Ciência

Variante do coronavírus encontrada no Brasil pode ser mais transmissível

Mutação encontrada em Manaus possui alterações similares às da variante da África do Sul e do Reino Unido e preocupa cientistas no mundo todo

Coronavírus: nova variante brasileira pode ser ainda mais perigosa (Ricardo Moraes/Reuters)

Coronavírus: nova variante brasileira pode ser ainda mais perigosa (Ricardo Moraes/Reuters)

Tamires Vitorio

Tamires Vitorio

Publicado em 13 de janeiro de 2021 às 18h44.

Última atualização em 13 de janeiro de 2021 às 19h24.

Uma pesquisa realizada por cientistas brasileiros aponta que a nova linhagem do coronavírus encontrada em Manaus, no Brasil, pode ser mais transmissível do que as variantes do Reino Unido e da África do Sul — isso porque a brasileira contém, dentro de seu código genético, ambas as mutações encontradas nos países citados acima.

De acordo com os pesquisadores, a linhagem, chamada de P.1, contém uma "constelação única" de mutações e foi identificada em 42% das 31 amostras de testes RT-PCR positivos entre os dias 15 e 23 de dezembro. Os resultados ainda são preliminares.

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A descoberta, de acordo com os cientistas, indica que a transmissão local causou o aumento da frequência de casos da nova linhagem na região do Amazonas. É também possível afirmar que a nova mutação viajou de Manaus para o Japão — espalhando-se, dessa forma, para o resto do mundo.

Segundo Ester Sabino, infectologista e coautora do estudo, isso pode significar um aumento substancial no número de infectados e casos de SARS-CoV-2 no Brasil — terceiro país mais afetado pela doença no mundo. "Nossa pesquisa até este momento só descreveu a nova variante. Ela possui ao mesmo tempo as mutações da linhagem do Reino Unido e da África do Sul associadas, o que sugere que ela deve  ser mais transmissível. E que ela provavelmente será a responsável por aumentar o número de casos nesta segunda onda", afirma Sabino em entrevista à EXAME.

O estudo explica que a descoberta dessas novas variantes do vírus podem estar potencialmente associadas com o aumento na transmissibilidade da doença e na propensão de reinfecção de indivíduos.

"A gente sabe que todas essas amostras que têm alterações na proteína spike e que têm essa mutação EK48K têm tido uma vantagem para, inclusive, conseguir se disseminar mesmo em populações que já têm anticorpos com o vírus. Isso está acontecendo na segunda onda. Mas teorizamos que ela tem uma possibilidade de se transmitir mais rapidamente", explica Fernando Rosado Spilki, virologista e presidente da Sociedade Brasileira de Virologia. Segundo ele, existe uma questão molecular que aumenta a transmissibilidade da doença.

(Virological/Reprodução)

A reinfecção por novas cepas já vem acontecendo no Brasil. No dia 8 deste mês, o Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR) confirmou o primeiro caso de reinfecção por uma nova variante do vírus em uma paciente de 45 anos em Salvador.

O primeiro caso foi confirmado em 20 de maio de 2020, e o segundo no dia 26 de outubro — na reinfecção, segundo o IDOR, os sintomas foram mais severos. Ela não possuía nenhuma comorbidade e os dois diagnósticos foram realizados com o teste RT-PCR.

O Reino Unido, por exemplo, anunciou que tomará medidas para "proteger o país de novas infecções vindas do exterior", citando especificamente a variante brasileira.

Mas não é preciso ter pânico. Segundo Sabino, ainda não se sabe se a nova variante pode ou não afetar a eficácia das vacinas já aprovadas. Medidas de proteção contra o vírus, como o uso de máscaras, o isolamento e o distanciamento social continuam sendo cruciais para evitar o espalhamento da covid-19 — seja a variante já conhecida pela humanidade ou contra outras que virão.

E as vacinas?

As mutações do coronavírus, embora comuns, têm causado preocupações no mundo todo. A primeira delas, a B.1.1.7 encontrada no Reino Unido, é mais contagiosa, mas, segundo evidências científicas, não deve alterar a eficácia das vacinas que já foram aprovadas.

Em dezembro do ano passado, especialistas americanos e britânicos afirmaram que algumas das vacinas já aprovadas para uso contra a covid-19 continuarão a funcionar mesmo com as mudanças. É o caso das vacinas da americana Pfizer em parceria com a alemã BioNTech, da Moderna e da AstraZeneca — em todos esses casos, o imunizante deve atacar a espícula do vírus, independentemente de suas mutações.

Em entrevista à emissora americana CNBC, Vin Gupta, professor da Universidade de Washington, afirmou "estar confiante que as vacinas protegerão contra diferentes cepas da covid". "Existe uma crença muito forte de que a vacina, como existe hoje, terá eficácia para prevenir infecções dessa nova variação na Inglaterra, assim como protege contra a cepa antiga que estamos tentando conter por meses", afirmou Gupta. Segundo ele, isso acontece porque a variante tem cepas muito parecidas com as "originais" da covid-19.

Todos os vírus existentes no mundo passam por mutações — até mesmo a gripe. Isso acontece porque, uma vez no organismo humano, o vírus tende a procurar formas de evoluir geneticamente, tornando-se mais resistentes ao uso de medicamentos, por exemplo.

"A eficácia dessas vacinas na produção de anticorpos que podem atacar e matar a covid-19 é extraordinária. Eu não espero que essas mudanças pequenas no nível genético afetem a performance da imunização no curto prazo", disse Gupta.

Na sexta-feira passada, a farmacêutica americana Pfizer divulgou um estudo no qual afirmava que a vacina desenvolvida pela companhia era eficaz mesmo em casos de mutação do coronavírus. "Já testamos 16 mutações diferentes e nenhuma delas teve um impacto significante [na vacina]. Isso é uma boa notícia. Mas não significa que a 17ª não possa ter", afirmou Phil Dormitzer, cientista viral da Pfizer, em entrevista à agência de notícias Reuters.

Em novembro de 2020, um estudo publicado na revista científica Nature apontou que é preciso tomar cuidado mesmo quando uma vacina for aprovada para uso.

Isso porque, com a imunização, o vírus tende a evoluir e mudar cada vez mais até ser capaz de escapar o sistema de reconhecimento do sistema imunológico humano — o que pode levar para uma situação emergencial de vírus mutante.

Mas não há motivo para pânico, segundo eles, uma vez que o modelo computacional gerado para prever se as infecções aumentaram também pode ser usado para prever se uma futura mutação irá escapar das vacinas — e, assim, atualizá-las conforme necessário. Um processo mais fácil com vacinas existentes e muito melhor do que criar algo do zero.

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