Economia

A Grécia pode ser a nova Argentina?

Argentina fechou bancos, deu o calote e desvalorizou sua moeda. O que veio em seguida foi um boom econômico. Por que a Grécia não faz o mesmo?

Bandeira da Grécia misturada com a da Argentina (Rodrigo Sanches/EXAME.com)

Bandeira da Grécia misturada com a da Argentina (Rodrigo Sanches/EXAME.com)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 7 de julho de 2015 às 16h36.

São Paulo – 14 anos antes da Grécia, uma crise parecida estourava do outro lado do mundo, em mais um país pouco competitivo que havia gastado além do que podia.

No dia 1º de dezembro de 2001, endividada e recessiva, a Argentina congelou as contas bancárias para evitar que uma retirada em massa de recursos colocasse o sistema financeiro em colapso.

Ministros e presidentes subiram e caíram, e neste ínterim o país deu o calote e abandonou uma década de paridade do peso com o dólar.

No curto prazo, o ajuste foi duro, com o desemprego indo a 20% e a pobreza superando 50%. Mas a dívida foi reestruturada e a economia ressurgiu forte das cinzas: entre 2003 e 2007, o PIB cresceu a uma média anual de 8,68%.

“Os pilares do milagre argentino até 2008 foram dois: superávit fiscal (pelo alívio da dívida) e superávit comercial (desvalorização do peso e competitividade dos produtos exportados)”, diz Matias Togni, analista da consultoria Euromonitor.

O que leva à pergunta: por que a Grécia que rejeitou um novo pacote não dá logo o calote, sai do euro e aproveita pelo menos os benefícios de um respiro fiscal e de uma moeda fraca? 

Semelhanças e diferenças

De fato, estar na moeda comum prejudica a Grécia em alguns sentidos. O câmbio é um elemento importante de ajuste na crise: moeda mais fraca significa produtos mais competitivos e incentivo ao turismo internacional. É o que está acontecendo atualmente no Brasil.

No entanto, os economistas concordam que a desvalorização não foi uma bala de prata na Argentina e não o seria na Grécia.

“Há uma concordância geral que os benefícios seriam mais fracos. A Grécia exporta menos que a Argentina, e o processo não aconteceria em um cenário de forte crescimento global, como da Argentina pós-2001”, diz Barry Eichengreen, economista da Universidade da Califórnia.

A Argentina foi uma grande beneficiada, assim como o Brasil, do ciclo de alta dos preços das commodities: entre junho de 2003 e junho de 2008, o preço dos seus principais produtos de exportação (soja e milho) mais do que dobrou.

Além disso, a relação dívida/PIB da Argentina era três vezes menor que a da Grécia, e ela pôde contar com a injeção dos recursos do setor privado que se multiplicaram na conversão para o peso:

“A recuperação argentina aconteceu em larga medida pela diluição da dívida no setor corporativo e pelo efeito renda positivo de poupadores dolarizados da classe alta, que turbinaram o investimento", diz Eduardo Levy-Yeyati, que já foi economista chefe do Banco Central argentino e atualmente é professor-visitante em Harvard.

Isso sem falar que desvalorizar uma moeda já existente é muito mais simples do que retomar uma moeda do passado ou criar uma nova -um desafio logístico de meses, na melhor das hipóteses.

Blocos

O cenário em que os países estão inseridos também é bem diferente: o Mercosul empalidece diante do tamanho e do nível de integração de uma União Europeia. 

“A economia grega está desde 1981 ajustando sua estrutura ao mercado comum. [Sair do euro] é como dizer para um médico de 50 anos mudar de profissão e se tornar um advogado”, diz o economista grego Theodore Pelagidis em entrevista para EXAME.com.

Outra voz que rejeita a comparação é a de Domingo Cavallo, ministro da Economia da Argentina que estabeleceu o corralito. Na semana passada, ele disse que “abandonar o euro seria o pior tipo de calote para a Grécia”.

Além do mais, os últimos anos (e muitos erros de política econômica) mostraram que a Argentina não é exemplo para nada. A reestruturação da dívida em 2005 voltou como um fantasma: uma minoria de credores que não aceitou os termos entrou na Justiça americana e levou o país a um novo calote técnico no ano passado.

Em 2015, a Argentina deve registrar recessão de 0,3% e inflação próxima dos 30%. Quanto a Grécia, não há solução sustentável no horizonte:

"O problema é de indisciplina fiscal. Não há uma cultura de pagar impostos e todo o déficit se financia com uma dívida em euros que hoje é praticamente impagável. A Grécia está limitada a duas alternativas: ajustar ainda mais ou não pagar, e as duas são ruins", diz Matias.

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