Praça, da FGV: o impeachment é possível
Para Sérgio Praça, da FGV, denúncias do ex-ministro Marcelo Calero podem terminar em impeachment de Michel Temer
Gian Kojikovski
Publicado em 25 de novembro de 2016 às 15h13.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h16.
Até que ponto a saída do ministro Geddel Vieira Lima e a nova crise que se instalou em Brasília vão impactar o futuro do governo Temer? Para o cientista político Sérgio Praça, se as gravações confirmarem o que o ex-ministro Marcelo Calero disse à Polícia Federal, o processo pode, sim, terminar em impeachment. Professor e pesquisador da Escola de Ciências Sociais e do Centro de Política e Economia do Setor Público, ambos da Fundação Getúlio Vargas, Praça é tido como um dos analistas políticos com maior rigor acadêmico em sua avaliação de cenário no país. Sobre a semana de alta octanagem, ele concedeu a seguinte entrevista a EXAME Hoje.
O escândalo dessa semana surgiu como algo menor, mas tomou uma proporção preocupante para o governo, principalmente por envolver diretamente o presidente. Michel Temer errou?
Geddel deveria ter sido afastado imediatamente. Tanto Temer como o Geddel diminuíram o fato em conversas com interlocutores. Se isso acontecesse em 2012, talvez não causasse problemas, as pessoas talvez deixassem passar. Mas, agora, qualquer tentativa de usar a estrutura pública para fins pessoais é extremamente malvista e não é algo considerado aceitável. O governo Temer assumiu o país achando que, se a economia fosse bem, as pessoas colocariam a corrupção em segundo plano. Mas a economia não avança, e a Lava-Jato não para. Apesar de o escândalo ser considerado pequeno comparado a outras denúncias, incluindo a própria Lava-Jato, o impacto negativo para o presidente Temer é devastador.
O fato do presidente ter sido gravado é um agravante?
Se realmente existir e vier à tona, a gravação vai prejudicar muito o governo. Principalmente se Temer de fato tiver dito que a Advocacia-Geral da União teria uma solução. Pode ser prematuro dizer isso, mas nessa situação, eu vejo o impeachment como inevitável. Nesse contexto, o governo perderia a articulação política para qualquer projeto que esteja no Congresso. A reforma da Previdência já era. A PEC do teto dos gastos passa porque já está quase aprovada, mas ainda assim inspira cuidado. O contexto do país está caótico, e é exatamente o contrário do que a população quer.
O ex-ministro Geddel era um dos principais nomes da articulação política de Temer, que já vinha sendo prejudicada pelo cenário econômico. Como a situação política do governo fica agora?
Quando ele nomeou esse ministério, os mais próximos dele eram Jucá, Geddel, Moreira Franco e Eliseu Padilha. Desses, Jucá e Geddel já eram. O Jucá assumiu a liderança do governo no Congresso, o que já é, em si, um fato no mínimo bizarro, um absurdo, considerando a gravidade do que ele falou com o Sérgio Machado [disse que era preciso “mudar o governo para estancar essa sangria” da Lava-Jato]. Quanto ao Moreira Franco, pesam as declarações do Eduardo Cunha, que disse que, da cúpula do governo, ele é o mais frágil [Cunha disse que Franco é responsável por irregularidades na administração do Fundo de Investimento do FGTS, administrado pela Caixa]. Tem ainda o Henrique Eduardo Alves, que era muito próximo ao núcleo do governo e caiu logo no primeiro mês [citado na delação premiada de Sérgio Machado, acusado de receber 1,5 milhão de reais]. O presidente Michel Temer defende o Geddel, mas ele não tem outra opção, porque eles são muito próximos. No final das contas, sobraram o presidente e o Eliseu Padilha. É frustrante para o governo que isso aconteça, principalmente para a articulação política com o Congresso.
As novas denúncias, incluindo as delações da Odebrecht que estão em vias de ser assinadas, podem levar a população de volta às ruas?
É muito plausível que sim. Há um risco para o Planalto que tanto a esquerda como a direita defendam o fim do governo Temer. Se o Movimento Brasil Livre, que defendeu o impeachment de Dilma Rousseff, não defender a saída do presidente agora, se defender o governo, perderia definitivamente a representatividade política. Domingo há protestos marcados, e pode ser um teste importante.
O presidente, em seu discurso de posse, disse que o país precisava se unir…
Talvez ele finalmente una o país, mas contra si mesmo. Já é um governo com pouco apoio popular e pode se esfacelar completamente agora. Se isso não acontecer, o presidente pode sobreviver isolado politicamente, o que não é bom para o país. Esse futuro ainda é um pouco imprevisível. O PSDB está numa posição muito ruim porque saiu com seus principais nomes criticando o Marcelo Calero e defendendo o governo. É uma posição completamente contrária ao anseio popular. O PSDB faz isso agora porque está com medo de ficar exposto, já que apoiou a entrada do Temer na presidência. O melhor negócio para o PSDB, à princípio, seria que o governo se mantivesse como uma travessia até 2018, mas se a pressão popular crescer, isso pode não acontecer. A gente sabe que no momento que o PSDB retirar seu apoio, seria a pá de cal no governo. Hoje, não é provável, mas pode vir a acontecer.
Além do escândalo envolvendo Geddel, a semana foi cheia de polêmicas em Brasília, com diversas pautas de proteção do Congresso. Como isso afeta o governo?
Esses projetos respingam mal em toda a classe política e também chegam ao governo, obviamente. Se o Congresso aprovar a anistia ao caixa 2 e o Temer não vetar, seria como um suicídio coletivo. Absolver coletivamente os políticos seria péssimo para o futuro do país. Causaria comoção popular, porque as pessoas estão mais intolerantes à corrupção governamental. E os parlamentares têm medo da população.
