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Reforma tributária: consequências e pontos de atenção do texto preliminar

Proposta traz alterações relevantes sobre a tributação de consumo e patrimônio, porém, deixa inseguranças e delega definições para lei complementar

Base ampla de incidência dos novos tributos é destaque da proposta (Andrey Popov/Thinkstock)

Base ampla de incidência dos novos tributos é destaque da proposta (Andrey Popov/Thinkstock)

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Publicado em 4 de julho de 2023 às 15h20.

Última atualização em 4 de julho de 2023 às 15h45.

Por Marcel Alcades Theodoro, Alberto Carbonar e João Vitor Ferrari Mascarenhas*

Após mais de três anos de tramitação no Congresso Nacional, foi apresentado o texto substitutivo da PEC nº 45/19, o qual concretiza a reforma da tributação do consumo e implementa algumas alterações na tributação do patrimônio. O substitutivo apresentado prevê a criação de um IVA Dual: uma contribuição federal sobre bens e serviços (CBS) e um imposto estadual e municipal sobre bens e serviços (IBS), gerido por um Conselho Federativo, sendo que ambos serão regulados mediante lei complementar.

Os novos tributos observarão o princípio do destino, cabendo sua cobrança a ente federativo do local de efetivo consumo/prestação do bem ou serviço. Além de enfrentar a guerra fiscal no Brasil, em que os entes disputam entre si a captação de indústrias e comércios para suas regiões, o princípio do destino terá impacto direto sobre as empresas que operam mediante e-commerce, as quais deverão se adaptar às mudanças legislativas apresentadas. 

Atenção aos novos tributos

Outro ponto relevante na proposta é a base ampla de incidência dos novos tributos, a qual inclui bens materiais ou imateriais, direitos e serviços. O tema é observado com cautela, pois possibilita ao Estado a cobrança fiscal de tributos sobre toda e qualquer operação. Há previsão expressa de que tais tributos serão calculados “por fora”, o que afasta a incidência em cascata de outros tributos em sua base, problema crônico do atual sistema tributário brasileiro.

Ressalta-se que o texto apresentado não aponta expressamente quais serão as alíquotas aplicáveis aos novos tributos, mas estabelece que será definida uma alíquota de referência mediante resolução do Senado Federal, tanto para a CBS quanto ao IBS. Cada ente federativo poderá estabelecer a sua alíquota única para bens e serviços mediante lei e vinculá-la (ou não) à alíquota de referência. Ainda, a alíquota do IBS será a soma das alíquotas municipal e estadual.

E quanto às exceções?

Destaca-se, também, as poucas exceções de alíquotas para o IBS e para a CBS, já que só se autorizou a redução em 50% para serviços e produtos específicos (a exemplo de educação, saúde e produtos agropecuários), em até 100% para medicamentos, para o Prouni e, até 2027, para serviços beneficiados pelo Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse).

Apesar das linhas gerais trazidas, vários pontos relevantes do novo modelo do IBS e da CBS foram delegados para leis complementares futuras, tais como: a definição de operações de uso e consumo pessoal; o conceito de operações de serviços e seu conteúdo e alcance; e a forma e o prazo para a restituição de créditos acumulados dos velhos e dos novos tributos.

É compreensível a intenção da proposta apresentada de limitar o texto constitucional somente aos pontos centrais do novo modelo, uma vez que não é de se esperar que a Constituição regulamente a matéria de forma exaustiva. Entretanto, é preciso também ponderar que estabelecer diretrizes constitucionais sobre pontos impactantes do IBS e da CBS é um tema essencial, já que ela impacta indiretamente várias garantias constitucionalmente asseguradas, como o direito à propriedade e a livre iniciativa, e já que a tradição brasileira na esfera tributária é marcada por um relevante volume de contencioso, inclusive em razão de regulações demasiadamente restritivas da Constituição pela legislação infraconstitucional.

Demais opções

Há também alternativas que podem ser discutidas para reduzir a insegurança de uma futura regulamentação, como a edição de regras provisórias que expirariam quando o tema for regulado – tal como feito pelo texto proposto para permitir a cobrança do ITCMD sobre doações no exterior – e a previsão do texto inicial da PEC n° 45/19 de prazos específicos para a regulação do IBS pelo então Conselho Federativo ou pela presidência. 

Apesar das delegações, o texto apresentado avançou no tema de saldos credores, pois se estabeleceu que os saldos de PIS/Cofins poderão ser compensados com a CBS ou outros tributos federais a partir de 2026, e que os saldos de ICMS homologados poderão ser compensados com o IBS, transferidos a terceiros ou ressarcidos, a partir de 2032 e nos termos de lei complementar.

Trata-se de avanço pontual, pois se assegurou um uso útil aos saldos de PIS/Cofins, e foram previstas alternativas para o ICMS que em muito divergem do cenário restritivo atual da legislação de vários estados. No entanto, a previsão para o ICMS ainda não é satisfatória, eis que o ressarcimento, além de depender de lei complementar, permite parcelamento excessivamente longos (por até 20 anos) e não admite a atualização monetária dos saldos antes de 2033, implicando em perdas financeiras aos contribuintes.

Por fim, o substitutivo estabelece que a transição ocorrerá a partir de 2026 (com a criação da CBS), e irá até 2033, ano que marcará para os contribuintes o fim da coexistência entre o sistema novo e o antigo.

A expectativa é de que o texto ainda sofra alterações em sua redação antes de sua votação que ocorrerá na primeira semana de julho. Espera-se que os poderes Legislativo e Executivo e demais atores políticos à frente da proposta tenham total ciência dos impactos da reforma ao setor empresarial, que está atento a todos os desdobramentos e preparado para adotar medidas cabíveis em face de eventuais inconstitucionalidades.

*Marcel Alcades Theodoro, Alberto Carbonar e João Vitor Ferrari Mascarenhas são, respectivamente, sócio e advogados do escritório Mattos Filho

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