"Estamos em uma trajetória que nos leva a perguntar aos cientistas se não subestimamos a mudança climática que virá", disse Jean-Pierre Gattuso, especialista do Centro Nacional de Pesquisas Científicas (CNRS) da França.
Com uma incidência direta sobre o clima e os ecossistemas, os efeitos deste fenômeno são sentidos em todo o planeta, até mesmo longe do mar.
Tudo conta
Porém, as dificuldades para a implementação das decisões internacionais, como o Acordo de Paris alcançado em 2015 para tentar limitar o aquecimento global, não convidam ao otimismo.
"Muitos pesquisadores ficam frustrados porque, apesar destas comprovações científicas da mudança climática e suas consequências em vários níveis, a implementação do Acordo de Paris é muito lenta", lamentou Gattuso.
Há, no entanto, sinais de esperança, como a aprovação em 2023, após 15 anos de negociações, de um tratado histórico dos Estados-membros da ONU para proteger o alto-mar, ou os diálogos em curso para alcançar um consenso internacional sobre a poluição por plásticos.
"Cada décimo de grau conta, como cada ano conta. Nunca é tarde demais", lembrou Gattuso.