Maior controvérsia diz respeito a relatórios semestrais de transparência salarial (10'000 Hours /Getty Images)
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Publicado em 31 de outubro de 2023 às 14h00.
*Por Cibelle Linero e Fernanda Nasciutti
O combate à desigualdade salarial entre homens e mulheres tem sido um tema cada vez mais recorrente no mundo, sendo uma das principais discussões na agenda de ESG. A questão ganhou ainda mais repercussão no Brasil, com a recente edição da Lei nº 14.611/2023, a “Lei da Igualdade Salarial”, que, a exemplo de outras legislações internacionais, vem reforçar a proibição à adoção de critérios discriminatórios para a definição da remuneração dos trabalhadores, sobretudo no tocante à igualdade salarial entre homens e mulheres. De forma geral, a lei introduz modificações na Consolidação das Leis do Trabalho (“CLT”) e impõe severas sanções aos empregadores que descumprirem as regras estabelecidas.
De todas as inovações, o ponto que certamente está gerando maior controvérsia diz respeito à obrigação de publicação de relatórios semestrais de transparência salarial e remuneratória para pessoas jurídicas privadas com 100 ou mais empregados.
A questão é bastante polêmica, pois, apesar da obrigação, por parte das empresas, de apresentar os primeiros relatórios em janeiro de 2024, a lei dispôs apenas de forma genérica que eles devem incluir dados sobre critérios remuneratórios que permitam a comparação objetiva entre salários, remunerações e a proporção de ocupação dos cargos de gestão por mulheres e homens, bem como dados estatísticos sobre outras possíveis desigualdades decorrentes de raça, etnia, nacionalidade e idade. Contudo, deixou de detalhar ou definir a forma desses relatórios e quais deverão ser os canais utilizados para a sua divulgação. A matéria se torna ainda mais relevante quando se verifica que o seu descumprimento poderá acarretar a aplicação de multa (correspondente a até 3% da folha de salários do empregador, limitada a 100 salários-mínimos), além de outras sanções.
Igualmente polêmica é a previsão de apresentação de um plano de ação para reduzir a desigualdade (quando verificada), com metas e prazos, além da garantia de participação dos sindicatos profissionais e de representantes dos empregados nos locais de trabalho. Como se tudo isso não bastasse, até o momento, o Governo Federal não disponibilizou a plataforma digital de acesso público que divulgará as informações e os indicadores sobre mercado de trabalho e renda desagregados por gênero, dentre outros dados.
Restam, assim, inúmeras dúvidas: Como/onde publicar os relatórios de transparência? O atendimento dos requisitos para a equiparação salarial previstos no artigo 461 da CLT seria suficiente para afastar a caracterização de eventual discriminação? Quais são os “critérios remuneratórios” mencionados na lei? Quais os parâmetros para o plano de ação (cada empresa pode definir os seus ou deverão seguir diretrizes ainda não divulgadas)?
Enquanto a regulamentação não chega, uma alternativa que se coloca para as empresas é o uso do direito comparado, através da busca de parâmetros utilizados em legislações internacionais com o objetivo de encontrar algumas respostas para as inquietantes perguntas. Ainda assim, é preciso muita cautela ao realizar tais comparações, pois a realidade brasileira tende a ser diferente, uma vez que o nosso conceito de equiparação salarial não encontra paralelo na maioria dos países que já tratam do tema.
Neste momento, apesar da inegável insegurança jurídica gerada pela falta de clareza dos próximos passos e extensão das obrigações, considerando o risco de exigência de cumprimento da legislação pelas autoridades trabalhistas a partir de janeiro de 2024, a recomendação é estar preparado para a apresentação de relatórios com os dados requeridos pela lei, ainda que para tanto sejam seguidos critérios definidos pelo próprio empregador.
*Cibelle Linero e Fernanda Nasciutti são, respectivamente, sócia e advogada da área Trabalhista do BMA Advogados.
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