Exame Logo

Cães: raça e comportamento não têm relação, indica estudo

Pensamentos como "rottweilers são agressivos" ou "golden retrievers são amigáveis" não teriam fundamento

(damedeeso/Getty Images)
A

AFP

Publicado em 29 de abril de 2022 às 15h16.

Última atualização em 29 de abril de 2022 às 15h26.

Estereótipos bem conhecidos sobre o comportamento dos cães, como rottweilers e pit bulls sendo agressivos, ou labradores e goldens retrievers superamigáveis, são refutados por um novo estudo sobre comportamento.

Trata-se de uma pesquisa genética publicada na quinta-feira, 28, na revista Science em que foram analisadas cerca de 200 mil respostas a questionários feitos aos donos de mais de 2 mil cães, que mostra que assumir que raça e comportamento estão ligados não tem fundamento.

Veja também

Com certeza, muitos traços comportamentais podem ser hereditários, mas o conceito moderno de raça oferece um valor preditivo parcial para a maioria dos comportamentos, e quase nenhum para quão afetuoso um cão pode ser.

"Embora a genética desempenhe um papel na personalidade de qualquer cão, sua raça específica não é um bom indicador de tais características", segundo Elinor Karlsson, autora do estudo realizado pela universidade Umass Chan, o instituto Broad e a Universidade Harvard.

"O que descobrimos é que os critérios que definem um golden retriever são suas características físicas o formato de suas orelhas, a cor e qualidade de sua pelagem, seu tamanho e não se é amigável", acrescentou a cientista.

Pesquisa da revista Science analisou cerca de 200 mil respostas sobre 2 mil cães (Bússola/Divulgação)

A pesquisadora Kathleen Morrill explicou que entender as relações entre raça e comportamento pode ser o primeiro passo para entender os genes responsáveis por condições psiquiátricas em humanos, como transtornos obsessivo-compulsivos.

"Não podemos, porém, perguntar aos cães sobre seus problemas, pensamentos ou ansiedades. Sabemos que os cães têm uma vida emocional rica e experimentam distúrbios que se manifestam em seu comportamento", disse à imprensa.

Como foi feito o estudo?

A equipe de pesquisa sequenciou o DNA de 2.155 animais de raça pura e mistas para encontrar variantes genéticas comuns que pudessem prever seu comportamento e combinou essas informações com as respostas das entrevistas com 18.385 donos de animais da Arca de Darwin, uma iniciativa de dados abertos onde os donos descrevem as características e comportamentos de seus animais de estimação.

Os pesquisadores estabeleceram definições-padrão para relatar características como obediência, sociabilidade com humanos e padrões motores relacionados a brinquedos.

Características físicas e estéticas também fizeram parte do estudo.

Ao todo, Karlsson e Morrill encontraram 11 pontos no genoma dos cães associados a diferenças comportamentais, incluindo obediência, devolução de objetos, apontar algo procurado e latidos.

Qual foi a conclusão?

Entre esses comportamentos, a raça desempenhou um certo papel por exemplo, os beagles e sabujos tendem a uivar mais, os border collies são mais flexíveis, enquanto os shiba inus são muito menos.

Mas sempre há exceções à regra. Por exemplo, embora os labradores tenham uma tendência menor de uivar, 8% o faziam. Ou enquanto 90% dos galgos não enterravam brinquedos, 3% o faziam com frequência.

Mulher leva cachorro para passear na Alemanha (Jonas Walzberg/Getty Images)

"Quando analisamos o fator que chamamos de limiar agonístico, que incluía muitas perguntas sobre se os cães reagiam agressivamente a determinadas coisas, não vimos um verdadeiro efeito da raça", disse Karlsson.

No geral, a raça explicou apenas 9% das variantes comportamentais, sendo a idade um melhor indicador de algumas características, como o uso de brinquedos. No entanto, as características físicas tiveram cinco vezes mais probabilidades a serem previstas pela raça do que pelo comportamento.

A ideia vai contra suposições generalizadas que influenciaram marcos legais. Por exemplo, o Reino Unido proibiu os pit bull terriers, assim como muitas cidades nos Estados Unidos.

O que a raça do meu cachorro significa?

Antes do século 19, os cães eram selecionados por suas funções, como caça, guarda e pastoreio, diz a equipe de pesquisa em seu estudo.

"Em vez disso, as raças modernas de cães enfatizam a confirmação dos ideais físicos e a pureza da linhagem, é uma invenção vitoriana", aponta o documento.

As raças modernas carregam variações genéticas de seus antecessores, mas não nas mesmas frequências, explicando a diferença de comportamento entre as raças.

Os próximos passos, diz Morill, seriam aprofundar o estudo dos comportamentos compulsivos em cães e suas conexões com transtornos obsessivo-compulsivos em humanos.

Uma descoberta intrigante é que a sociabilidade dos cães em relação aos humanos foi "incrivelmente herdada nos cães", mesmo sem depender de sua raça.

Os pesquisadores encontraram um ponto no DNA canino que poderia explicar 4% das diferenças de sociabilidade entre diferentes indivíduos, e esse ponto corresponde a uma área do genoma humano responsável pela formação da memória de longo prazo.

"Pode ser que entender a sociabilidade dos cães com os humanos nos ajude a entender como o cérebro se desenvolve e aprende. Então, estamos apenas arranhando a superfície", apontou Morill.

VEJA TAMBÉM

Cachorros evoluíram para serem mais fofos e conquistar humanos

Lambida de cachorro pode disseminar bactérias resistentes a antibióticos

Acompanhe tudo sobre:AnimaisCachorrosPesquisas científicas

Mais lidas

exame no whatsapp

Receba as noticias da Exame no seu WhatsApp

Inscreva-se

Mais de Ciência

Mais na Exame