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Análise do Alon: mais uma gambiarra. E a solução

Certos parlamentares adquirirão, por lei, a prerrogativa de destinar mais recursos a seus redutos eleitorais

A distinção de parlamentares situacionistas e oposicionistas pode trazer problemas legais (Jefferson Rudy/Agência Senado/Flickr)
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Bússola

Publicado em 19 de dezembro de 2022 às 17h00.

Última atualização em 19 de dezembro de 2022 às 17h09.

O Supremo Tribunal Federal suspendeu momentaneamente o julgamento sobre as emendas de relator ao Orçamento Geral da União, à espera de uma decisão do Congresso Nacional.

Decisão que veio com uma curiosidade: institucionalizou-se a desigualdade entre os iguais, formalizando o fim da ilusão de algum tipo de primus inter pares. Se prevalecer, a nova regra legalizará o fato de, no nosso Legislativo, todos serem iguais, mas uns serem mais iguais que os outros.

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Pois certos personagens adquirirão, por lei, a prerrogativa de destinar mais recursos a seus redutos eleitorais. E aí ficará no ar a pergunta ingênua: por que o eleitor que votou num político da oposição, ou num parlamentar que não capturou cargo de comando no Congresso, tem menos direito de ver suas demandas contempladas no Orçamento?

Ora, porque a oposição, como o próprio nome já diz, perdeu a eleição, explicaria a realpolitik.

Espero que até aqui o leitor já tenha notado a falsa ingenuidade embutida nesses questionamentos, mas ao menos para algo vem servindo a polêmica em torno do “orçamento secreto": lançou-se luz sobre como transcorre a vida real nas relações entre o Executivo e o Legislativo.

E sobre a diferença entre um Judiciário disposto a ajudar e um disposto a atrapalhar.

E lá vamos nós adicionar mais uma gambiarra no carro velho, quando talvez estivéssemos diante de uma oportunidade, se pegássemos uma carona no debate em torno das emendas de relator e enfrentássemos o problema de fundo: o sistema político. Pois parlamentares só podem ser vistos pela lente da igualdade se tiverem sido eleitos em condições razoavelmente semelhantes.

Não vou falar aqui em “reforma política”. Um velho chiste brasiliense recomenda que a melhor reforma política é não fazer nenhuma, pois a probabilidade de o Congresso Nacional, quando mexe no assunto, piorar o sistema tende a 100%.

Mas está evidente que nosso voto proporcional em lista aberta, com o estado funcionando como distrito eleitoral e com o absoluto desrespeito à proporcionalidade na representação da Câmara dos Deputados (precisaríamos aqui de um Nelson Mandela para impor o “um eleitor, um voto”), faz de qualquer princípio de igualdade uma piada.

Teríamos então dois caminhos para trilhar: 1) a série de gambiarras vocacionadas a atender momentâneos espasmos de opinião pública; ou 2) algo mais definitivo.

Tornar igualitária e transparente a execução de emendas parlamentares seria mais fácil, ao menos no caso dos deputados federais, se o voto fosse distrital, com distritos de tamanho aproximadamente igual. E, já que o financiamento de campanhas é estatal e canalizado unicamente pelos partidos, seria razoável também eleger parte dos representantes por lista fechada.

Ou seja, o sistema distrital misto.

Mas nem Ernesto Geisel, com o AI-5 em vigor, conseguiu (ou quis) mexer com o sistema, quando teve a oportunidade, no Pacote de Abril de 1977. Ao contrário, conseguiu piorar o cenário ao agravar a desproporcionalidade na representação, para prorrogar a sobrevida do regime.

E a “Cidadã” de 1988 tampouco lancetou o abcesso. Talvez só uma nova Constituinte, exclusiva, consiga fazê-lo. Mas ela está fora dos horizontes neste momento de reacomodação do “sistema”.

*Alon Feuerwerkeré analista político da FSB Comunicação

Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a EXAME. O texto não reflete necessariamente a opinião da EXAME.

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