Brasil

Por que “furacão Odebrecht” é só um calafrio para Temer – ainda

Amplitude das acusações e lentidão dos processos (que podem demorar até 5 anos) minimizam efeitos de curto prazo das delações e lista de Fachin

Michel Temer: para analistas, abalo da lista de Fachin não surtirá grandes efeitos no curto prazo para o governo (Nacho Doce/Reuters)

Michel Temer: para analistas, abalo da lista de Fachin não surtirá grandes efeitos no curto prazo para o governo (Nacho Doce/Reuters)

Talita Abrantes

Talita Abrantes

Publicado em 13 de abril de 2017 às 12h38.

Última atualização em 11 de maio de 2017 às 12h02.

São Paulo - O dia seguinte à divulgação da lista de investigados o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), e do conteúdo das delações premiadas da Odebrecht foi preenchido pelos espaços vazios do Congresso, que cancelou todas as sessões desta quarta-feira, e pelos apelos de calma feitos pelo presidente Michel Temer — além, é claro, de uma infinitude de negativas vindas de cada investigado.

Para analistas consultados por EXAME.com, esse é o máximo de abalo e apreensão que a delação de 77 executivos Odebrecht deve legar no curto prazo (que fique claro: no curto prazo) para a classe política. A expectativa é que a rotina de Brasília volte à normalidade em breve e o furacão Odebrecht fique só no calafrio — até segunda ordem.

Exceto pela data de divulgação e extensão da lista de envolvidos (não se esperava que todos esses suspeitos fossem investigados de uma só vez), o conteúdo da agora lista de Fachin não trouxe grandes surpresas. A maior parte dos nomes ali citados já havia vazado previamente.

Não se deve negar, contudo, o peso das revelações sobre os bastidores da relação escusa entre Odebrecht e políticos (que não deixa nenhum presidente desde a redemocratização imune).

Segundo os próprios delatores, os crimes que serão investigados na lista de Fachin envolvem pagamentos de mais de 450 milhões de propina a políticos – isso sem contar as acusações ligadas aos suspeitos que foram para outras instâncias.

Mas é exatamente essa amplitude dos crimes e o número de envolvidos que ameniza os efeitos de curto prazo para a política nacional.

“As acusações se estendem pelo sistema político e partidário de um jeito tão extenso que não há nenhum ator com capacidade de mobilizar maioria no Congresso que esteja fora dessa”, afirma Vitor Oliveira, sócio-diretor da consultoria Pulso Público.

Em outros termos: com (quase) todos os políticos no mesmo barco, dificilmente alguém teria força para se levantar como contraponto seja pedindo a imediata cassação/afastamento dos envolvidos ou mudanças mais radicais no sistema político.

A mesma lógica vale para o governo de Michel Temer. No total, oito ministros serão investigados sob o escrutínio do STF. Entre eles, o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha.

Para estancar uma debandada em sua equipe ministerial (e, por consequência, em sua base), a estratégia de Temer, por ora, é se apoiar no método que vem sido chamado de “Protocolo Temer”: demissão só se o ministro virar réu.

Por mais que se questione se esse protocolo permanecerá de pé diante de eventuais acusações graves, a tendência é que o governo se esforce para segui-lo à risca sob a pena de uma onda de fragilização dentro da própria base.

“Se um ministro cai, o próprio Temer não conseguiria segurar outros. Seria uma bola de neve”, diz Thiago Vidal, consultor político da consultoria Prospectiva.

A derrubada de um ministro mexeria no principal capital do governo atualmente: cargos em troca de apoio. “Os ministros estão no governo por causa dos partidos. Se um cair, a tendência é que esses partidos retirem seu apoio”, diz Vidal.

E apoio no Congresso é tudo o que Temer – dono de uma agenda (urgente) de reformas — precisa nesse momento.

“A lógica funciona da seguinte forma: quanto maior for a crise no plano político, maior o senso de urgência sobre os partidos e líderes do governo para a aprovação das reformas econômicas”, diz Rafael Cortez, da Tendências Consultoria.

Em um contexto ameaçador como esse, a tendência é que o preço do apoio dos partidos para o governo aumente.

“Todo partido precisa de três coisas: política pública, cargos/recursos do governo e voto. O Temer não tem o bônus eleitoral que Lula tinha, então, ele vai ter que compensar ainda mais com outras coisas”, afirma Oliveira, da Pulso Público.

2018

Não se pode prever, contudo, a mesma “calmaria” ou manutenção do status quo para o médio e longo prazo. Para os analistas ouvidos por EXAME.com, a “delação do fim do mundo” embaralha ainda mais qualquer previsão apressada sobre o cenário para as eleições de 2018.

Para ficar só em alguns exemplos, a lista de acusações não só piora o inferno astral do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que já é réu em cinco ações penais, como também complica os planos do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), e atrapalha as intenções do governo do PMDB – apesar de não ser investigado por uma questão de imunidade temporária, pesa contra Temer a suspeita de negociar um acordo de 40 milhões de dólares para a campanha de 2010.

Vale lembrar que a decisão de Fachin para investigar toda essa multidão de políticos é apenas o início do jogo. A estimativa do projeto Supremo em Números, da FGV Direito Rio, é que o processo contra essas autoridades demore até 5 anos para ser finalizado.

Muita coisa pode acontecer até lá – uma delas são as urnas em outubro de 2018. Do lado dos políticos, provavelmente, a intenção será manter o foro privilegiado. A questão é como cada cidadão vai responder a isso.

*Colaboração: Valéria Bretas

 

Acompanhe tudo sobre:CorrupçãoDelação premiadaEdson FachinGoverno TemerMarcelo OdebrechtNovonor (ex-Odebrecht)Operação Lava JatoSupremo Tribunal Federal (STF)

Mais de Brasil

STF nega liberdade condicional a ex-deputado Daniel Silveira

Três pessoas morrem soterradas em Taubaté, no interior de São Paulo

Governadores do Sudeste e Sul pedem revogação de decreto de Lula que regula uso de força policial

Pacote fiscal: Lula sanciona mudanças no BPC com dois vetos