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Veja a íntegra da carta de Edward Snowden aos brasileiros

Carta faz parte da campanha liderada pelo jornalista americano Gleen Greenwald para pressionar o governo brasileiro a aceitar o pedido de asilo político de Snowden


	Edward Snowden: "a reação em alguns países tem sido particularmente inspiradora para mim, e o Brasil é certamente um desses países", disse o ex-agente da NSA
 (Reuters)

Edward Snowden: "a reação em alguns países tem sido particularmente inspiradora para mim, e o Brasil é certamente um desses países", disse o ex-agente da NSA (Reuters)

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Da Redação

Publicado em 17 de dezembro de 2013 às 10h33.

São Paulo - Edward Snowden, que vai pedir asilo político ao Brasil, escreveu uma carta aberta pedindo o apoio dos brasileiros para que possa continuar a revelar o que sabe sobre as ações da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA).

A campanha para a vinda de Snowden é liderada pelo jornalista Gleen Greenwald, que levou à imprensa as revelações de Snowden, e David Miranda, companheiro do jornalista.

Uma petição online hospedada no site Avaaz pede a assinatura de brasileiros para fazer pressão à presidente Dilma Rousseff. 

Veja a íntegra da carta que foi originalmente publicada na página de David Miranda no Facebook e traduzida por EXAME.com:

Uma carta aberta ao povo do Brasil, de Edward Snowden

"Há seis meses, saí das sombras da Agência de Segurança Nacional do governo dos Estados Unidos para ficar na frente da câmera de um jornalista.

Eu compartilhei com o mundo a evidência que prova que alguns governos estão construindo um sistema de vigilância mundial para monitorar secretamente o modo como vivemos, como falamos e o que dizemos.

Eu fui para frente da câmera com os olhos abertos, sabendo que essa decisão iria me custar minha família e minha casa, e arriscaria minha vida. Eu fui motivado por uma crença de que os cidadãos do mundo merecem entender o sistema em que vivem.

Meu maior medo era que ninguém ouvisse o meu aviso. Nunca fui tão feliz em estar tão errado. A reação em alguns países tem sido particularmente inspiradora para mim, e o Brasil é certamente um desses países.

Na NSA, eu testemunhei com preocupação crescente a vigilância de populações inteiras sem qualquer suspeita de irregularidade, e isto ameaça tornar-se o maior desafio dos direitos humanos do nosso tempo.


A NSA e outras agências de espionagem nos dizem que é para a nossa própria "segurança" - para a "segurança" de Dilma, para a “segurança” da Petrobras – que eles revogaram nosso direito à privacidade e invadiram nossas vidas.

E eles fizeram isso sem consultar o público em nenhum país, nem mesmo de seu próprio país.

Hoje, se você levar um telefone celular em São Paulo, a NSA pode e mantém o controle de sua localização: eles fazem isso 5 bilhões de vezes por dia com as pessoas ao redor do mundo.

Quando alguém em Florianópolis visita um site, a NSA mantém um registro de quando isso aconteceu e do que você fez lá. Se uma mãe em Porto Alegre liga para seu filho para desejar-lhe boa sorte em seu exame na universidade, a NSA pode manter esse registo dessa ligação por cinco anos ou mais.

Eles mantêm até o controle de quem está tendo um caso extraconjugal ou vendo pornografia, caso eles precisem prejudicar a reputação de seu alvo.

Os senadores norte-americanos dizem que o Brasil não precisa se preocupar, porque não se trata de “espionagem”, mas sim “coleta de dados”. Eles dizem que isso é feito para manter vocês seguros.

Eles estão errados. Há uma enorme diferença entre programas legais, espionagem legítima – onde os indivíduos são classificados com base em uma suspeita razoável e individualizada – e esses programas de espionagem em massa, que põe populações inteiras sob um olho que tudo vê e guarda cópias para sempre.

Esses programas nunca foram sobre o terrorismo : são sobre espionagem econômica, controle social e manipulação diplomática. Eles são sobre poder.

Muitos senadores brasileiros concordam, e pediram a minha ajuda com as suas investigações de supostos crimes contra os cidadãos brasileiros. 

Eu expressei minha vontade de ajudar quando for apropriado e legal , mas infelizmente o governo dos Estados Unidos tem trabalhado muito duro para limitar a minha capacidade de fazê-lo - indo tão longe a ponto de forçar o pouso do avião presidencial de Evo Morales para me impedir de viajar para América Latina!

Até que um país conceda asilo político permanente, o governo dos EUA vai continuar a interferir na minha capacidade de falar.


Seis meses atrás, eu revelei que a NSA queria ouvir o mundo todo. Agora, o mundo inteiro está ouvindo de volta, e falando também. E a NSA não gosta do que está ouvindo.

A cultura de espionagem mundial indiscriminada, exposta a debates públicos e investigações reais em todos os continentes, está entrando em colapso.

Apenas três semanas atrás, o Brasil levou o Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas a reconhecer pela primeira vez na história que a privacidade não para onde a rede digital começa, e que a vigilância em massa de inocentes é uma violação dos direitos humanos.

A maré virou, e finalmente podemos ver um futuro onde podemos desfrutar de segurança sem sacrificar a nossa privacidade.

Nossos direitos não podem ser limitados por uma organização secreta, e as autoridades americanas nunca deveriam decidir as liberdades dos cidadãos brasileiros.

Mesmo os defensores da vigilância em massa, aqueles que não podem ser persuadidos de que as nossas tecnologias de espionagem já ultrapassaram perigosamente os controles democráticos, agora concordam que nas democracias a vigilância do público deve ser debatida pelo público.

Meu ato de consciência começou com uma declaração: "Eu não quero viver em um mundo onde tudo o que eu digo, tudo o que faço , todo mundo com quem eu falar, cada expressão de criatividade, amor ou amizade é registrada. Isso não é algo que eu estou disposto a apoiar, não é algo que eu estou disposto a construir, e não é algo sob qual eu estou disposto a viver ".

Dias depois, me disseram que o meu governo me fez apátrida e que queria me prender. O preço para o meu discurso foi meu passaporte, mas eu o pagaria de novo: eu não vou ser a pessoa a ignorar a criminalidade por causa do conforto político. Eu prefiro ficar sem um país do que sem voz.

Se o Brasil ouvir apenas uma coisa de mim, que seja isto: quando todos nós nos unirmos contra as injustiças e em defesa da privacidade e dos direitos humanos básicos, poderemos nos defender até mesmo dos sistemas mais poderosos.”

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