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Bússola Poder: A tragédia amazônica

A transição energética no Brasil foi assunto de destaque na Cúpula da Amazônia

"Certos conflitos dilaceram a sociedade, quando direitos e deveres entre o indivíduo e o Estado se chocam" (Reprodução/Getty Images)
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Publicado em 10 de agosto de 2023 às 18h00.

Última atualização em 10 de agosto de 2023 às 18h51.

Por Márcio de Freitas*

Os gregos antigos eram competentes ao engendrar dilemas humanos nas suas artes dramáticas, tanto que suas criações se tornaram símbolos metafóricos dos conflitos contemporâneos. Os anfiteatrosde Atenas com sua acústica espantosa podiam ribombar as mais latentes contradições sociais, no incipiente estado que se projetava organizado pela democracia e racional na filosofia, mas com sociedade cujas crenças e mitos eram ainda primários. Freud percebeu isso na tragédiadeÉdipo, que usou para denominar as relações entre mãe e filho em suas observações psicanalíticas.

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Certos conflitos dilaceram a sociedade, quando direitos e deveres entre o indivíduo e o estado se chocam. O textode Antígona (Sófocles) tem esse enfrentamento dos deveres do Estado com as crenças e obrigações íntimasdeuma pessoa: o irmão da personagem tenta um golpedeEstado em Tebas, morre; o rei, Creonte, proíbe seu sepultamento. A obrigação familiar ditava o sepultamento, que Antígona faz contra a ordem do Estado e é punida por desrespeitar a ordem legal.

Hoje, qualquer indivíduo pode ser racionalmente contrário ao usodecombustíveis fósseis. A emissãodecarbono tem provocado efeitos destrutivos em todo o planeta; ondasdecalor insuportáveis e incêndios na Europa; secas dramáticas em áreas agricultáveis; enchentes cada vez mais repentinas e avassaladoras, além do aquecimento global… Os derivadosdepetróleo ameaçam o futuro da vida no planeta.

Do pontodevista individual, como ser a favor do usode combustíveis fósseis?É a autodestruição da própria raça humana ao longo do tempo. É preciso parar.

Do ponto devista social, como parardeusar combustíveis fósseis que aquecem bilhõesdepessoas no inverno; deslocam bilhõesdepessoas pelo mundo; permitem transportar bens, mercadorias e alimentos a todos os lugares do mundo e, por isso, permitem a nossa sobrevivência imediata? Sem eles, bilhões morreriam em pouco tempo. Esse foi o cerne do debate daCúpula da Amazôniaem Belém, no Pará. Há duas visões contraditórias no embate que vai permear as relações internacionais pelos próximos anos.

Encontrar o pontodeequilíbrio entre cuidar do presente e preservar o futuro é o dilemadetodo governante atual. Esteja onde estiver. A transição energética é fundamental. E isso é um instrumento que terá grande valor em anos vindouros. O Brasil será um dos grandes protagonistas desse movimento. O país tem matriz energéticadeboa qualidade, potencial para fornecer novas energias limpas alémdenossas fronteiras e o maior patrimônio ambiental do mundo, a Amazônia. A maior floresta tropical do mundo, ainda preservada, está em sua maior parte no nosso país e pode ser um ativo para a recuperaçãodegás carbônico da atmosfera.

Essa imensa área tem um potencial ainda maiorderiquezas, algumas que podem inclusive viabilizar o uso e o desenvolvimentodenovas tecnologiasdeenergia limpa — minerais para baterias elétricas, por exemplo. E nas suas proximidades marítimas há um imensa reservadepetróleo — o combustível fóssil que devemos evitar para garantir o futuro, mas que pode nos manter vivos no presente.

É frágil o argumento dos que defendem abrir mão dos combustíveis fósseis deuma hora para a outra. Parar e não explorar mais, sem ter ainda um substituto viável na escala global para suprir as necessidades econômicas mundiais é ambientalismo utópico. Aqueles que defendem a exploração nem sempre expõem um horizontedelimite para isso nem mostram compromissodeinvestir parte significativa do que será extraído para fazer a transiçãodemaneira mais célere, como o compromisso para criar um fundo destinado a esse fim.

O debate está como em Antígona, um rei que não abre mãodeseu poder real. Um indivíduo não abre mãodesuas crenças. A tragédia se perpetua, sem abrir espaço para a mediação equilibradadeposições até o momento, e cai-se num discurso ainda vaziodeboas intenções sem garantias confiáveis. A maiordetodas tragédias entretanto é ficar sem dialogar. Esse mérito, o governo Lula recuperou junto aos atores mundiais. Falta agora o consenso para acabar com esse drama nas cenas dos próximos capítulos.

*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação

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