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Assessora diz que teve de omitir morte à família Senna

A assessora Betise Assumpção resolveu contar, no aniversário de 20 anos da morte do piloto, detalhes sobre as horas seguintes ao acidente


	Ayrton Senna: a assessora omitiu a morte do piloto à família durante cinco horas
 (Nelson Coelho)

Ayrton Senna: a assessora omitiu a morte do piloto à família durante cinco horas (Nelson Coelho)

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Da Redação

Publicado em 1 de maio de 2014 às 17h38.

São Paulo - Assessora de imprensa de Ayrton Senna quando de sua morte, há exatos 20 anos, Betise Assumpção, hoje casada com Patrick Head, o projetista da Williams que vitimou o piloto, resolveu contar, nesta quinta-feira, no seu blog, detalhes sobre as horas seguintes ao acidente na curva Tamburello.

"Acho difícil ler coisas como: 'Ayrton estava tranquilo naquela manhã, ele estava pensando em seu companheiro (Roland) Ratzenberger'. Como é que alguém pode saber o que ele estava pensando? 'Ele não queria correr'. Mais uma vez, de onde eles tiraram essa informação?", questiona Betise, explicando por que decidiu contar o que vivenciou.

Naquele domingo, um dia depois do acidente que matou o austríaco Roland Ratzenberger, Senna chegou a Ímola sem conceder entrevistas.

"Não tenho a intenção de apontar o dedo ou colocar a culpa . Quero simplesmente registrar o que realmente aconteceu, porque eu era uma das poucas pessoas que estavam lá, vivi de perto os acontecimentos daquele dia."

O relato de Betise começa logo após o acidente e conta que ela se viu obrigada pela Fórmula 1 a omitir da família Senna, por 5 horas, que ele havia morrido na pista durante o GP de San Marino

"Leonardo (irmão de Senna) e eu saímos dos boxes da Williams e caminhamos em direção à torre de comando do autódromo em busca de mais informações. Quando nos aproximamos, Bernie (Ecclestone, chefão da F1) estava saindo de lá. Ele olhou para nós e disse ao Leonardo , agarrando-o suavemente pelo braço e dirigindo-o para o motorhome. 'Eu preciso falar com você'.

Eu traduzi para o Leo e caminhei junto com eles. Bernie virou para mim e disse: 'Você não". Então eu expliquei: "O Leo não fala uma palavra de inglês". Bernie balançou a cabeça e teve que aceitar, nos direcionando ao motorhome. Quando entramos, Slavica (esposa de Bernie) já estava lá. Sozinha, muito abalada e chorando. Bernie se sentou no braço de uma poltrona; nós dois no sofá em frente. O Bernie disse que tinha notícias do Ayrton. Leo estava branco.

'Ele está morto', falou. Pensei por alguns segundos, 'Como eu posso traduzir isto e dizer para o Leo de uma forma mais amena, considerando que ele só falou duas palavras!'. Então eu me virei para o Leo e, da maneira mais gentil e carinhosa possível, eu falei: 'Leo, eu sinto muito ter de te falar isto, mas ele está dizendo que o Ayrton está morto'.

Leo ficou atordoado. Ele olhou para mim, depois para Bernie. Não disse uma palavra. Tive vontade de abraçá-lo. Ele começou a chorar. A soluçar. Aí o Bernie acrescentou: 'Mas nós só vamos anunciar mais tarde para não parar a corrida'. E eu traduzi para o Leo. Mesmo antes de eu terminar ele já estava descontrolado, chorando alto e tremendo. Eu realmente não sabia o que fazer. Eu nunca tinha visto uma dor tão crua.

Bernie levantou-se , pegou uma maçã e começou a conversar com a Slavica, que chorava ainda mais alto. Levei alguns minutos para conseguir acalmar o Leo. Ele ainda estava muito abalado e incapaz de dizer qualquer coisa quando eu lhe disse, mais uma vez da maneira mais gentil possível. - e segurando suas mãos nas minhas.

"Leo, eu realmente sinto muito. Nossa, de verdade. Nem sei mais o que dizer para você, mas uma coisa você tem que fazer. Você precisa se recompor e ligar para seus pais no Brasil. Eles devem estar desesperados e não pode ser eu a lhes dar esta noticia. Eles precisam ouvir isso de você. Tenho certeza de que vai ser mais reconfortante para eles também "

Expliquei isso ao Bernie e ele, imediatamente, ofereceu o telefone do motorhome. Leo fez a chamada. Foi quando Martin Whitaker, o então assessor de Imprensa da FIA, entrou no motorhome. Bernie e Martin conversaram por alguns minutos. Então Martin virou-se para mim e disse. 'O que eu disse na sala de imprensa é que Ayrton teve ferimentos na cabeça e foi levado para o hospital'

'O Bernie acaba de nos dizer que o Ayrton está morto', eu respondi. Leo estava no telefone comunicando a sua família que o Ayrton tinha morrido, em lágrimas. E novamente muito abalado. 'Não, o que eu disse a imprensa é que ele teve ferimentos graves na cabeça', explicou Martin.

'Sim, eu sei disso, mas já sabemos que ele está morto', insisti , obviamente querendo dizer que ele não precisa nos dar o PR line; que nós sabíamos a verdade. Martin fingiu não entender e repetiu a mesma coisa.

Então, eu o puxei para uma salinha menor na parte de trás do motorhome. Tínhamos trabalhado juntos uns anos antes , quando ele era o assessor de imprensa da McLaren. Então eu pensei que poderia contar com o respeito dele. 'Martin, eu acho que você não entendeu a delicadeza da situação. O Leo já contou pra família que o Ayrton morreu. Eles já estão lidando com uma dor enorme.'

"Betise, eu entendo isso. Mas eu disse à imprensa que ele tinha ferimentos na cabeça e foi para o hospital. Eu não disse que ele está morto'.

'Sim, Martin, mas o que eu estou tentando dizer é que, se você insistir nesta postura, eu vou ter que sair desta sala, e ir dizer ao Leo que o Ayrton ainda está vivo e, consequentemente, dar a sua mãe e seu pai a esperança de que ele possa se recuperar. Uma esperança que não existe'. Martin foi categórico : 'Betise , ele não está morto. Esta é a informação que eu estou dando a todos'.

Saí da sala, contei pro Leo. Ele telefonou para o Brasil novamente e disse a sua mãe Neyde e pai Milton. Passei as próximas cinco horas traduzindo, organizando, transmitindo recados e lidando com as esperanças e dores de Leo no hospital e da família no Brasil. Só quando o Dr. Syd Watkins chegou ao hospital ficou tudo esclarecido.

Eu estava com a irmã do Ayrton no telefone me dizendo que eu deveria rezar, eu deveria ter esperança, Ayrton era forte. Eu simplesmente não conseguia fazê-los compreender a gravidade da situação. Tirei o telefone da orelha e disse pro Syd. 'É a Viviane. Ela não acredita quando eu digo a ela o quão grave é o estado do Ayrton. Eu não sei mais o que dizer. Você poderia falar com eles. Tenho certeza que vão te escutar', eu disse.

Syd olhou para mim. Ele estava visivelmente triste e com dor. 'Betise, não há esperança nenhuma. Ele já estava morto na pista'. E passou a descrever alguns detalhes de suas lesões na cabeça, que eu não vou escrever aqui, em nome do bom gosto e em respeito à sua família e amigos próximos. Eu fiquei muda. Cabeça vazia. Simplesmente entreguei-lhe telefone. Ele foi bem curto. A situação era tão grave que não tinha recuperação, ele não ia se recuperar.

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