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Vale a pena comprar vinho no supermercado? Confira ofertas que dizem sim

A oferta de vinhos em supermercados como Pão de Açúcar e St Marché melhorou muito nos últimos anos

Oferta de vinhos em supermercados de todo o Brasil melhorou muito (David Silverman/Getty Images)
DS

Daniel Salles

Publicado em 16 de setembro de 2020 às 10h59.

Última atualização em 16 de setembro de 2020 às 18h57.

Quando a pandemia do novo coronavírus chegou ao Brasil, em março, o tradutor Luís Cláudio Machado estava visitando a mãe em Palmeira do Oeste, na fronteira de São Paulo com Mato Grosso do Sul, a 613 quilômetros da capital onde ele mora. Como tinha ido de avião, decidiu ficar por lá durante o período da quarentena, que não imaginava fosse ser tão longo. Acostumado a frequentar restaurantes e a beber vinhos de um bom padrão, de início, preferiu ficar na cerveja. “Achei que no supermercado por aqui eu não encontraria nenhum vinho minimamente aceitável”, diz.

Mas a quarentena se prolongou. Luís decidiu, então, recorrer aos e-commerces de vinho. O serviço satisfez. No entanto, como a entrega costuma demorar cerca de duas semanas, entre um pedido e outro, por vezes, Luís fica sem vinho. Isolado na casa da mãe, nunca foi ver o que tinha para comprar na cidade. Até que um dia, sem botar muita fé, pediu para a sobrinha que frequenta o supermercado Joana D’Arc, o maior da cidade, fotografar as prateleiras dos vinhos. “Para minha surpresa, eles têm vários vinhos razoáveis e alguns muito bons”, conta. Na foto das prateleiras, é possível se identificar, por exemplo, uma garrafa do chileno Marquês de Casa Concha e outra de Santi Solane Valpolicella Ripasso, dois vinhos de qualidade, que custam mais de R$ 100.

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A oferta de vinhos em supermercados de todo o Brasil melhorou muito nos últimos anos. “Antigamente, você ia à seção dos brancos e os vinhos eram quase marrons de tão velhos”, diz Adilson Carvalhal Junior, diretor de importação Casa Flora e presidente da ABBA (Associação Brasileira de Importadores e Exportadores de Bebidas e Alimentos). “Isso mudou. Na maioria dos casos, os supermercados têm um cuidado especial com a categoria. Os produtos muitas vezes estão em áreas climatizadas. Até a apresentação melhorou. Você vê que as gôndolas são arrumadas. Há material promocional. Hoje é difícil um supermercado que não tenha uma gestão dessa categoria”

Segundo ele, os importadores vêm trabalhando junto aos lojistas para elevar a qualidade do serviço. A Casa Flora, por exemplo, oferece treinamento para os atendentes dos mercados e supermercados. Antes da pandemia era presencial, atualmente a empresa tem feito treinamento online. Organiza também degustações para os clientes das lojas.

Hoje o setor de supermercados representa quase 70% das vendas de vinhos no Brasil, de acordo com a Abras (Associação Brasileira de Supermercados). “Supermercado é o grande ponto de abastecimento de vinho do brasileiro”, diz Antonio Carvalhal Neto, diretor de vendas e marketing da Casa Flora. Durante a pandemia, a empresa, que sempre foi mais focada no B2B do que no atendimento direto ao consumidor, viu suas vendas para supermercados subirem uns 15% e compensarem a baixa quase total dos negócios com restaurantes. “Durante a pandemia, os supermercados que têm delivery e souberam trabalhar os canais digitais cresceram muito. Digital não precisa ser site. Pode ser o Whatsapp que o pequeno mercadinho usa para captar vendas num raio de uns 3 quilômetros”.

“Nacionalmente acompanhamos a venda de vinhos aumentar de forma exponencial”, diz Márcio Milan, superintendente da ABRAS. “Comparando as vendas no autosserviço brasileiro de vinhos até maio de 2020 com o mesmo período do ano anterior, registramos crescimento de 35,4%”.

