Coober Pedy: cidade australiana é famosa pela mineração de opalas (Governo da Austrália do Sul/Divulgação)
Redação Exame
Publicado em 26 de dezembro de 2025 às 14h05.
Os dias de calor extremo no Brasil têm feito a população pensar em alternativas para se refrescar. Piscinas, ar condicionado, ventiladores e até mesmo compressas de gelo podem ser usadas para escapar, mesmo que temporariamente, do calorão. No Rio de Janeiro, por exemplo, o Natal de 2025 chegou a quase 40 °C.
No coração árido do Outback da Austrália, os termômetros chegam à dezena superior, ultrapassando os 50 °C no verão. Nessa situação, as piscinas, ventiladores e compressas de gelo são praticamente inúteis. Uma cidade, no entanto, encontrou uma solução radical para sobreviver a esse clima: viver debaixo da terra.
Estabelecimentos subterrâneos: rochas sedimentares ajudam no isolamento térmico (Prefeitura de Coober pedy/Divulgação)
Em Coober Pedy, famosa pela mineração de opalas, cerca de metade da população mora em casas subterrâneas escavadas na rocha. A estratégia mantém a temperatura interna estável, em torno de 24º C.
Fundada há mais de um século após a descoberta de opalas na região, a cidade se tornou conhecida como a “capital mundial da opala” e também como a principal cidade subterrânea do país.
Além de residências, Coober Pedy abriga hotéis, igrejas, museus e até bares abaixo da superfície.
A cidade nasceu em 1915, quando um adolescente encontrou opalas no solo do deserto sul-australiano. Houve uma corrida pelas pedras preciosas, que atraiu mineradores de diferentes partes do mundo.
Opalas: pedras atraíram população mineradora à região (Governo da Austrália do Sul/Divulgação)
Com o calor intenso, a escassez de árvores e as noites frias do deserto, os primeiros moradores passaram a escavar suas próprias moradias usando ferramentas de mineração.
Essas casas, conhecidas como dugouts, aproveitam as propriedades do arenito local para isolar o calor e o frio.
Hoje, cerca de 70% da produção mundial de opalas tem ligação com a cidade, e aproximadamente metade dos 3.500 habitantes vive no subsolo.
A vida subterrânea se expandiu com o tempo. Igrejas escavadas na rocha, como a Igreja Ortodoxa Serva, hotéis parcialmente subterrâneos e museus instalados em antigas minas fazem parte do cotidiano local.
Igreja ortodoxa: a igreja foi feita dentro das rochas e conta até mesmo com vitrais (Metropolitanate of Australia and New Zealand Serbian Orthodox Church/Divulgação)
“A beleza de viver debaixo da terra é que é muito silencioso e calmo”, afirmou Robert Coro, diretor do hotel Desert Cave, em entrevista à Smithsonian Magazine.
Para o governo da Austrália do Sul, Coober Pedy se tornou um símbolo de adaptação humana ao ambiente extremo, atraindo turistas interessados na paisagem lunar, na história da mineração e na experiência de dormir sob a terra.
Toronto tem o problema inverso de Coober Pedy, mas chegou à mesma solução. A metrópole canadense desenvolveu sua “cidade subterrânea” para enfrentar o frio intenso do inverno.
Conhecido como PATH, o sistema é uma rede majoritariamente subterrânea de passagens para pedestres no centro da cidade.
De acordo com a prefeitura de Toronto, o PATH tem mais de 30 quilômetros de extensão e conecta mais de 75 edifícios, incluindo seis estações de metrô, hotéis, centros comerciais e o principal terminal de transporte da cidade, a Union Station.
O espaço abriga cerca de 1.200 lojas, restaurantes e serviços, gera aproximadamente US$ 1,7 bilhão em vendas anuais e sustenta cerca de 4.600 empregos.
O sistema começou em 1900, com túneis ligando lojas no centro da cidade, e cresceu de forma significativa a partir da década de 1970.
Hoje, mais de 200 mil pessoas utilizam o PATH diariamente para circular protegidas do frio, da neve e do vento. Para a administração municipal, a rede subterrânea é essencial para a vitalidade econômica do centro de Toronto.
A ideia de viver no subsolo não é nenhuma novidade.
Na região da Capadócia, na Turquia, a antiga cidade de Derinkuyu é considerada o maior complexo subterrâneo já escavado no mundo. A cidade chega a mais de 85 metros abaixo da superfície, possui 18 níveis e foi capaz de abrigar até 20 mil pessoas por meses.
Derinkuyu foi usada por diferentes civilizações ao longo de milhares de anos, incluindo frígios, persas e cristãos do período bizantino.
Escavada em rocha vulcânica macia, a cidade contava com moradias, estábulos, escolas, capelas, sistemas de ventilação e poços de água protegidos.
“O relevo e a geologia da Capadócia são ideais para a escavação de espaços subterrâneos”, explicou Andrea De Giorgi, professor da Universidade Estadual da Flórida, à BBC.
A principal função da cidade era servir como refúgio contra invasões, especialmente durante períodos de guerra e instabilidade religiosa. Derinkuyu foi abandonada no início do século 20 e redescoberta em 1963, tornando-se Patrimônio Mundial da Unesco.
Essa ideia também foi utilizada, mais recentemente, na Grã-Bretanha durante a 2ª Guerra Mundial, quando foi construído o bunker de Burlington.