Manifestantes criticam o governo em passeata na Avenida Paulista, em São Paulo (Paulo Pinto/Fotos Públicas)
Mariana Desidério
Publicado em 24 de junho de 2015 às 06h00.
São Paulo – Os partidos políticos brasileiros não estão nos seus melhores dias. Os recentes casos de corrupção e as brigas por poder no Congresso e no Planalto têm reforçado o coro das pessoas que não acreditam mais na importância dessas agremiações para a democracia. Nos protestos, não é dfícil encontrar quem se posicione contra todas as siglas.
Mas, afinal, como seria o Brasil sem os partidos políticos? EXAME.com entrevistou especialistas para saber se a vida política do país seria viável sem essas organizações, e se de fato ficaríamos melhor sem eles.
A conclusão é que não há solução fácil.
“Não acredito que seria possível dispensarmos os partidos”, diz o cientista político Marco Antônio Teixeira, professor da FGV. Segundo ele, a descrença que essas organizações enfrentam hoje no Brasil tem muito mais a ver com as siglas brasileiras especificamente do que com o sistema político como um todo.
“Os partidos brasileiros são pouco sintonizados com a sociedade, olham mais para o seu projeto de poder do que para um projeto de sociedade. É uma falha mais dos partidos do que do sistema partidário. Qualquer democracia representativa exige a ação coletiva, que acontece através dos partidos”, afirma.
O cientista social Rafael Araújo, professor da PUC e da Fesp-SP, concorda que uma democracia sem partidos não seria viável. Segundo ele, a consequência do fim das siglas seria uma população ainda mais despolitizada.
“O fim das siglas resultaria numa ampliação ainda maior da despolitização. Imagine que qualquer um possa ser candidato, sem ter que passar por um partido. Os únicos que teriam condições de se eleger seriam aqueles com maiores condições financeiras. Haveria uma elitização da política”, prevê.
Importância dos partidos
Para saber por que não conseguiríamos viver sem essas agremiações é preciso voltar na história e entender como elas foram criadas. Araújo lembra que os partidos surgiram para garantir que a vontade do povo fosse levada em conta nas decisões do Estado.
“Como o representante vai saber a vontade da população? Através de espaços em que essa vontade é formulada, que são os partidos políticos. O partido existe para organizar essas demandas”, explica.
Contudo, na sociedade moderna, as siglas partidárias foram perdendo espaço para outros atores. Se antes o debate público ocorria principalmente nas fileiras dos partidos, hoje ele acontece através dos meios de comunicação de massa, diz o professor.
“As pessoas não valorizam os partidos porque não entendem mais como o sistema funciona. Com isso, os partidos são esvaziados e tornam-se um espaço de corrupção e banalização da sua função inicial”, conclui.
O professor lembra que, hoje, os partidos brasileiros cumprem a função de "ocupar a burocracia eleitoral", quando deveriam se manter como espaços de debate, realizar reuniões frequentes e dialogar com movimentos da sociedade.
O que fazer?
Se não podemos nos organizar sem os partidos, e se nossos partidos estão esvaziados, o que pode ser feito para melhorar a situação?
Na visão de Marco Antônio Teixeira, da FGV, seria necessário fazer uma reforma política mais profunda. Um dos principais problemas, segundo ele, é o número excessivo de siglas no país.
“Temos quase 40 partidos. Dessa forma não é possível estabelecer as diferenças entre eles. Precisamos de uma reforma que permita garantir a identidade coletiva”, defende.
Teixeira também chama a atenção para um fenômeno tipicamente brasileiro: as siglas de uma liderança só. “Tem partidos que, se você tirar a liderança, não sobra quase nada. [O ex-prefeito] Gilberto Kassab, por exemplo, criou o PSD e já quer lançar outra sigla. Isso não é saudável para a democracia”, afirma.
Já Rafael Araújo, da PUC, afirma que o esvaziamento dos partidos interessa aos políticos mal intencionados, que não veem problema na situação ficar como está. “É obvio que esses políticos têm interesse na alienação. Isso cria as condições de dominação em que os interesses da minoria se impõem em relação à maioria”, afirma.
Araújo defende que a única forma de mudar realmente esse quadro é a politização da população. “É preciso investir na educação da população, em espaços de discussão política. As pessoas precisam se interessar pela coisa pública”, diz.
Ou seja, se a população está insatisfeita com os partidos e quer que eles voltem a cumprir sua função, cabe a ela mesma mudar este quadro. A questão agora é: por onde começamos?