Todo supermercado quer trabalhar com vinhos. “Ele tem alto valor agregado”, diz Milan. “É o produto ideal para promover vendas casadas com queijos, pães e frios, por exemplo. Além disso, o vinho agrega uma imagem positiva ao supermercado, é um diferencial.”  Segundo ele, a demanda parte do público. “O consumidor moderno está mais aberto para experimentar o novo, vivenciar novas sensações”, diz. “Tendo em vista este novo movimento, as gôndolas dos supermercados estão diversificando seu mix, tanto com produtos brasileiros, como importados. Hoje temos vinhos franceses, italianos, portugueses, chilenos, entre outros, com ótimo custo-benefício em lojas localizadas em regiões que não são nobres.”

Antes de implantar supermercados e hipermercados numa região, as empresas, principalmente as grandes redes, costumam fazer estudos territoriais para conhecer as necessidades dos consumidores locais. “Uma loja em determinada região que atenda mais a classe AB, terá um melhor desempenho na venda de um tipo de vinho”, diz Milan. “Outra que atenda mais a classe DE, terá um melhor desempenho com algum outro”.

Nas grandes redes e nos pequenos mercados do interior, hoje é comum encontrar ao menos a linha varietal de grandes marcas nacionais, como Almadén (Miolo), Salton e Aurora, conhecidas há décadas do público, que entregam uma qualidade bastante razoável. Igualmente familiares para o brasileiro, os vinhos de entrada chilenos, que muitas das vezes levam o título de reservados, também estão presentes nos supermercados dos mais remotos rincões. Em comum, esses rótulos têm o fato de custarem menos de R$ 60 (os nacionais bem menos) e contarem com a confiança do consumidor médio, que não costuma ousar.

Ou não costumava. Mesmo nas grandes redes, o público se mostra mais experiente. “Em 2019 aumentamos a carta de vinhos com preços acima de R$ 100,00 em todas as lojas”, diz Samir Jarrouj, Diretor Comercial do Grupo Pão de Açúcar, que reúne entre outras as bandeiras Assaí, Extra e Pão de Açúcar, com lojas em vários estados brasileiros. “Fechamos parceria, por exemplo, com a importadora Mistral para os rótulos da argentina Bodega Catena Zapata, que é hoje a marca de vinhos mais reconhecida em todo o mundo”. Os vinhos Catena saem pelo mesmo preço nas lojas Pão de Açúcar ou na importadora.

Com esse tipo de ação, os supermercados acabam atraindo um público mais experiente, que antes resistia a abastecer a adega nas suas gôndolas. “O cliente que já consumia esses produtos encontrou no Pão de Açúcar um novo canal para a compra dos seus vinhos preferidos”, diz Jarrouj. “Uma estratégia que se mostrou acertada. Somente no primeiro semestre deste ano, a venda de vinhos com ticket superior a R$ 100,00 registrou crescimento de três dígitos, na comparação com o mesmo período do ano passado”.

O Pão de Açúcar, assim como outros supermercados, também desenvolve uma série de ações para a educação do consumidor menos experiente. A marca própria deles, a Club des Sommeliers, por exemplo, é organizada de uma forma bastante didática. Leva sempre a mesma bandeira, sendo que o “nome” do vinho é o tipo de uva, cabernet sauvignon, por exemplo, ou a denominação de origem, Chianti, por exemplo. O nome da uva, em geral, é usado quando se trata de um vinho do novo mundo. E o da denominação, ou região, para os vinhos do velho mundo. Essa é a lógica de rotulagem que já se usa para o novo e o velho mundo. Mas, ao tirar os outros vários nomes que costumam entrar nos rótulos (marca, vinícola, nome do produtor, etc), o Club des Sommeliers simplifica a memorização. O consumidor lembra mais facilmente do que tomou, do que gostou e do que não gostou. Aprende que gosta de Merlot e Bordeaux, por exemplo. Esse é o primeiro passo para fazer boas compras no futuro.

Os rótulos dessa marca própria costumam ser mais baratos que seus similares. “Para selecionar esses vinhos, visitamos as regiões produtoras, fazemos degustações e analisamos o custo-benefício de cada vinho antes de validar o produto como um rótulo Club Des Sommeliers”, conta Jarrouj. O que eles não contam, ou melhor, não enfatizam é que há outros vinhos de importação própria nas gôndolas. Esses vinhos também costumam ter uma boa relação qualidade e preço. Para descobrir quais são, basta procurar pelo importador no contra-rótulo: Companhia Brasileira de Distribuição é a razão social do Grupo Pão de Açúcar.

