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Como os eventos climáticos impactam na saúde das populações?

Mais de 90% das mortes relacionadas ao clima ocorrem em países de baixa e média renda. Leia o artigo de consultores em ODS e sustentabilidade para empresas

Embora todos enfrentem esses riscos climáticos, o fardo não é distribuído de maneira equitativa (Jun/Getty Images)

Embora todos enfrentem esses riscos climáticos, o fardo não é distribuído de maneira equitativa (Jun/Getty Images)

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Publicado em 30 de maio de 2024 às 07h00.

Por Rafael Kenji Hamada e Thaís Scharfenberg*

Conforme a crise climática global se aprofunda, suas consequências adversas na saúde e no bem-estar da humanidade ficam ainda mais sérias. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as mudanças climáticas representam "a maior ameaça à saúde enfrentada pela humanidade", em uma afirmação respaldada por evidências alarmantes. A OMS estima que as mudanças climáticas resultarão em mais de 250.000 mortes adicionais anualmente, entre 2030 e 2050.

De um modo geral, condições extremas relacionadas ao calor, chuvas, aumento do nível do mar, poluição, falta de água, diminuição da produção de alimentos, ecologia e distribuição de vetores conectados a fatores de vulnerabilidade social, acabam gerando cada vez mais problemas respiratórios, zoonoses, lesões e mortalidade decorrentes de eventos climáticos extremos, má nutrição, impacto na saúde mental, doenças transmitidas pela água contaminada e relacionadas ao calor.

Devido às enchentes no Rio Grande do Sul, 5 pessoas já morreram e mais de 120 foram diagnosticadas com leptospirose, doença transmitida por uma bactéria que tem o rato como principal vetor. Em novembro de 2023, a sensação térmica no Rio de Janeiro atingiu os 60ºC. Em julho de 2023, quase um terço dos leitos do Centro de Queimaduras do Valleywise Health Medical Center, em Phoenix, Arizona, foram ocupados por pessoas com queimaduras de terceiro grau ao tocarem em maçanetas, água ou asfalto quentes.

Em agosto de 2019, o céu da cidade de São Paulo escureceu durante o dia, causado por nuvens de fumaça provenientes de queimadas florestais. A cidade mais populosa do Brasil, que também é a que possui os maiores índices de poluição urbana, teve um aumento médio da temperatura em 2ºC desde a década de 1960, com 14 mil mortes relacionadas ao aumento do calor nos últimos 20 anos. Estima-se que 7 milhões de mortes prematuras ocorram anualmente devido à poluição do ar, de acordo com a OMS, além do impacto indireto nas mortes por causas cardiovasculares.

Risco maior para populações vulneráveis

Contudo, embora todos enfrentem esses riscos climáticos, o fardo não é distribuído de maneira equitativa: mais de 90% das mortes relacionadas ao clima ocorrem em países de baixa e média renda. Um recente estudo conduzido pelo Banco Mundial projeta que as mudanças climáticas poderão empurrar mais de 132 milhões de indivíduos para a pobreza extrema até 2030.

Populações vulneráveis, como crianças, idosos e pessoas de baixa renda são mais suscetíveis aos impactos na saúde de forma imediata e mensurável. A ONU destaca ainda que as crianças são particularmente vulneráveis a doenças relacionadas ao clima, com aumento dos índices de mortalidade infantil em locais que enfrentam eventos adversos climáticos.

Migrantes e refugiados também enfrentam maiores barreiras à saúde e mais efeitos relacionados à mudança climática. Furacões, enchentes e secas prolongadas podem causar estresse, ansiedade e traumas psicológicos, além dos danos causados pela migração das populações. A ACNUR, Agência da ONU para Refugiados, destaca os problemas de saúde mental como principais desafios para as pessoas refugiadas, além das situações de violência. A Agência estima o aumento do número de refugiados climáticos para 828 milhões de pessoas em todo o mundo.

Secas prolongadas e eventos climáticos extremos podem levar à escassez de água potável, aumentando o risco de doenças transmitidas pela água, como diarréia e cólera. No Brasil, 33 milhões de pessoas vivem sem acesso à água potável para consumo, de acordo com o Instituto Trata Brasil, o que agrava a situação causada por eventos climáticos como as enchentes no Rio Grande do Sul, que desencadeou uma urgência por falta de água limpa para higienização e água potável para consumo.

Os diversos impactos das mudanças climáticas

Além disso, secas e inundações podem prejudicar os setores agrícola e pesqueiro dos países, resultando na diminuição da disponibilidade de alimentos, no aumento dos preços e na carência nutricional. Tais efeitos afetam de forma desigual os países de baixa renda, onde a agricultura emprega 58% da força de trabalho, em comparação com apenas 3% nos países de alta renda. A perda da produção de arroz no Sul do Brasil devido às enchentes de maio é um exemplo direto do impacto dos eventos extremos climáticos na produção agrícola.

As mudanças climáticas também causam a migração de animais e insetos para as cidades, aumentando a incidência de arboviroses, que possuem os mosquitos como vetores, como a Malária, Dengue e Febre Amarela, além de doenças que têm como hospedeiros animais silvestres e roedores, conhecidas como zoonoses.

Doenças como Leptospirose e Esquistossomose são mais frequentes após enchentes, além da Hepatite A, vírus com transmissão oral-fecal, após o contato com água contaminada por esgoto. O aumento das temperaturas também está relacionado ao aumento da incidência da Doença de Lyme, transmitida por carrapatos causada pela bactéria Borrelia burgdorferi.

Em suma, os eventos climáticos têm demonstrado um impacto profundo e multifacetado na saúde das populações ao redor do mundo. Os efeitos são inegáveis e urgentes. A saúde mental e física, a disponibilidade de recursos básicos e até mesmo a infraestrutura dos sistemas de saúde são afetados de maneiras complexas e interconectadas.

É evidente que medidas de mitigação e adaptação são necessárias para enfrentar esses desafios. Investimentos em infraestrutura resiliente, políticas de redução de emissões de gases de efeito estufa, análises de riscos e ações coordenadas em níveis local, nacional e global são cruciais para proteger a saúde das gerações presentes e futuras. A crise climática não é apenas uma questão ambiental, mas também uma questão de saúde pública que exige uma resposta urgente e colaborativa de toda a sociedade.

*Rafael Kenji Hamada é médico e Thaís Scharfenberg é internacionalista. Os dois são consultores em ODS, ONU e sustentabilidade para empresas.

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