Bússola Poder: Brasil preso na década de 1950
Com falta de infraestrutura básica, preços de itens cotidianos nas alturas, o Brasil parece retornar a tempos de descobrimento de novas ideias
Bússola
Publicado em 15 de julho de 2022 às 12h25.
O futuro chegou! O Brasil vive em plenitude a década de 1950. Você leu corretamente, é isso mesmo: 1950. Aos fatos: o slogan de campanha ao governo de Minas Gerais de Juscelino Kubitschek é atualíssimo, “Binômio: energia e transporte”. Só se fala desses temas hoje.
Observem as discussões de hoje sobre o preço dos combustíveis, impostos incidentes sobre derivados do petróleo, a existência estratégica de uma empresa estatal para mover nossa economia, além de termos a ampliação dos debates aos custos da eletricidade, uma das razões da moeda nacional estar sendo eletrocutada no bolso do consumidor. Mas esqueça o Plano de Metas dos 50 anos em 5... isso é ficção científica na quadra atual.
A energia está na moda porque os pobres sonham em voltar a cozinhar com gás no lugar de lenha. Botijão de gás virou sinônimo de sofisticação elitista. Mas os transportes voltaram às colunas sociais, ou melhor, as dificuldades das estradas nacionais que nem a iniciativa privada consegue administrar. Por isso a venda de participação ou quebradeira de outrora promissores socialites dos negócios viários. Ainda nos faltam ferrovias, hidrovias, e o avião está tão caro que o valor das passagens voltou a impedir as empregadas domésticas de irem pra Disney ou às ilhas da Grécia (essa é do FHC, para quem não se lembra).
Com tanto buraco nas rodovias, os governadores estão com operações “tapa-buraco” em andamento no interior do país para não perder votos. E passa uma mão de piche novo sobre cratera velha, que lá vem o carro de mil cilindradas roncado pela imensidão deste país. Para inveja de alguns, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, gasta mais de R$ 1 bilhão nas ruas e avenidas paulistas para acabar com os solavancos diários dos paulistas... dois anos de sua própria sucessão.
Não só de infraestrutura vivia o passado. Havia também a conspiração política e o golpismo – que afinal inaugurou a República e entrou nos genes nacionais de forma marcante. Naqueles idos os corvos rondavam a arena política, com o bico fino de Carlos Lacerda a pregar a derrubada do governo de Getúlio Vargas, aquele que não poderia ter sido candidato, jamais deveria ter sido eleito, a quem não se daria posse, e, como chegou neste ponto, exigia ser derrubado. A isso se dedicava o bípede de plumas negras com a língua mais cortante daqueles tempos.
Se havia verve de lâmina afiada na retórica, também a violência física se materializava. Em escala letal, como aconteceu em Foz do Iguaçu recentemente e rondava invasões de fazendas pelos sem terra algum tempo atrás. Em 1954, o major Vaz caiu morto na rua Tonelero, via sem charme de Copacabana onde as investigações indicaram que o atentado contra Carlos Lacerda vinha da mente do chefe da segurança pessoal de Vargas, Gregório Fortunato – sobrenome inadequado a sua infausta presença histórica na República.
Os fatos saíram da vida para a história, e o suicídio do caudilho gaúcho adiou a trama militar por dez anos. Não sem antes a eleição de 1955 ter civis e a caserna se movimentando em tentativas de impedimento golpista, com o apagão moral de Carlos Luz e cia…
Os nostálgicos podem lembrar que os anos de 1950 nos legaram a bossa nova, com os versos sempre entrelaçados de amor e dor de Vinícius de Moraes (aquele que tinha os melhores vícios imorais da diplomacia e da poesia), e Brasília, a ilha distante do Rio, que gerou inveja, críticas, uma arquitetura única e dívidas públicas... mas ainda assim existia o sonho de um país grande, um futuro melhor que um dia chegaria. Setenta anos depois, o futuro parece muito pior que o passado, principalmente pela falta de vislumbre de paz e união em algum ponto lá na frente.
*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação
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