Vinhos de importação própria costumam ter bons preços em todos os supermercados. “Você tem a oportunidade de não ter intermediários aumentando custos”, diz Marcelo Lopes Marcelino, gerente de adega da Casa Santa Luzia. Neto do fundador, Daniel Lopes, Marcelo começou a trabalhar no supermercado do avô há 40 anos, já no setor de vinhos. “Por ser um apaixonado e estudioso da área, me iniciei e me perpetuei ao lado dos vinhos”, diz rindo.

Conhecida por ter uma seleção muito completa de produtos gastronômicos de alta qualidade, a Casa Santa Luzia foi fundada em 1926, na esquina da rua Augusta com a rua Oscar Freire, nos Jardins, em São Paulo. Desde o início, importava com vinhos finos. No livro Casa Santa Luzia, a História de uma Marca da Gastronomia Paulistana, listas antigas de produtos, da época em que a casa se auto intitulava como importadora, mostram uma boa variedade de rótulos europeus. As cestas de natal de 1957 incluíam champanhes, vinhos do Porto, Medóc. A empresa atravessou o período do governo militar, quando as regras aduaneiras dificultavam muito as importações, sem deixar de oferecer para seus clientes vinhos franceses, italianos, portugueses e de outras procedências. Nesse meio tempo, o empório virou supermercado, começou a trabalhar também com produtos de outros importadores e mudou para a alameda Lorena. Segundo Marcelo, é possível conseguir bons preços também para rótulos de importadores parceiros.

Com 38 lojas distribuídas pelos bairros mais nobres do Rio de Janeiro, o supermercado Zona Sul optou por trabalhar prioritariamente com vinhos de importação exclusiva. Dos 400 rótulos que compõem o mix das gôndolas em diferentes lojas, 90% são importados pelo próprio Zona Sul. “E não aceitamos compras de oportunidade”, diz o sommelier Dionísio Chaves, responsável pela seleção dos rótulos. “O nosso foco é desenvolver marca.” Muitas dessas marcas pertencem a grupos que têm outras marcas mais famosas. O Chianti Classico I Cipressi del Casato, que custa bem menos do que a maioria dos vinhos dessa DOCG, por exemplo, pertence ao grupo do conceituado Carpazo, produtor de Brunello di Montalcino.

Segundo Dionísio, o mix de rótulos varia de loja para loja, mas, em média, costuma incluir 50% de vinhos até R$ 60, 35% até R$ 200 e 15% acima disso. Ou seja, o carioca já sabe que pode comprar vinhos caros no supermercado. Segundo Dionísio, o grupo vende de 1,5 milhões a 2 milhões de garrafas ao ano. Além dos importados, o sommelier faz também uma ótima curadoria de rótulos nacionais. O Zona Sul tem, por exemplo, os ótimos Vinhos Maria Maria, uma vinícola boutique que nasceu dentro de uma fazenda de café do sul de Minas Gerais.

No St Marché, supermercado voltado para o segmento gourmet que tem 19 lojas em São Paulo e região, quem faz a seleção dos vinhos que vão para as gôndolas é o próprio dono, Bernardo Ouro Preto, co-fundador e co-CEO. “Pelo nosso tamanho, ainda podemos focar em qualidade e não em grandes volumes”, diz Bernardo. “Dou uma atenção pessoal por ser fanático pelo tema. Temos uma seleção do mundo inteiro, uma curadoria artística. Faço isso por paixão, não porque sou diretor de produtos ou co-CEO.”

Segundo ele, nas lojas St Marché são em torno de 600 rótulos e na loja do Empório Santa Maria, que pertence ao grupo, por volta de mil rótulos. “Todos escolhidos pessoalmente por mim”, diz rindo. “É um trabalho difícil, mas alguém tem que fazer”. Para que as lojas tenham um setor de adega que se destaque, faz questão de um portfólio completo “Precisamos ter representatividade não apenas de todos tipos de vinhos, mas também dos principais países produtores, mesmo daqueles que não têm tanta demanda no Brasil, como por exemplo, os vinhos alemães”. Tomamos um cuidado enorme para não concentrar em uvas específicas ou em origens como Chile e Argentina.” Isso apesar de Argentina e Chile responderem por mais 80% das vendas. “Temos de ter um portfólio completo”, diz.