Até que ponto a saída do ministro Geddel Vieira Lima e a nova crise que se instalou em Brasília vão impactar o futuro do governo Temer? Para o cientista político Sérgio Praça, se as gravações confirmarem o que o ex-ministro Marcelo Calero disse à Polícia Federal, o processo pode, sim, terminar em impeachment. Professor e pesquisador da Escola de Ciências Sociais e do Centro de Política e Economia do Setor Público, ambos da Fundação Getúlio Vargas, Praça é tido como um dos analistas políticos com maior rigor acadêmico em sua avaliação de cenário no país. Sobre a semana de alta octanagem, ele concedeu a seguinte entrevista a EXAME Hoje.
O escândalo dessa semana surgiu como algo menor, mas tomou uma proporção preocupante para o governo, principalmente por envolver diretamente o presidente. Michel Temer errou?
Geddel deveria ter sido afastado imediatamente. Tanto Temer como o Geddel diminuíram o fato em conversas com interlocutores. Se isso acontecesse em 2012, talvez não causasse problemas, as pessoas talvez deixassem passar. Mas, agora, qualquer tentativa de usar a estrutura pública para fins pessoais é extremamente malvista e não é algo considerado aceitável. O governo Temer assumiu o país achando que, se a economia fosse bem, as pessoas colocariam a corrupção em segundo plano. Mas a economia não avança, e a Lava-Jato não para. Apesar de o escândalo ser considerado pequeno comparado a outras denúncias, incluindo a própria Lava-Jato, o impacto negativo para o presidente Temer é devastador.
O fato do presidente ter sido gravado é um agravante?
Se realmente existir e vier à tona, a gravação vai prejudicar muito o governo. Principalmente se Temer de fato tiver dito que a Advocacia-Geral da União teria uma solução. Pode ser prematuro dizer isso, mas nessa situação, eu vejo o impeachment como inevitável. Nesse contexto, o governo perderia a articulação política para qualquer projeto que esteja no Congresso. A reforma da Previdência já era. A PEC do teto dos gastos passa porque já está quase aprovada, mas ainda assim inspira cuidado. O contexto do país está caótico, e é exatamente o contrário do que a população quer.
O ex-ministro Geddel era um dos principais nomes da articulação política de Temer, que já vinha sendo prejudicada pelo cenário econômico. Como a situação política do governo fica agora?
Quando ele nomeou esse ministério, os mais próximos dele eram Jucá, Geddel, Moreira Franco e Eliseu Padilha. Desses, Jucá e Geddel já eram. O Jucá assumiu a liderança do governo no Congresso, o que já é, em si, um fato no mínimo bizarro, um absurdo, considerando a gravidade do que ele falou com o Sérgio Machado [disse que era preciso “mudar o governo para estancar essa sangria” da Lava-Jato]. Quanto ao Moreira Franco, pesam as declarações do Eduardo Cunha, que disse que, da cúpula do governo, ele é o mais frágil [Cunha disse que Franco é responsável por irregularidades na administração do Fundo de Investimento do FGTS, administrado pela Caixa]. Tem ainda o Henrique Eduardo Alves, que era muito próximo ao núcleo do governo e caiu logo no primeiro mês [citado na delação premiada de Sérgio Machado, acusado de receber 1,5 milhão de reais]. O presidente Michel Temer defende o Geddel, mas ele não tem outra opção, porque eles são muito próximos. No final das contas, sobraram o presidente e o Eliseu Padilha. É frustrante para o governo que isso aconteça, principalmente para a articulação política com o Congresso.
As novas denúncias, incluindo as delações da Odebrecht que estão em vias de ser assinadas, podem levar a população de volta às ruas?
É muito plausível que sim. Há um risco para o Planalto que tanto a esquerda como a direita defendam o fim do governo Temer. Se o Movimento Brasil Livre, que defendeu o impeachment de Dilma Rousseff, não defender a saída do presidente agora, se defender o governo, perderia definitivamente a representatividade política. Domingo há protestos marcados, e pode ser um teste importante.
O presidente, em seu discurso de posse, disse que o país precisava se unir…
Talvez ele finalmente una o país, mas contra si mesmo. Já é um governo com pouco apoio popular e pode se esfacelar completamente agora. Se isso não acontecer, o presidente pode sobreviver isolado politicamente, o que não é bom para o país. Esse futuro ainda é um pouco imprevisível. O PSDB está numa posição muito ruim porque saiu com seus principais nomes criticando o Marcelo Calero e defendendo o governo. É uma posição completamente contrária ao anseio popular. O PSDB faz isso agora porque está com medo de ficar exposto, já que apoiou a entrada do Temer na presidência. O melhor negócio para o PSDB, à princípio, seria que o governo se mantivesse como uma travessia até 2018, mas se a pressão popular crescer, isso pode não acontecer. A gente sabe que no momento que o PSDB retirar seu apoio, seria a pá de cal no governo. Hoje, não é provável, mas pode vir a acontecer.
Além do escândalo envolvendo Geddel, a semana foi cheia de polêmicas em Brasília, com diversas pautas de proteção do Congresso. Como isso afeta o governo?
Esses projetos respingam mal em toda a classe política e também chegam ao governo, obviamente. Se o Congresso aprovar a anistia ao caixa 2 e o Temer não vetar, seria como um suicídio coletivo. Absolver coletivamente os políticos seria péssimo para o futuro do país. Causaria comoção popular, porque as pessoas estão mais intolerantes à corrupção governamental. E os parlamentares têm medo da população.