O carro elétrico que dá choque, mas ganha dinheiro
Polêmicas sociais da Tesla não retiram a empresa do portfólio de grandes fundos de ESG do mundo, mas alguns deles já estão repensando seu investimento
Bússola
Publicado em 28 de abril de 2022 às 14h30.
Última atualização em 28 de abril de 2022 às 14h48.
Por Renato Krausz*
Acompanhar pelo noticiário as controvérsias em questões sociais e de governança da Tesla tem sido eletrizante — e triste. Uma das mais recentes é o processo que 4 mil pessoas, entre ex-funcionários e atuais, movem contra a companhia por discriminação racial.
O problema está concentrado numa fábrica da Califórnia e já rendeu à Tesla uma condenação para indenizar um único empregado em US$ 137 milhões. Toda essa confusão está reduzindo as notas da empresa nos ratings de ESG, mas não está fazendo os investimentos evaporarem. É o que mostra um extenso levantamento feito pelo Citywire, grupo inglês de publicações financeiras.
Na Moody’s ESG Solutions, a pontuação social da Tesla é de 23, atrás da média do setor, de 32. A Sustainalytics hoje classifica o risco social da Tesla em 16,16, enquanto o risco ambiental está em 2,78.
Essa situação poderia levar a empresa a ser rejeitada nos portfólios mais criteriosos em análise de impacto, mas nada disso está acontecendo. O Citiwire analisou os maiores fundos que se enquadram no chamado Artigo 9, que é o suprassumo em rigor da SFDR, a regulação europeia para os investimentos sustentáveis.
Pelo menos 19 desses fundos mantêm investimentos na empresa de Elon Musk. A equipe do Citiwire procurou saber as razões, mas boa parte nem sequer respondeu, aí incluso o fundo que tem a maior exposição na Tesla, de 5,4%, o Baillie Gifford Positive Change.
Já o pessoal do fundo Pictet Clean Energy disse que sempre deu uma nota social muito baixa à Tesla, o que vem reduzindo o peso dos aportes dispensados à companhia, mas que algum investimento é mantido em razão do conjunto da obra obtido pela análise de outras métricas.
Um porta-voz de outro fundo, o Mandarine Global Transition, afirmou que a gestora atribui uma pontuação de controvérsia de nível 3 à Tesla devido a questões sociais. Se a polêmica chegar ao nível 5, a empresa será excluída de sua lista.
O fato é que outras questões falam mais alto na decisão de colocar dinheiro parrudo lá. O porta-voz do Mandarine disse ao Citywire: “A Tesla é líder global em carros elétricos e neste seu ecossistema de negócios. Sua contribuição ambiental positiva e seus resultados financeiros atendem aos nossos critérios de investimento”. Simples assim.
Outros fundos resolveram pedir relatórios independentes sobre questões sociais da Tesla e há os que já decidiram vender as posições que tinham na empresa. É o caso dos fundos SEB Global Climate Opportunity e SEB Global Equal Opportunity. Ah, eles também se desfizeram de Amazon.
Não dá para saber se as denúncias dos 4 mil funcionários são verdadeiras, mas o relato que alguns deles fizeram ao Los Angeles Times das agruras que sofriam lá dentro são impressionantes. A Tesla decerto refuta todas as acusações e diz que elas atendem a interesses específicos. O final do processo dirá quem tem razão.
Uma única vez andei num Tesla e foi justamente na Califórnia. Eu e minha filha mais velha chamamos um Uber e, poucos minutos depois, em silêncio absoluto, ele “aterrissou” na nossa frente. Dentro do veículo me senti num desenho dos Jetsons.
O carro é tecnologia em estado puro. Há outras controvérsias nisso aí, sobretudo no que diz respeito à produção das baterias e à fonte de energia usada para gerar toda a eletricidade que será necessária para abastecer a frota toda.
Seja lá como for, a Tesla virou sinônimo de descarbonização no mundo, e o que temos hoje nas manchetes não é o desfecho ideal para uma grande história. Elon Musk tem dinheiro e, quero crer, capacidade de resolver as polêmicas que estão postas. Porém não será tuitando.
*Renato Krauszé sócio-diretor da Loures Comunicação
Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a EXAME. O texto não reflete necessariamente a opinião da EXAME.
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