Além do básico

Pavo Nero Rosso D’Italia
Baseada na Toscana, a Agricoltori del Chianti é uma ex-cooperativa que foi comprada pela vinícola Piccini. Este vinho é como um irmão mais novo do Memoro Rosso, um rótulo que faz muito sucesso da Piccini. Como aquele, é um mistura de uvas e vinhos de várias partes da Itália: nero d’avola, da Sicília, primitivo, da Puglia, montepulciano de Abruzzo e merlot do Trento. É um vinho potente, denso, com muita fruta escura. No nariz chega a ser doce, mas na boca é completamente seco. Custa R$ 69,93, no Zona Sul.

António Saramago Reserva
Vinho regional alentejano assinado pelo mestre António Saramago, o enólogo português há mais tempo em atividade, este vinho foi feito especialmente para o supermercado Zona Sul. Um corte de trincadeira, aragonês, syrah e alicante bouschet, ele passa seis meses por barricas de carvalho. É encorpado e tem aroma de compota de frutas negras, mesmo assim é elegante, equilibrado, como costumam ser os vinhos de Saramago. É um vinho que pode ser bebido agora ou guardado por anos. Custa R$ 77,80, no Zona Sul.

Baron de Vassal
Elaborado por um ótimo produtor de Bordeaux, este vinho leva a denominação vin de l’Union Europèenne, porque deve usar uvas de regiões vizinhas ou não seguir alguma regra da denominação. A ficha não explica. O fato é que ele tem tudo que um bordeaux de entrada moderno deveria ter: muita fruta fresca no nariz, taninos finos, uma ótima acidez. Um vinho bastante gostoso de beber. Importado pela Casa Flora, encontra-se à venda em vários supermercados. Preço sugerido: R$ 69,90.

Loios Tinto
Um corte de aragonês, trincadeira e castelão, este regional alentejano, produzido por João Portugal Ramos, é um ótimo exemplo de que vale experimentar os vinhos mais simples de um grande enólogo. Eles costumam ter a mão do autor. Este é um tinto cheio de fruta, com uma ótima acidez. Um vinho ótimo para acompanhar comida, que não pesa. Importado pela Casa Flora, está à venda em vários supermercados. Preço sugerido: R$ 76,50.

Pérez Cruz Pircas Cabernet Sauvignon
A Casa Santa Luzia importa toda a linha do chileno Pérez Cruz. Há vinhos de entrada muito gostosos. Este é um vinho mais elaborado. Um vinho potente com uma boa complexidade aromática, com frutas escuras, especiarias, algo de ervas, baunilha, café e uma série de outros aromas. Na boca, os taninos estão presentes, mas são bastante finos. Custa R$ 189,00.

Trop.cal Rosé
No início deste ano, o St Marché lançou o Trop.Cal chardonnay, uma marca própria produzida para o supermercado pela conceituada vinícola Pizzata. Agora estão lançando um tinto e um rosé. Ambos feitos a partir da uva merlot. Esse rosé é perfeito para a primavera brasileira e suas altas temperaturas. É fresco, tem aroma de frutas vermelhas, ótima acidez e um final de boca limpo, que não pega. Custa R$ 89,99.

Alamos Malbec
Nicolás Catena, da Bodega Catena Zapata, é considerado o pai do malbec argentino. Foi ele quem primeiro investiu na casta e a transformou no sucesso que é hoje. O Pão de Açúcar vende vários vinhos da vinícola, até os mais caros. Este é um vinho de entrada. Leve, fresco, cheio de aromas frutados e um leve floral. Custa R$ 109,99.

Monte Velho Tinto
A Herdade do Esporão é uma das vinícolas mais conceituadas do Alentejo. E seus produtos, vinhos e azeites, estão em vários supermercados. São uma garantia de qualidade. O Monte Velho Tinto não é o mais barato deles. Mas tem um preço bem em conta pela qualidade. É um vinho escuro, com aromas de frutas negras e vermelhas maduras. Na boca, é redondo. Custa cerca de R$ 65.

 

 

 

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